Vital Nolasco, um revolucionário maior

Em troca, Vital deveria assinar declaração de que não havia sido torturado. E não assinou. Como resposta, obteve um desabafo do delegado: “Vocês ainda vão ser vitoriosos porque são uns loucos!”

O líder operário e militante comunista Vital Nolasco (1946-2022)

Eustáquio Vital Nolasco, que morreu na manhã deste 19 de janeiro de 2022, em São Paulo, foi um valoroso camarada que conheci por volta do VII Congresso do PCdoB, em 1988. Estive muitas vezes com ele, uma delas em 2012, quando escrevi seu perfil para o livro “Vidas, veredas: paixão”, que produzi para a Fundação Maurício Grabois. Abaixo, alguns trechos:

“Em sua pequena sala de Secretário de Finanças do Comitê Central do PCdoB, Vital Nolasco ergue a camisa e mostra as cicatrizes de sua estada de 40 dias no Doi-Codi paulista, em 1974. Lanhos que descem, em paralelas, pelas costas, resistentes ao tempo. No cardápio das torturas, além das chicotadas que o marcaram para sempre, o trivial das salas de suplício da ditadura: pau-de-arara, choque elétrico, afogamento, tapas na orelha, bofetões, chutes. Em dez dias nas mãos dos torturadores, Vital perdeu os sentidos por duas vezes e foi reanimado por médico de plantão. Maria, a irmã, e o cunhado Luiz Tenderine, ex-padre italiano, foram levados à delegacia e torturados em sua frente. Mas da boca de Vital, os policiais não ouviram nada.

Com sua prisão denunciada na Europa pela congregação a que pertencia Tenderine, a repressão recuou. Antes de soltá-lo, porém, vieram as propostas. Primeiro, um exílio na Itália. Em seguida, um emprego na Petrobrás. Por fim, uma casa em Belo Horizonte. Todas recusadas, até porque, em troca, Vital deveria assinar declaração de que não havia sido torturado. E não assinou. Como resposta, obteve um desabafo do delegado: “Vocês ainda vão ser vitoriosos porque são uns loucos!”. Solto, foi para Belo Horizonte encontrar a mulher, mas logo voltou para São Paulo, empregou-se numa indústria química e retomou a atividade política interrompida pela prisão”.

“Eustáquio Vital Nolasco foi um trabalhador precoce. Segundo dos dez filhos do padeiro Orlando e da lavadeira Diva, Vital estava com dez anos de idade quando começou a buscar leite para os vizinhos do Jardim América, vila operária isolada nas cercanias de Belo Horizonte, onde morava com a família. Todas as manhãs caminhava dez quilômetros até a Gameleira e voltava com o pequeno tambor de cinco litros sobre os ombros. Aos 12 anos vendia no bairro legumes e verduras comprados no mercado central e também o esterco que apanhava nas redondezas, curtia e secava. À noite, estudava. Um tio o iniciou nas artes da serralheria e, logo após concluir o curso comercial e servir o exército, empregou-se numa metalúrgica e ingressou na Juventude Operária Católica (JOC)”.

Da JOC Vital seguiu para a Ação Popular (AP) e, mais tarde, acompanhou a maioria dessa organização que se incorporou ao PCdoB. Ativo militante do movimento operário e popular. Vereador na capital paulista entre 1988 e 1996, foi eleito para o Comitê Central em 1992, no VIII Congresso. Nunca deixou de lutar pela democracia, o progresso social, a soberania do Brasil e o socialismo. Um revolucionário maior que merece o respeito dos seus camaradas e do movimento democrático e progressista.

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