O desafio do rumo e do caminho

A proposta do PCdoB para o Brasil, objeto de debates no 12o Congresso do partido, que está em curso, traz o duplo mérito de reafirmar o rumo socialista e aprofundar o que o partido entende como o caminho a seguir desde já. “O fortalecimento da Nação é o caminho, o socialismo é o rumo”, proclama o Programa Socialista para o Brasil que, com alterações eventuais, mas não essenciais, sairá da plenária final do congresso, de cinco a oito de novembro, em São Paulo.

Tempos atrás, aqui mesmo no Vermelho, publiquei o artigo “A estratégia na tática”, afirmando que em “momentos como o que se vive nesses primeiros anos do século 21, de defensiva estratégica das forças revolucionárias, em que a necessária acumulação de forças se processa lentamente, em boa parte vinculada à própria institucionalidade da democracia burguesa, não raro suscitam dúvidas, inseguranças, equívocos políticos à direita e à esquerda e até mesmo a perda de rumo”. Daí a reafirmação do socialismo como objetivo estratégico do partido – ainda que, à primeira vista, possa parecer óbvio para uma agremiação comunista – ser algo com o especial significado de sustentação política e teórico-ideológica.

O que é verdadeiramente novo no programa em exame é o aprofundamento do caminho singular para um socialismo com feição brasileira, algo apenas insinuado no programa anterior, de 1995. O que se tem agora são indicações mais precisas, mais minuciosas sobre os “meios políticos e organizativos que possam levar à vitória do objetivo estratégico delineado: conquista da república democrática popular, condutora da transição para o socialismo”. E diz-se: “Na atualidade, o caminho para se atingir esse objetivo maior consiste no delineamento e execução de Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento (NPND)”. Afirmados tais pressupostos, o Programa Socialista para o Brasil segue em detalhamentos.

Aqui não se pretende examinar o programa em si, mas destacar a importância dessa definição de caminhos, chamando a atenção para a relação dialética entre rumo e caminho (ou, em outras palavras, entre tática e estratégia). Ao afirmar o caminho (obviamente no grau de generalidade necessário para evitar a armadilha das quimeras), o programa confere ao rumo uma concretude mais consistente do que havia antes. E ao reafirmar o rumo, empresta ao caminho o sentido transformador que se pretende, ou seja, que favoreça a acumulação na trajetória rumo ao socialismo.

Voltando ao artigo acima mencionado: “Sem uma estratégia bem definida (e, sobretudo, compatível com a realidade sobre a qual se atua), a tática não passa de movimento errático. Por outro lado, sem a definição de táticas adequadas, a estratégia torna-se algo abstrato, intenção (por melhor que seja) perdida no etéreo e, assim, inalcançável”. O novo programa do PCdoB calibra a relação entre essas duas categorias essenciais da luta política, segundo as circunstâncias contemporâneas.

O tempo e o amadurecimento do processo político brasileiro cobrarão novos aprofundamentos, tanto no caminho, quanto no rumo. O trabalho apenas começou. Abandonado o “conforto” do modelo único, põe-se agora o desafio – e que desafio! – de avançar numa proposta estratégica à brasileira, diante de toda a diversidade e complexidade desse país continental. E também de atualizar e detalhar o caminho estabelecido. Penso que este é o maior esforço teórico que o partido terá que enfrentar – e já enfrenta – em seus 87 anos de existência. Como contemplar as agregações da contemporaneidade, como respeitar o singular na construção do projeto nacional socialista – e do caminho até ele – sem violar princípios permanentes, a natureza revolucionária e de classe do projeto, a base teórica que o sustenta: aí está um severo repto da História.

As opiniões expostas neste artigo não refletem necessariamente a opinião do Portal Vermelho
Autor