O discurso de Aldo Rebelo

A grande batalha política da eleição para a presidência da Câmara dos Deputados, no último dia 2 de fevereiro, ensejou uma manifestação na tribuna do plenário da casa legislativa que se deveria estudar com atenção, pela sua oportunidade e pelo conteúdo. F

Ele havia sido lançado pelo Bloco de Esquerda, composto pelo PSB, PDT, PRB, PMN e PCdoB. Depois de lançada a candidatura o PDT acabou se retirando e no processo seguiu outro caminho. Aldo, de forma correta e determinada, valorizou a disputa que se estabeleceu e procurou explicitar as posições. O resultado, todos acompanharam e redundou na eleição de Michel Temer para a próxima legislatura. Aldo — quando discursou apresentando as idéias de sua chapa — buscou alinhavar junto com seus colegas, o programa e a plataforma de ação de sua propositura, consubstanciados nesta transcrição (sem a revisão do autor) que publico aqui nesta coluna.


 


 


O SR. ALDO REBELO (Bloco/PCdoB-SP)


 


 


Senhor Presidente, Deputado Arlindo Chinaglia, prezados amigos, ilustre Deputado Michel Temer, ilustre companheiro Ciro Nogueira, minhas companheiras Deputadas, meus companheiros Deputados Federais, há mais de 180 anos o plenário desta Casa tem sido palco dos dramas, das tragédias e das vitórias no esforço de construção da nossa Pátria.


 



Desta tribuna, dirigiram sua palavra ao Brasil José Bonifácio de Andrada e Silva e seus irmãos, Joaquim Nabuco e Rui Barbosa. De tribuna semelhante a esta, o Brasil lutou pela sua independência nas Cortes Gerais, em Lisboa. Quando apupado pelos Deputados portugueses e pela platéia, Antônio Carlos de Andrada exigiu silêncio, porque, da tribuna que ocupava, teria de ser respeitado até pelo Rei.


 



Nesta Casa, cada Deputada e cada Deputado são imperadores do seu mandato, da sagrada concessão que o povo brasileiro, na construção da democracia, ainda pode fazer aos seus iguais, o que não é muito numa sociedade tão profundamente marcada pelos desequilíbrios e pelas desigualdades.


 



Recentemente, todos tivemos a oportunidade de comparecer à posse de Prefeitos Municipais. Por acaso, estava em Alagoas, onde compareci à posse de cinco Prefeitos de pequenos Municípios de quatro mil, cinco mil habitantes. Em cada um deles, houve uma festa do povo na posse do Prefeito e dos Vereadores. Na expressão da vontade de cada eleitor de qualquer Município pobre do Brasil há a exteriorização da soberania popular.


 



É inaceitável, Sr. Presidente, que, ainda nem um mês tenha passado dessa festa cívica, os Deputados representantes do povo cheguem a Brasília para a sessão de escolha de seus representantes e encontrem pronta, acabada, acertada por antecedência, enquanto trabalhavam nas suas bases (palmas), uma chapa do Presidente aos Suplentes de Secretário da Mesa Diretora, inclusive com a ameaça de que um novo AI-5 editado às vésperas da eleição puniria aqueles que tentassem concorrer, que tentassem o voto dos seus iguais. (Palmas.)


 



Sr. Presidente, ocupei a posição de V.Exa. em momento difícil desta Casa, quando ela enfrentava a crise de impedimento do Presidente Severino Cavalcanti, quando o próprio Poder Executivo vivia uma crise de instabilidade pouco conhecida ao longo da história do País, quando cinco CPIs, como tribunais nazistas, arrolavam Deputados para o banco dos réus sob o aplauso da imprensa e a intimidação de boa parte do Plenário. (Palmas.)


 



Nesse momento, como ex-Ministro do Governo Lula, compareci ao Conselho de Ética para testemunhar em favor de um dos acusados. E todos aqui, de todas as legendas, sem exceção — não apenas o ex-Deputado José Dirceu, o ex-Deputado João Lyra, o Deputado Eduardo Siqueira Campos, o Deputado Carlos Nader — sabem da minha posição de coragem e de solidariedade nos momentos que a Casa enfrentou. (Palmas.)


 



Naquela oportunidade, Sr. Presidente, não bastasse a conjuntura então vivida, a Casa foi invadida, depredada, funcionários e Deputados ameaçados! E, numa escolha difícil entre a invasão da Polícia no espaço sagrado do Congresso Nacional ou a pusilanimidade de não fazer face à situação, eu a enfrentei com coragem e com serenidade.


 



Pois bem, Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados. Aqui estamos reunidos, e não creio que esta sessão seja uma farsa, não creio que esta sessão seja apenas para referendar um acordo de cúpula, realizado há dois anos, em que se transfere a Presidência da Câmara dos Deputados como uma sesmaria ou uma herança.


 



A Presidência da Câmara é a Presidência dos Deputados! (Palmas.)


 



E é assim que me sinto como candidato a Presidente, como brasileiro que respeita cada mandato, que se sente à vontade em Pacaraima, na fronteira com a Venezuela, ao lado do nosso companheiro Marcio Junqueira, Parlamentar do Estado de Roraima; que se sente à vontade colhendo uvas com o Deputado Afonso Hamm, em Bagé; que se sente à vontade em Ponta Porã, na fronteira com o Paraguai, almoçando no restaurante preferido do Deputado Waldemir Moka. Sou, acima de tudo, um brasileiro das portas de fábricas de São Paulo, das coxilhas do Rio Grande do Sul, ou do encontro das águas do Rio Negro com o Amazonas. Tenho demonstrado, ao longo desses 20 anos, que defendo, acima de tudo, os interesses da Casa e os interesses do Brasil.


 



Deputado por São Paulo há 20 anos, nunca houve um só ano — e aqui estão alguns Prefeitos da minha pequenina Alagoas — em que eu não destinasse parte das minhas emendas para que Alagoas fosse ajudada sem que lá eu tenha voto, mas apenas o meu coração. (Palmas.)


 



Por essa razão, Sr. Presidente, Sras e Srs. Deputados, é que não consigo compreender a possibilidade de um único partido empalmar os 2 postos-chaves do Congresso Nacional, que manobras tentem esconder o óbvio, porque todos sabem que a antecipação das eleições nesta Casa é para esconder que o grande partido — o peixe grande que invade o espaço dos peixes pequenos, como diria o Padre Vieira — , tomada a presa no Senado, quer esconder de todos que a presa também aqui está ao seu alcance.


 



Aqui não se discute o partido nem o homem. Respeito profundamente o Deputado Michel Temer — se alguém examinar os Anais desta Casa verá que todas as minhas palavras foram de respeito a S.Exa. Fui membro do PMDB, delegado à convenção nacional, realizada no plenário do Senado Federal, que indicou Tancredo Neves candidato à Presidência da República. Não discuto o homem; discuto o lugar do homem. Não discuto o partido; discuto o lugar do partido.


 



Não posso admitir entrevistas como a do Deputado Eliseu Padilha às folhas do Rio Grande, na qual trata como traidores os possíveis colegas que não votarem no Deputado Michel Temer. Ao que eu saiba, as Deputadas e os Deputados não celebraram matrimônio nem pacto de fidelidade com nenhum candidato à Presidência desta Casa. (Palmas.) Não é do meu conhecimento que esse juramento tenha sido feito nem, como nos antigos casamentos, alguma procuração tenha sido outorgada para a celebração de matrimônio entre eleitores e candidatos.


 



Respeito, como prócer, quem sabe o Deputado Michel Temer vitorioso, o futuro sucessor e Presidente da Casa Deputado Eduardo Cunha. Mas o Deputado Eduardo Cunha não pode fazer as questões de ordem para tentar impedir que a Casa tenha tempo para deliberar e escolher, com tranquilidade e serenidade, o seu Presidente.
O apelo que faço não é em meu nome! Não tenho pretensões de presidir a Casa! E V.Exa., Deputado Arlindo Chinaglia, pode testemunhar que nunca indiquei um porteiro de prédio nem um engraxate em São Paulo por ocupar Ministério ou Presidência da Câmara dos Deputados. O pouco que fiz, quando administrava a crise e não a Câmara, era sempre em face dos legítimos interesses dos nossos companheiros e dos partidos que estão aqui.


 



Assinalo, mais uma vez, que não é ao PMDB — nem seria ao DEM, ao PSDB ou ao PT — que se pode dar a concentração nem o monopólio do poder.
''Hoje'', diz o Deputado Moreira Franco, ''o apoio futuro à Ministra Dilma Rousseff dependerá da eleição do Deputado Michel Temer”.Amanhã, provavelmente, esse apoio vai depender de uma lista infindável de reivindicações e, quem sabe, de espaços que muitos aqui terão de ceder para a grandeza e para a força de um único partido. (Palmas.) E diria isso, meus companheiros do PMDB, em qualquer circunstância, em qualquer outra candidatura ou em qualquer circunstância de outro partido ter a mesma pretensão.


 



Todos sabem, embora com a ajuda da mídia tente-se esconder, o resultado consagrado do Senado. Tenta-se omitir para que as duas presas, as duas trincheiras, os dois quartéis do Legislativo sejam entregues uma única legenda, a uma única sigla.
Não creio que seja isso saudável para a democracia, nem creio também que, na Presidência da Casa, o Deputado Ciro Nogueira ou eu constituamos qualquer ameaça à institucionalidade ou ao equilíbrio de forças políticas no Congresso Nacional e no Brasil. (Palmas.)


 



Serei o primeiro a respeitar todos e a respeitar a tradição, a presença e a força do PMDB. Mas não posso respeitar, não posso apoiar, nem posso querer o monopólio de um único partido na Casa, que é o lugar da pluralidade, da diversidade, onde tem de prevalecer, acima de tudo, o equilíbrio entre as forças políticas.


 



Minhas qualidades e meus defeitos, Sr. Deputado Arlindo Chinaglia, são conhecidos de longa data, porque já é longeva a minha trajetória. Muitos, aliás, me deram o prazer de comparecer à comemoração dos meus 30 anos de vida pública, iniciada num colégio agrícola de Alagoas. Fui Vereador; Deputado Federal por cinco mandatos.
Creio que não devemos debater os temas pelo critério da polêmica, nem pelo critério da importância. Há temas importantes que não são polêmicos, há temas polêmicos que não são importantes.


 



Nós retomaremos a discussão da reforma tributária, da reforma política, da situação da educação, da saúde e da segurança pública no Brasil. A Casa terá a sua agenda, porque é comovedor para mim testemunhar a inteligência, o esforço, a criatividade de Líderes do Governo e da Oposição numa luta inglória na defesa de uma medida provisória que já vem pronta ou na obstrução de sua votação.


 



As principais inteligências da Casa discutirão os assuntos de interesse do povo e do País. Na política, ninguém tira diploma de credibilidade. A credibilidade vem todo dia, das instituições e do exercício do mandato.


 



Peço, portanto, a confiança de cada Deputada e de cada Deputado para conduzir os destinos desta Casa do povo com serenidade, equilíbrio, humildade, respeito e espírito público. Não para defender a divisão da Casa, a disputa fratricida entre os partidos, mas para defender a união da Casa. Todas as Deputadas e Deputados são iguais.
Tenho consciência, Presidente Arlindo Chinaglia, de que as minhas palavras, dentro de alguns instantes, já pertencerão apenas aos Anais da Casa. As minhas palavras não terão capacidade de mudar o destino da Casa e do País, mas o voto dos senhores terá essa capacidade, e é por isso que espero.


 



Muito obrigado. (Palmas.).

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