Crescimento favorece trabalhadores, mas inflação e juros ameaçam salários

Em geral, o resultado das campanhas salariais que já foram ou estão sendo
fechadas neste ano, especialmente no segundo semestre, revelam que muitas
categorias estão conquistando acordos relativamente bons, com reajustes
acima da inflação e mesmo

O acordo que o Sindicato dos Metalúrgicos de Caxias do Sul (RS) acaba de
assinar com o patronato, prevendo um reajuste acima do INPC acumulado em 12
meses, de 9,4%, bem como o dos químicos paulistas do setor farmacêutico, que
conquistaram a redução da jornada para 40 horas semanais, sem prejuízo para
os salários, são dois exemplos eloqüentes neste sentido.


 


 


É, basicamente, em função do crescimento da economia nacional que os ventos
favorecem os interesses dos assalariados, o que revela como é importante
para a classe trabalhadora a bandeira do desenvolvimento com valorização do
trabalho. Todavia, a aceleração do processo inflacionário e a alta dos juros
são dois fatores que prometem sabotar o bom desempenho da economia e dos
salários, mudando (para pior) as perspectivas da conjuntura.


 


 


Arrocho silencioso


 


 


A evolução do rendimento real dos trabalhadores ocupados nas seis principais
regiões metropolitanas do país em junho (São Paulo, Rio, Belo Horizonte,
Recife, Salvador e Porto Alegre) já revela uma desaceleração no crescimento
da renda do trabalho, de acordo com a gerente da pesquisa mensal de emprego
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Cimar Azeredo


 


 


Na comparação com maio, a renda média real dos trabalhadores e trabalhadoras
caiu 0,3%. Este desempenho já reflete, em parte, a ação corrosiva da
inflação em alta, na opinião da economista do IBGE, que pondera também a ação
de outros fatores, como as novas contratações por salários inferiores aos
dos que já estavam ocupados.


 


 


Redistribuição da renda


 


 


A inflação é um instrumento silencioso e perverso de redistribuição da renda
entre as classes sociais e a experiência histórica demonstra, com fartura,
que suas maiores vítimas são os trabalhadores. Os salários perdem poder de
compra diariamente, pois não acompanham a disparada dos preços, que de resto
afeta principalmente os alimentos. Isto significa que a inflação, hoje, é
maior precisamente para os mais pobres.


 


 


Para preservar o valor real dos salários ou minorar as perdas, algumas
categorias já estão reivindicando redução do prazo de reajustes (atualmente
de uma vez a cada ano) ou alguma espécie de ''gatilho'' para garantir a
correção da remuneração toda vez que a alta dos preços alcançar certo
patamar.


 


 


Risco para o crescimento


 


 


A alta das taxas de juros, promovida a pretexto de combater a inflação,
também funciona contra os interesses da classe trabalhadora, pois provoca
uma redução do consumo e dos investimentos, sacrificando o crescimento da
economia. A redução da taxa de crescimento e a possibilidade de estagnação
econômica tendem a se desdobrar em aumento do nível de desemprego e redução
da renda do trabalho.


 


 


No curto prazo, a ameaça proveniente da política monetária do Banco Central
(que acaba de elevar em 0,70%, para 13% ao ano, a taxa básica de juros)
ainda não se transformou em realidade. Porém, poucos duvidam de que o
resultado em médio prazo será o desaquecimento do consumo e da atividade
produtiva.


 


 


Trabalho de Sísifo


 


 


As categorias terão de intensificar os esforços de mobilização e luta seja
contra os efeitos corrosivos da inflação seja contra a política monetária do
Copom, pois do contrário a modesta recuperação do valor dos salários irá por
água abaixo ao longo dos próximos meses ou anos, afogando ou adiando a
esperança de desenvolvimento com valorização do trabalho.


 


 


As estatísticas divulgadas pelo IBGE revelam que o rendimento médio real
dos assalariados nas seis maiores regiões metropolitanas, de R$ 1.216,50 em
junho, sequer chegou ao patamar do valor registrado em igual mês do ano de
2002, que foi de R$ 1.269,45. Será preciso muita luta para evitar que a
classe trabalhadora brasileira seja condenada ao trabalho de Sísifo (1).


 


 


Nota


 


(1) Sísifo é um personagem da mitologia grega, que a exemplo de Prometeu foi
encarado como um inimigo de Zeus (o deus dos deuses olímpicos) e condenado,
depois de morto, por toda a eternidade, a rolar uma grande pedra de mármore
com as próprias mãos até o cume de uma montanha, sendo que toda vez que ele
estava quase alcançando o topo, a pedra rolava novamente montanha abaixo até
o ponto de partida. Por isto, esforços inúteis ou tarefas destinadas ao fracasso passaram a ser consideradas como ''trabalho de Sísifo''.


 

As opiniões expostas neste artigo não refletem necessariamente a opinião do Portal Vermelho
Autor