O Renascimento do Continente Africano é tarefa antiimperialista

O imperialismo ganha vigor e longevidade na medida em que aprimora sua capacidade de impor hegemonia política planetária, explorar povos e países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento e evitar mobilidade na hierarquia das nações. Sendo assim, os oito anos de Governo Lula são essencialmente antiimperialistas, visto que o desenvolvimento do Brasil permitiu a imposição de uma nova relação política com os Impérios.

Lula soberanamente lançou mão de ações que balançaram o tabuleiro geopolítico mundial, cuidadosamente construído pelas nações poderosas. Tomando esse critério como parâmetro, qualquer nação ou blocos de nações (Mercosul, BRIC, G20, União Africana – UA) relacionados como economias subdesenvolvidas ou em desenvolvimento, que prospera e impõe novas agendas, assume mesmo que involuntariamente um caráter antiimperialista. Quanto mais instabilidade prevalecer entre os pobres, maior será o domínio dos ricos. Daí a razão das agendas dos países ricos, especialmente dos Estados Unidos, serem recheadas de intervencionismos, atentados contra a soberania dos países pobres, ocupações, guerras, fomentos de conflitos, etc.

A África no contexto geopolítico mundial

Munidos de chumbo e um enunciado racista que justificava o arbítrio, os impérios iniciaram um processo nefasto após o contato com a África. Primeiro através do tráfico transatlântico, dito com maior precisão: tráfico de carne humana para o trabalho escravo nas colônias do Novo Mundo. Posteriormente, implantam o colonialismo em solo africano, nele estabelecem outro papel ao continente: cessão de espaço vital (segundo o conceito ratzeliano) com objetivos de explorar matérias primas e constituir um pequeno mercado consumidor para compra de manufaturas.

Os dois eventos foram fundamentais para acumulação primitiva do capital, contribuíram com o desenvolvimento e consolidação do capitalismo. Logo, grande parte da riqueza dos poderosos decorre do saque ao continente negro. É possível atribuir a presença imperial da Europa e dos EUA e a complacência de uma minúscula elite africana, que sempre se locupletou com os saques de seu povo, a responsabilidade pelo atraso econômico e pela pobreza de um povo assentado em um continente que guarda uma incalculável riqueza.

Embora a estrutura colonial – iniciada na partilha da África, durante a Conferência de Berlim, em 1884 – tenha sido defenestrada de todo continente – em 2010 completa 50 anos que bandeiras anticolonial tremulam forte em solos africanos -, há heranças malditas do período colonial, a África sofre efeitos desse processo de exploração insana. Aos impérios, seu papel na geopolítica continua incólume: reserva territorial para exploração de matérias primas e compra de manufaturas – nem que seja arma e munição para alimentar conflitos.

Considerando que o lugar do Continente Africano foi estabelecido historicamente pelos impérios, a reversão dessa ordem será um duro golpe no imperialismo, pois quando cinqüenta países unidos em um único bloco, soberanamente reivindicarem seus destinos, os poderosos perderão a primazia do usufruto dos bens que os homens produzem e a natureza fartamente oferece.

Renascimento Africano

Assumindo o risco de incorrer em superficialidade, Renascimento Africano tem a mesma natureza que desenvolvimento africano, embora Renascimento guarde aspectos culturais, históricos e políticos singulares que não serão objetos desse texto. Para evitar dúvidas que surgem em explicações de conceitos políticos e salvaguardar a essência do termo, é perfeitamente possível afirmar que o substrato do Renascimento Africano é a conquista de melhor qualidade de vida aos africanos, a partir de projetos e planejamentos próprios, sem tutela. Uma Nova África está em pauta, no Continente e entre os movimentos sociais negros em toda diáspora (países que receberam africanos através do tráfico transatlântico e forte imigração em razão dos conflitos armados e da fome). Há convicção das forças internas consequentes e uma crescente solidariedade internacional, além de elementos objetivos que sustentam a tese que atribui ao século 21 o século do Renascimento Africano, seguem:

1. Vertiginosa explosão demográfica. A África atingiu a cifra de um bilhão de habitantes, segundo relatório de Population Reference Bureau (organismo dos EUA) calcula-se que em 2050 o Continente Africano atingirá a cifra e 349 milhões de jovens, equivalente a 29% do total mundial.

2. Avanço da democracia. Está em curso um processo de alternância de poder com ascensão de forças democráticas, em razão do envelhecimento dos governantes golpistas, arbitrários e com interesses ligados aos impérios. Depuseram violentamente governos revolucionários que ascenderam ao poder com apoio popular, são co-responsáveis pela maioria dos conflitos que assolaram a África nos últimos trinta anos. Novos tempos e novos ares se avizinham na vida política africana.

3. Instituição da União Africana (UA) com a tarefa de constituir os Estados Unidos da África, de modo que o projeto preconiza que os cinqüenta países diluirão em apenas um, uma nação forte. Esse processo está em estágio crescente de amadurecimento. Os africanos darão passos decisivos em 2010 na direção desse desafio. Formalizarão inicialmente entre os países subsaarianos, a chamada África Negra, visto que o enraizamento da cultura e interesses árabes no norte impede imediata unificação.

4. Presença de líderes africanos comprometidos com o Renascimento Africano na direção de todas as instituições multilaterais (ONU, UNESCO, UNICEF, OMC), de modo que o fortalecimento do multilateralismo joga água no moinho do Renascimento Africano, pois nesses espaços as lideranças buscam influenciar todas as resoluções importantes para as nações, exigem critérios justos na resolução de choques de interesses e trabalham para resgatar as dívidas que os impérios têm com o continente.

5. Fim dos conflitos e busca de resolução africana. A África tem se estabilizado, o continente outrora conflagrado, hoje está desafiado a encontrar resolução a cinco focos de conflitos, sendo o Sudão (concentrado em Darfur) o que mais preocupa, pois os outros (Somália, Uganda, Chade e o enclave angolano de Cabinda) estão em estágio avançado de resolução.

6. Forte presença do Estado no planejamento, fomento e execução do desenvolvimento. Trata-
se de uma medida para blindar o acúmulo de experiências liberalizantes protagonizadas por interesses estrangeiros, além de não ceder o destino africano a exploração colonial imposta pelas transnacionais.

7. Formação de um corpo técnico qualificado. Em quinze anos se formará aproximadamente trinta milhões de africanos espalhados nas melhores universidades do planeta, concentrados majoritariamente em cursos tecnológicos. Há estimativa de um mínimo de 80% de repatriação. Essa experiência corresponde a uma necessidade orgânica da África e foi inspirada nas experiências chinesa e indiana na formação de seus quadros.

8. Exploração dos recursos naturais e agregação de valores para comercializar. É sabido que dos quarenta e oito minerais considerados estratégicos para o mundo industrializado, trinta e oito estão concentrado na África (petróleo, diamante, urânio, cobre, cobalto, etc.). Os africanos estão dispostos a aplicar todo conhecimento que acessarem para transformar sua riqueza em melhores condições de vida para população, por isso é possível que questões que assegura exclusividade de uso e comercio de conhecimento seja relativizada por eles.

Apoio ao Renascimento Africano

Para o efetivo Renascimento Africano urge recuperar o patrimônio intelectual africano deixado e sua contribuição no desenvolvimento da história e da economia do mundo. Um povo não se desenvolve quando sua auto-estima está comprometida, por isso é importante enfrentar o desafio de superar o modo de pensar dominante, ou seja, descolonizar o pensamento dos povos dominados, relativizar ou romper com o eurocentrismo e valorizar as construções genuinamente africanas.

Na hipoteca de solidariedade devemos considerar que, além dos elementos objetivos que sustentarão o Renascimento Africano, há outros níveis de necessidades que exigirão solidariedade e cooperação das nações e povos:

1. A África será próspera e livre se a sociedade civil se fortalecer, criar mecanismos e instituições que promovam a participação popular nos rumos dos países, abolirem definitivamente – por meios próprios – o uso da força para resolução de contradições.

2. Considerar que as classes dominantes invariavelmente viram a costa ao seu povo. Na África não é diferente. Há uma classe dominante nefasta, oportunista e corrupta, signatária dos desmandos provocados pelos interesses da burguesia internacional. Essa parcela da elite deve ser derrotada pelo bem do povo. Não advogo o fim das elites africanas, mas não podemos fazer vistas grossas aos que não desejam o fim das mazelas africanas porque enriquece com elas.

3. Não reconhecimento das dívidas externas contraídas com as potências mundiais. Na verdade as potências mundiais têm um grande passivo com a África, por isso considero a dívida externa africana imoral, ilegítima e ilegal. É um acinte, deve ser repudiada toda pressão do Banco Mundial ou do FMI para resgatá-las.

4. Intensificar a cooperação com investimento externo a fundo perdido em infra-estruturas, promover transferência de técnicas e advogar pelo fim do protecionismo agrícola dos europeus.
Devemos nos associar ao Renascimento Africano, somos beneficiários do bem mais precioso subtraído das terras africanas: gente. Temos identidade comum e o tema se constitui em uma causa antiimperialista. A África livre, próspera e altiva contradiz profundamente os interesses imperialistas.

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