Transição Possível?

Explorando a complexidade da transição energética: desafios, custos e a busca global por soluções sustentáveis

Imagem de Emphyrio por Pixabay

Dois dias de imersão. No âmbito da V Conferência Nacional de C,T&I. Estruturado pelo Laboratório de Petróleo e Gás da UFPE.  Um debate estratégico. Especialistas de todo o Brasil. Participação expressiva. Técnicos governamentais, acadêmicos, estudantes, todos se fazem presentes. É o tema do momento.

Transição energética, os caminhos possíveis, as dificuldades, as novas perspectivas, a sociedade que teremos nos próximos trinta anos. Nem sempre convergente.

O aquecimento global, uma constatação. Quase unanimidade. Mas, sua origem traz controvérsias.

Recebo de um velho geólogo, ex professor universitário, um livro. Tenta fazer uma análise desde a formação da Terra há 4,5 bilhões de anos. Acredita que mudanças climáticas sempre ocorreram. Seriam advindas de fenômenos naturais não controláveis pelo homem. Com cálculos sofisticados, que ainda não entendi, chega à conclusão que a ação humana seria responsável por apenas 7% do que vem ocorrendo, o resto sairia desse controle. É minoria, se respeita a opinião, mas não se leva em consideração.

Uma certeza permeia todos. Estamos numa civilização que tem suas bases no petróleo. Mudanças fazem-se necessárias. No entanto, a reestruturação, o sucateamento de processos, a mitigação de impactos ou mesmo a adequação a uma nova matriz produtiva e de consumo têm custos muito elevados e deve ser, com cautela, assumida pelas diferentes instâncias da sociedade.

Nesse ponto surge o problema do tempo. Teremos condições em curto prazo de estancar processos que pioram a situação hoje observada? Quem financiará e como será essa transição? Como adequar a necessária sustentabilidade ambiental com segurança de suprimento e custos compatíveis? Decisões que, necessariamente, estão na agenda das diferentes nações. Ficou claro, também, que os caminhos não serão únicos para a humanidade, países diferenciados terão ritmos e caminhos nem sempre iguais ou convergentes.

Verdadeiras aulas das opções que se apresentam. Se pensarmos em energia, o êxito das solares e eólicas, as possibilidades com o hidrogênio, seja verde, azul ou branco, entre outras. Se pensarmos em combustíveis e na petroquímica,  os bicombustíveis para transporte, a nova aviação e suas opções Green, os veículos elétricos, novos insumos produtivos e muitos outros. A gama de opções apresentadas é vastíssima, procurar um aprofundamento para torná-las viáveis é função da pesquisa, da sociedade e das políticas públicas.

Tenho acompanhado a área, faz muitos anos. Fiz meu mestrado e doutorado em temas correlatos. Sempre escuto o mantra do “fim da era petróleo”.

Foi assim 1972 com o relatório Meadows no Clube de Roma, com o saudoso professor Bautista Vidal em 1975 que anunciava o etanol como o principal combustível do futuro, na década de 1980, quando se via no gás natural a possibilidade de substituir o óleo, época em que reservas significativas surgiam, com a mudança de hábitos e costumes propostos pelos ecologistas como José Lutzenberger ou Ignacy Sachs. E tem sido em anos recentes com novas fontes, eólica e solar, por exemplo, e os esforços para descarbonização das economias.

Infelizmente, o problema é mais complexo.

Professor da UFRJ, através de uma análise de valor agregado, mostra que o petróleo, no mundo, além de trazer lucros mais do que extraordinários para as empresas, é uma fonte de tributos que não pode ser desprezada. Nos dados atuais, admitindo que o barril de petróleo esteja a cem dólares e que os custos de produção se aproximem dos vinte, dos oitenta restantes a metade iria para o erário. Sem dizer que se pensarmos no barril dos combustíveis refinados, seu valor atual ultrapassa os quinhentos dólares e os estados nacionais são fortemente financiados por esses.

Isso coloca um dilema. A redução da participação dessa fonte energética e de combustíveis faz com que haja uma ruptura na lógica fiscal que pode comprometer muitos países. E mais, se forem analisados no Brasil, os programas de eficiência energética e de fontes alternativas para a transição, uma ruptura abrupta levaria a sérios problemas de financiamento e interrupção na base de conhecimento para uma sociedade menos dependente. Lembrando ainda que nossos programas são ainda tímidos frente aos dos países centrais e limitados em recursos, o que leva à necessidade de mudar de patamar, aumentar em muito suas escalas.

Uma análise da situação internacional atual mostra que novas reservas petrolíferas têm surgido e deverão ser exploradas. A China e mesmo a Venezuela têm apresentado campos enormes. No caso brasileiro e sulamericano, a margem equatorial aparece como muito promissora, não pode ser desprezada. Ainda mais, tendo em mente que o Brasil é um dos poucos países detentores da tecnologia de exploração offshore, em águas profundas. 

Com isso, o cenário que poderia parecer que seria celeremente modificado, talvez nos próximos vinte anos, pode ter um período de acomodação bem mais longo.

Concluir neste panorama é uma temeridade. Especialistas apontam que a questão ambiental se deteriora mais rápido do que o imaginado. A lógica capitalista da sociedade aponta para um retardar da colocação em prática de soluções já dominadas, mas com custos ainda muito elevados. Os problemas sociais se aprofundam, inclusive com os possíveis impactos na saúde humana das populações. Um ambiente difícil de resolver.

Tem-se uma certeza e consenso pelo menos.  Cada vez mais é importante evoluir na busca do conhecimento científico, no desenvolvimento de novas opções, na pesquisa de alternativas mais adequadas. E isso exige constância e recursos. Um mundo a ser construído que fuja dos interesses individuais e corporativos, que permita que o coletivo seja o norteador das decisões.

As opções, do que implantar e rotas tecnológicas em que se possa apostar, passam pelos modelos políticos assumidos pelos países e pelas lógicas empresariais. Pressões de todos os lados existirão. Decisões nada fáceis, anos difíceis.

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