Prisões: privatizar é solução? (1)

Desde que o homem passou a viver em sociedade teve, entre seus membros indivíduos que não se adequaram às normas rudimentares de convivência. Ou tomavam atitudes que contrariavam as incipientes normas propostas, ou desafiavam a autoridade estabelecida. De forma que a contravenção ou a subversão da ordem é tão antiga quanto a própria humanidade.

A forma como se resolvia estas rebeldias ou dissidências variou de acordo com as normas estabelecidas pelas sociedades que se formavam. Mas o certo é que os desafiantes da ordem vigente foram, em sua quase totalidade, ou expulsos da convivência da comunidade (na melhor das hipóteses), transformados em escravos ou simplesmente, na maior parte dos casos, eliminados. E este era o destino dos acusados, em sua grande maioria, excetuando-se aqueles que, milagrosamente, pudessem contar com as benesses de algum poderoso para evitar sua execução.

Na idade média, não havia nenhuma garantia da integridade física, ou mesmo da vida daquele que era investigado. E os chamados ?crimes contra a fé?, com a instalação da Santa inquisição, instalou e formalizou a tortura e a fogueira para os presos hereges.Os ?juízes de Deus?, na idade média, tinham toda a autonomia para impor suas penas, que poderiam incluir inclusive a morte em fogueiras, caso os acusados fossem suspeitos de bruxarias, com o posterior confisco de seus bens.As primeiras prisões eram absolutamente insalubres: Calabouços, masmorras, espaços destinados apenas a guardar os condenados até sua execução. Geralmente localizadas nos subsolos de palácios ou igrejas,

A idéia de prisão como local capaz de recuperação ou ressocialização demorou milênios para acontecer. Os julgamentos, em sua grande maioria, decidiam por tortura, mutilações ou execução. Deixar alguém preso por tempo determinado foi uma novidade inventada pelo iluminismo, e bastante questionada. As cadeias, desde a antiguidade, durante a idade média e no princípio da idade moderna, misturavam homens mulheres e crianças, autores de graves atos infracionais com perseguidos políticos, desafetos de nobres e reis e doentes mentais. O desaparecimento de presos era normal e não questionado. Sair vivo de uma masmorra medieval era quase impossível.

A primeira cadeia que se tem notícia foi em Londres, Inglaterra, a House of Corretion, datada de 1550. Pela primeira vez, a sociedade pensava em reeducar os condenados, através da disciplina e do trabalho obrigatório. Depois, em Amsterdan, uma casa de correção de homens, e por volta de 1600 uma casa de mulheres, a primeira do gênero do mundo.

No Brasil, perto de 1770 foi construída a primeira prisão brasileira: a Casa de Correção do Rio de Janeiro, que abrigava infratores homens, mulheres e crianças. Só depois de 1824 a Constituição resolveu que os presos fossem separados por tipologia, sexo, mas não por idade. Não demorou para que a superlotação, o drama de todas as prisões, se instalasse.

As cadeias e o tratamento dispensado aos autores de atos infracionais sempre flutuaram ao sabor dos governos estabelecidos. Quando se instalam governos autoritários, as condições prisionais são relegadas à função punitiva. E é aí que se estabelece o duplo julgamento: O indivíduo recebe uma pena de privação de liberdade em função de sua conduta e de seus atos infracionais, e outra, ao ser jogado em depósitos humanos que em nada contribuirão para sua ressocialização.

Numa sociedade onde o importante não é ser, é ter, onde milhões de miseráveis não possuem sequer os direitos constitucionais básicos, com todo o apelo da mídia, é óbvio que os desejos impossíveis de serem realizados influenciam o modo de vida e suas opções de adquirir estes produtos. A perversa concentração de renda, a desigualdade de oportunidades e de acesso aos meios necessários a sobrevivência fazem com que cada vez mais o indivíduo seja jogado ao ato infracional como alternativa. E o encarceramento, que deveria servir como escola de ressocialização, acaba funcionando como medida duplamente punitiva: Ao mesmo tempo em que priva o indivíduo da liberdade, submete-o a condições geralmente subhumanas em função da superlotação, da falta de atividades, da má alimentação e da violência instalada dentro dos presídios.

(continua)

As opiniões expostas neste artigo não refletem necessariamente a opinião do Portal Vermelho
Autor