As falaciosas previsões de 2009

O Brasil entra em 2010 num clima de otimismo generalizado. Situação oposta à de um ano atrás quando, no auge da crise econômica mundial, as trombetas catastrofistas previam o apocalipse do afundamento inevitável da economia brasileira.

Ao longo do primeiro semestre de 2009 as previsões negativistas se multiplicaram. Em abril, a agência Focus, especializada em previsões do futuro com base em especialistas do mercado financeiro, garantia que o PIB ia cair 0,39% em 2009. E que o país só voltaria a crescer em 2010, à taxa modesta de 3,5%. Em maio, previa um cenário pior, com queda de 0,49%, mantendo a previsão de crescimento em 2010. Naquela época, a revista britânica The Economist, o evangelho do capital financeiro internacional, apostava numa recessão com uma queda de 0,5% no PIB, independente de qualquer medida que tomada governo brasileiro contra aquela ameaça. E também indicava uma retomada modesta em 2010, na casa dos 3,2% do PIB. Em junho, a OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) apontava um recuo de 0,8% do PIB brasileiro e um crescimento de apenas 4% em 2010. Não estava sozinha; o Bando Mundial apostava em queda de 1,1% no PIB, com recuperação apenas em 2010. O campeão nesta corretagem negativista foi o banco de investimentos americano Morgan Stanley que chegou ao absurdo de prever uma queda de 4,5% no PIB brasileiro em 2009, que – segundo aquele oráculo novaiorquino – continuaria em 2010, quando o recuo seria de 0,5%!

O Brasil frustrou aquelas apostas. Entre o governo, que previa uma "marolinha", e importantes setores do mercado financeiro e da oposição neoliberal que apostavam em um tsunami, o país ficou no meio. Mais para a onda mansa do que para o vendaval destruidor, com perdas grandes. Um cálculo da Fundação Getúlio Vargas diz que, com a crise, o país deixou de acrescentar à atividade econômica entre 150 a 210 bilhões de reais. Mas ressalva que a coisa podia ter sido pior sem as medidas tomadas pelo governo que, na opinião de seu autor, o economista Régis Bonelli, foram bem sucedidas. Outro estudo, feito por economistas do Itaú Unibanco, mostrou que sem a ação do governo o PIB teria encolhido 3,2% em 2009. As medidas tomadas – transferências sociais como o Bolsa Família, política de recuperação do salário mínimo, empréstimos de bancos do governo para empresas em dificuldades, desoneração tributária, investimentos estatais em obras públicas, queda na taxa de juros, etc – evitaram aquele desastre e permitiram a retomada do crescimento.

Embora o resultado alcançado em 2009 não tenha sido bom, o Brasil chega a 2010 com uma economia que demonstra vigor. O crescimento voltou já no terceiro trimestre, autorizando previsões para o ano que vem que oscilam entre 5 a 6% ao ano. A Fiesp, por exemplo, prevê 6,2%. A agência norte americana Merrill Lynch fala em 5,3%.

Esta dança dos números é reveladora. Em primeiro lugar, elas mal escondem apostas seja no sucesso seja no fracasso do país – principalmente no fracasso, como esperava a oposição neoliberal acreditando que a repetição do mau desempenho em crises mundiais anteriores (como os desastres que o país viveu sob Fernando Henrique Cardoso) ajudaria a aplainar seu caminho para a eleição de outubro de 2010, quando será eleito o sucessor do presidente Lula.

Em segundo lugar, sugere que a bola de cristal dos modernos perscrutadores do futuro merece a mesma fé que o exame das vísceras de aves realizado por adivinhos romanos há mais de dois mil anos: baseiam-se mais em crenças e desejos do que na análise de tendências concretas que podem revelar caminhos diferentes daqueles contidos em suas premissas. Como no caso da previsão feita pela Morgan Stanley: é provável, como mostraram os economistas do Unibanco, que seguindo o mesmo receituário neoliberal usado em crises anteriores teria ocorrido o desastre previsto; como a política econômica brasileira seguiu caminho diverso, a má profecia não teve condições objetivas de se realizar.

Isto nos leva a uma outra reflexão importante: na contra mão dos dogmas neoliberais dos círculos contemporâneos do dinheiro, foi o Estado e não o mercado que garantiu a defesa contra a crise. Por toda a parte: nos EUA, na Europa ou na Ásia. E no Brasil, onde o Estado não recua mais diante de suas responsabilidades perante o país, sua economia e seu povo. E é, por isso, um instrumento fundamental para a defesa da economia nacional.