Foz do Iguaçu: tomar nas mãos a própria história

Foz do Iguaçu, que completou 97 anos no dia 10, caminha para seu centenário buscando cuidar da própria história. A cidade conhecida mundialmente pelas suas Cataratas, o Parque Nacional, a Itaipu, a Ponte da Amizade, a tríplice fronteira com o Paraguai e com a Argentina, ainda é uma cidade de médio porte em tamanho e número de habitantes, mas que cada dia mais se torna estratégica para o país na implantação de políticas para a integração latino-americana. Já é também, com a consolidação da UNILA – Universidade Federal da Integração Latino-Americana, o centro do pensamento progressista deste continente.

A cidade tem uma história sui generis. Alguns anos após o fim da Guerra com o Paraguai (ou massacre de um povo), o governo imperial brasileiro, em seus últimos respiros, para consolidar sua posição neste território, decidiu, em 1888 fundar nesta fronteira uma Colônia Militar, que somente seria instalada no ano da Proclamação da República. Foram os passos definitivos para a conquista deste território.

Ou seja, ao contrário do que ocorreu com a criação da maioria dos municípios do interior paranaense, os primeiros passos do que seria a cidade de Foz do Iguaçu não se deram por decisão de alguma comunidade ou família que decide ocupar um território. A cidade começou a nascer a partir de um interesse geopolítico do governo central. Ninguém perguntou para as comunidades locais que viviam por aqui no fim do século XIX se este era o caminho.

A mesma situação se repetiu quando o município foi criado no dia 10 de junho de 1914. Encerrava-se a I Guerra Mundial e para reconstruir a Europa era necessária muita madeira, abundante nesta região. A emancipação do município se constituiu em um território enorme, iniciando onde hoje é Guarapuava (no Centro Sul do Paraná) até onde é hoje Guaíra (no extremo norte do Oeste paranaense). A consolidação do município garantiu de vez a ocupação deste território, facilitando o controle da exploração e venda de madeira e mais uma vez foi uma decisão que interessava principalmente o governo central brasileiro.

No final da década de 30, Getúlio Vargas decretou a criação do Parque Nacional do Iguaçu, uma reivindicação liderada por Santos Dumont que morreu sem vê-la concretizada, período em que também é construída o atual prédio da Prefeitura. Na década de 40, a atual estrutura de Foz do Iguaçu começou a ser desenhada, novamente por decisões do governo central. Construiu-se a primeira agência do Banco do Brasil, a Companhia Militar se tornou Batalhão do Exército e o aeroporto do Parque Nacional iniciou seu funcionamento. Decisões que interessavam ao governo central brasileiro e sua política internacional. Neste período o Brasil entrava na II Guerra Mundial e o Getúlio Vargas assinava o decreto que criou o antigo Estado do Iguaçu.

Na década de 60, foi construída a Ponte da Amizade e a BR 277, o que garantiu ao Paraguai uma ligação ao Oceano Atlântico, resolvendo uma das principais reivindicações do país vizinho e integrando definitivamente a fronteira entre os dois países. Esta decisão estava ligada diretamente a 1970, ano em que se completaria 100 anos do fim da guerra do Paraguai e do tratado que decretara seu fim, que entre outras demandas, obrigava o Brasil a devolver territórios ocupados num prazo de 100 anos.

Ato seguinte, em 1973, foi assinado o Tratado de Itaipu, obra que encerrou qualquer discussão sobre vestígios da Guerra com o país vizinho e transformou completamente a vida de Foz do Iguaçu, de uma cidade pacata, fronteiriça, com turismo quase bucólico, em uma importante cidade economicamente para o Paraná e para o Brasil. A cidade, em menos de 10 anos, triplica sua população. Novamente esse foi um efeito provocado por uma decisão do governo central brasileiro.

Decisão essa que construiu uma cidade totalmente nova, com novas características e com novos problemas. Paralelo a isso, a cidade só conheceu a democracia e elegeu seu prefeito a partir de 1985 (desde a década de 60, assim como as capitais, os prefeitos eram interventores do regime militar). A nova fase da cidade não foi acompanhada do devido amadurecimento político e pagamos um alto preço por isso.

Ao mesmo tempo que se construiu uma cidade multicultural, com 72 etnias e outras comunidades em convivência pacífica, uma parte de sua elite enriqueceu com o turismo e com a especulação imobiliária. Enquanto a cidade era tomada por servidores públicos das três esferas de governo, milhares de homens do campo retornaram da aventura do Paraguai e desempregados da construção das Itaipu construíram 74 favelas no entorno da cidade.

Com governantes que não conseguiram planejar adequadamente o conflito entre o crescimento populacional acelerado (no início da década de 2000, a cidade tinha 300 mil habitantes – dez vezes mais que em 1974 quando foi iniciada a construção da usina de Itaipu).

Esta situação só começou a mudar com a eleição de Lula em 2002 e do prefeito Paulo em 2004, quando a cidade passou a ser vista como um centro geopolítico estratégico, assim como era até o início da Itaipu e um amplo trabalho de resgate da imagem da cidade começou a ser feito.

O resultado é que nesta década a cidade que chegou a ser conhecida como uma das mais violentas do país começou a ter novas referências na saúde, na educação, programas habitacionais, área de segurança e novas alternativas de desenvolvimento. Projetos federais grandiosos e impactantes também estão saindo do papel: o Instituto Federal do Paraná já está em funcionamento, a UNILA já atende quase mil alunos (serão 10 mil em quatro anos) e suas obras começam neste ano, quando também será licitada a segunda Ponte Brasil-Paraguai.

O desafio do futuro da cidade é fazer com estes novos e grandiosos investimentos do Governo Federal sejam parte de um projeto de desenvolvimento local, não sejam apenas implantados neste local, mas façam parte desta comunidade. No caminho para seu centenário, Foz, que se transformará em cidade universitária e multi econômica, precisará conduzir a sua própria história.

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