Paraíba do Norte, Maranhão

Alguns poucos que me leem por aqui perguntam a razão do meu sumiço, os motivos do meu silêncio. Desconverso, alego o pouco tempo, o trabalho muito, a correria de cidade em cidade, a vida cobrando o seu tributo pesado.

A verdade mesmo é que a escritura cansa, diante de tanta coisa ruim, de tanto desgoverno, tanto descalabro, tanto ódio, tanta imbecilidade. A escritura entra em estado depressivo, um torpor do qual não é fácil sair. É que o escriba olha para os lados e começa a se perguntar se vale a pena escrever, se na situação em que nos encontramos alguém prestará atenção na sua escritura.

A cada dia tenho a sensação de que são incontáveis os degraus que ainda restam até o fundo do poço. Descemos cada vez mais, e a impressão que dá é que esse torpor que me atinge ameaça contaminar a nação inteira.

Reúno forças para escrever, entretanto, depois de mais um dos inumeráveis absurdos vomitados pelo ódio e pelo preconceito do abjeto capitão.

Sou um sertanejo, um matuto do sertão do Ceará, do oco do mundo, de um lugar quase esquecido numa dobra do mapa. Aprendi desde cedo a peitar o preconceito e o ódio. Matuto pobre, nordestino, convivo desde há muito com a desconfiança em relação ao meu lugar de origem, e com a pergunta que invariavelmente se segue: de qual família você é?

A mais recente diatribe do presidente (com minúscula, por favor) revira fundo a velha ferida. Paraíba, baiano, matuto, beiradeiro, esses nomes que carrego com orgulho, são pronunciados como ofensa, com desdém, com desprezo.

Gente como o presidente, que fala em pátria e tem a palavra Brasil rasa na boca mas que bate continência para a bandeira dos Estados Unidos, gente assim enxerga apenas o Brasil e a pátria que lhe interessam. O país do presidente é branco, rico e sulista. Para ele, o nordeste, esse bando de paraíbas, não conta, não interessa.

Assim, mesmo com toda a indignação, não me surpreende a fala dele. Um amigo, prefeito de uma cidade vizinha, desde antes da eleição me dizia: “Se Bolsonaro ganhar vamos comer capim”. Ainda esta semana, lembramos do que ele dissera e concordamos que não estamos longe disso. A fome, que o presidente desconhece, já bate a nossa porta. Em breve, a depender de como ele pretende tratar os estados do nordeste, nem capim nos restará.

E nós, o que faremos? Romperemos o torpor para combater a torpeza, que outro caminho não há.
E vamos cantar, e falar, e denunciar, e escrever, pois como na letra da canção que dá título a coluna, de Paulo César Pinheiro e João Nogueira, “quem morre calado é boi de corte”.

E se, como dizem os dois artistas, “quem canta mais forte espanta a morte”, quando a falange bolsonarista entoar seu canto vil de morte ao povo, cantemos mais forte pela vida, pela dignidade e pela democracia.

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