A febre do jornalismo

Não são poucos os estudiosos da mídia internacional que avaliam que uma parte considerável do jornalismo está doente. A pandemia que afeta veículos de comunicação em escala mundial é a do jornalismo sensacionalista, que se sustenta em poucos fatos e em muitas suposições. Essa enfermidade ataca o cerne da credibilidade da profissão, uma vez que a reportagem e a busca de fontes e dados checados com rigor sedem lugar para textos pouco confiáveis, parciais, de caráter opinativo e que acabam influenciando toda uma sociedade.



No Brasil, essa epidemia se alastra sob o signo do catastrofismo, do denuncismo, da delação premiada. Esses sintomas não são aleatórios, mas articulados. Nos últimos anos, têm se manifestado em iniciativas com um objetivo comum de desestabilizar e derrubar o governo do presidente Lula.



Os casos do momento se dão em torno do apagão e da febre amarela. O primeiro não passa de especulação e boataria, que tem trazido instabilidade ao setor energético e a outras áreas da economia. Sim, o Brasil tem sérios problemas de infra-estrutura nesse campo que se acumulam há muitas décadas. Porém, investimentos têm sido realizados e medidas adotadas para evitar racionamento no período de seca, como aconteceu na vizinha Argentina.



Quanto a febre amarela, os casos registrados no último mês e divulgados pela imprensa como uma grande novidade, na verdade não o são. De 1997 até 2005, segundo dados disponíveis na página do Ministério da Saúde, o Brasil teve 327 casos confirmados de febre amarela. O ano que registrou mais casos foi o de 2000, com 85 pessoas contaminadas, já o menor registro foi em 1997 e 2005, com três casos cada.
A doença tem duas formas, a urbana – que está erradicada desde 1942 –, e a silvestre – que está controlada e circunscrita à algumas áreas de risco de contágio, todas próximas a regiões de floresta.



Claro que não se pode descuidar e nem menosprezar as cinco mortes que ocorreram nesse período. É necessário que as autoridades sanitárias e o governo tomem todas as medidas cabíveis. Mas, o que não se pode fazer – como faz a direita – é utilizar essa questão como mais uma oportunidade para atacar o governo. E pior, ao jogar no ar a eminência de um surto ou epidemia de febre amarela no país, a mídia espalha pânico e desinformação entre a população, que superlota postos de saúde por todo o Brasil.
O médico infectologista e professor de Moléstias Infecciosas e Parasitárias da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e diretor-clínico do Hospital das Clínicas da USP, Marcos Boulos, afirmou que “não está acontecendo nem mais nem menos febre amarela que em outras épocas”. “O que acontece é que houve uma divulgação e isso gerou polêmica”, analisa.



A febre amarela silvestre faz parte do ciclo natural de animais da floresta, particularmente primatas e por isso não tem como ser erradicada. As vacinas existentes contra a doença são altamente eficazes e o programa de vacinação do governo tem uma grande cobertura nas áreas de risco.



Já a epidemia que acomete a mídia nacional persiste e pior, os doentes não admitem estarem contagiados e resistem a qualquer tipo de tratamento. Por isso é preciso insistir na prevenção, fortalecendo os espaços para o contraditório e para opiniões diversas que gerem mais debate e possibilidade de reflexão na sociedade; além de aprofundar a luta para democratizar a mídia.