Bolsonaro e a necropolítica

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Ilustração: Alexandre Teles

O número de mortos pela Covid-19 cresce assustadoramente no Brasil e, nesse tropel, deve ultrapassar a casa das 500 mil, colocada originalmente como um limite improvável de ser alcançado. Mas, o governo federal segue firme em sua posição de não-isolamento e de corpo mole na vacinação, repetindo uma espécie de culto aos mortos como o que havia na África colonial, que o pensador camaronês Achille Mbembe dava o nome de Necropolítica.

A média diária de mortes passou de quatro mil pessoas, o que revela completo descontrole da crise por parte das autoridades federais, colocando o país no topo das piores listas internacionais de acompanhamento da pandemia. Aos milhões de brasileiros, brasileiras e brasileirinhos que sobrevivem na miséria resta a opção entre morrer de coronavírus ou morrer de fome, como constatou o médico e cientista Miguel Nicolelis.

Aos que foram infectados e não morreram, o atual presidente da República diz que foi seu governo que os salvou – e sobre os que morrem, diz que a responsabilidade é dos governadores e prefeitos. Joga com as vítimas da doença com finalidades políticas, sem se preocupar com salvar vidas humanas que estão escorrendo de modo crescente por entre a inoperância de seu governo.

Ele não sabe quantos milhões de pessoas estão passando fome. Aliás, ele nem sabe o que é isso, porque nunca passou fome nem nunca leu Graciliano Ramos. Por desconhecer a realidade, em verdade, ele acha que o auxílio emergencial de 250 reais está de bom tamanho, o que é uma insensatez.

É só fazer as contas e ver o que uma família de quatro ou cinco pessoas pode fazer com esse dinheiro pra amenizar a fome – comer três refeições por dia, então, nem pensar. Assim, a morte chega mais rápido, e mortos não passam fome. Mas os que sobrevivem nas camadas sem renda enfrentam uma fome severa, pois as pessoas estão famintas de pão, de arroz, de feijão, de carne, de frango, de sapatos, de roupas, de luz, de espaços pra viver. Sem falar no aluguel, no transporte ou nos remédios.

Jair Bolsonaro parece viver num reino de fantasias, onde existe um mundo do jeito que ele gostaria que fosse, paralelo ao que de fato existe. No momento, ele sugere que a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) instalada por determinação do Supremo Tribunal Federal investigue também governadores e prefeitos. Isso não é possível, mas, de qualquer modo, alguém precisa dizer a ele que vários governadores e muitos prefeitos são aliados dele e teriam muito que explicar, caso sejam investigados.

Ademais, apesar de Donald Trump ter perdido as eleições e saído escorraçado do poder, os Estados Unidos são o país dos sonhos e delírios do presidente brasileiro. Mas ele confunde as coisas e faz avaliações incorretas a respeito, por exemplo, do papel dos estados na federação daquela potência capitalista. Lá, as unidades federadas têm muito mais autonomia que as aqui. Ainda assim, contudo, cabe às assembleias legislativas estaduais investigar os governos locais, não ao Congresso Nacional.  

Aliás, vários médicos psicanalistas afirmam que, além da postura ideológica de direita radical, o presidente padece de problemas mentais e precisaria de tratamento. Entretanto, esse é outro tema que ele não aceita nem discutir.

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