Inglaterra investigará guerra no Iraque

Passou meio despercebido na grande imprensa, como sempre. Mas, o parlamento da Inglaterra aprovou e foi finalmente instalada uma Comissão de Investigação sobre a Participação do Reino Unido na Guerra do Iraque. E sobre esse assunto, quentíssimo, é que trataremos esta semana.

John Chilcot, presidente da Comissão Inglesa de Investigação sobre o IraqueUma retrospectiva histórica

Diferente da guerra (agressão, na verdade) contra o Iraque de 1991, feita pelo Bush pai, a de 2003 foi decidida de forma unilateral apenas e tão somente pelos Estados Unidos, sob o comando de Bush filho. Este sabia que, se pedisse autorização para ao Conselho de Segurança da ONU, receberia o veto de pelo menos três membros permanentes: Rússia, China e França.

Assim, a decisão de preparar quase meio milhão de soldados para atravessar o oceano e dirigir-se ao Oriente Médio foi tomada de forma unilateral por George Walker Bush. No entanto, o serviçal de plantão e cão subserviente do imperialismo norte-americano, que era a Inglaterra naquele momento, sob o comando de Tony Blair – na verdade um poodle – decidiu apoiar a invasão. Notícias que emergem agora, que a Comissão investigará, dão conta de que Blair apoiava a invasão do Iraque muitos meses antes do próprio parlamento inglês dar a devida autorização para o envio de 45 mil soldados. O resto é a história que todos nós conhecemos. A Inglaterra de Gordon Brow, que sucedeu Blair em 2007, retirou seu último soldado do Iraque em julho passado.

Os “argumentos” que levaram à decisão pela invasão, pela agressão e mesmo pela deposição de Saddam Hussein do poder, era o de que o Iraque possuía “armas de destruição de massa”. Apenas de termos tratado desse tema aqui por diversas vezes, sempre é bom relembrar o assunto. O então Secretário de Estado de Bush, Collin Powell afirmou perante o congresso e repercutido por uma mídia que falava uma única linguagem, a do Pentágono, que os EUA teriam provas de que o Iraque tinha mesmo armas poderosas de destruição de massa, que poderiam ser químicas, bacteriológicas e mesmo nucleares. Uma verdadeira mentira como se viu depois.

Mesmo o inspetor geral da ONU para armas de destruição de massa, o suíço Hans Blix, dizendo ao mundo e atestando ao contrário, que todas as tais armas de destruição de massa que o Iraque um dia teve foram fornecidas pelos Estados Unidos quando a estes interessava atacar o Irã revolucionário. Isso ocorreu durante a guerra entre 1980 e 1988 e onde morreram um milhão de iranianos.

A Comissão de Investigação inglesa

Pois bem. No último dia 24 de novembro, foi finalmente instalada a CI, presidida pelo funcionário de alto escalão, já aposentado, John Chilcot. Ela iniciou a tomada de depoimentos e o mais esperado, que ficou para janeiro, será mesmo o de Tony Blair, derrotado na semana retrasada nas suas pretensões de ser o primeiro presidente da União Europeia.

O editor do jornal Pravda, Timothy Bancroft-Hinchey nos brindou na edição portuguesa do dia 27 com um excelente artigo sobre o tema (1). Alguns elementos ele nos traz à tona, que vão deixando Blair e o governo dos trabalhistas cada dia mais em dificuldades:

• O Foreing Office (uma espécie de ministério das Relações Exteriores), desde 2003 declarou que não havia prova alguma de que Saddam estivesse tentando fornecer armas de destruição em massa para Bin Laden da Al Qaeda, por que: a) ele não as dispunha e b) os dois odiavam-se mutuamente (um é xiita e outro sunita). Simples assim;

• De acordo com Sir William Ehrman, diretor de Segurança Internacional desse ministério, as alegações eram baseadas em evidências “pouco firmes”, ou seja, não tinham prova alguma contra Saddam;

• Hans Blix, o então todo poderoso inspetor da ONU para esse tipo de armas, havia dito que o Iraque não tinha armas químicas alguma, capaz de proceder à destruição em massa;

• Tim Dowse chefe da contra-proliferação de tais armas desse mesmo órgão inglês (MRE) havia afirmado que não havia nada que pudesse caracterizar como uma relação entre o Iraque de Saddam e a Al Qaeda de Bin Laden;

• Blair ainda tentou ficar mais distante do projeto equivocado de Bush de invadir, com intuito de destituir o regime de Saddam. Sabia que isso era completamente ilegal e teria problemas para aprovar essa linha no parlamento. Por isso, o argumento mentiroso, diga-se de passagem – das armas de destruição em massa;

• Sir William Patey, então chefe do departamento de Oriente Médio do MRE da Inglaterra, afirmava que a invasão do Iraque não encontra respaldo legal no ordenamento jurídico inglês;

• Em 2002, Lord Goldsmith, então procurador geral, havia declarado que as propostas de mudança de regime no Iraque “não eram uma base jurídica para a ação militar”.

Os desdobramentos

Alguns depoimentos são esperados e vão movimentar amplamente a imprensa britânica e, espero, a mundial. Entre esse se encontram: a) John Scarlett, ex-diretor do serviço de inteligência britânico (o famoso MI6, o do 007…), b) o embaixador britânico nos EUA, Christopher Meyer e c) o embaixador britânico na ONU, Jeremy Greenstock.

Scarlett foi o responsável pela produção de um “dossiê” que tentava “provar” para a sociedade britânica à época que o Iraque estava mesmo cheio de armas de destruição em massa. Tal arsenal, como a história mostrou, jamais foi encontrado e nunca será mesmo, porque simplesmente não existia. A maior mentira contada ao mundo em todos os tempos.

Os dois homens fortes da ONU também serão chamados a depor. O ex-secretário-geral da ONU, Kofi Annan e o ex-inspetor de armas químicas, o suíço Hans Blix (que depois que saiu da ONU escreveu um livro sobre o assunto e diversas palestras e tem viajado o mundo para reafirmar, em palestras que tem feito, que tudo fora uma imensa mentira para justificar a invasão do Iraque e a deposição do regime de Saddam Hussein.

O período que compreenderá as investigações iniciam-se em julho de 2001 (quase dois anos antes, quando se suspeitava desde então que Blair já se preparava para apoiar a deposição de Saddam) até julho deste ano.

O zeloso funcionário de carreira aposentado, que presidirá a CI, Sir John Chilcot, tem dito que a investigação fará um exame “aprofundado, rigoroso, justo e honesto dos fatos”. Ainda que tudo indique que a mesma não condenará ninguém e limitar-se-á apenas a apresentar algumas “reprimendas” para que erros futuros não se repitam, suas conclusões deverão ter imensas repercussões políticas e podem tomar rumos que hoje ainda não estão dado.

Esperemos que a verdade venha à tona. Só o fato de a Comissão ter sido instalada, é uma prova de que a correlação de forças pode estar modificando-se em nosso favor, ou seja, em favor dos que buscam a verdade, a justiça e um mundo melhor, sem guerras, sem invasões e sem ocupações de países.

Nota

(1) Pode ser lida na íntegra neste endereço http://port.pravda.ru/mundo/28400-1/

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