Lei absurda pode impedir multas contra planos de saúde

A esperteza dos políticos da direita não tem limites para beneficiar o grande capital, mesmo à custa da saúde dos brasileiros.

A última delas foi o “contrabando” introduzido na Medida Provisória 627 pelo relator, o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Isso no momento em que a Agência Nacional de Saúde (ANS) anuncia mais uma punição aos planos de saúde e manda suspender nada menos que 111 deles, de 47 operadoras.

O “contrabando” legislativo torna irrisórias as multas cobradas contra as operadoras, consolidando a verdadeira lei da selva que reina no setor, deixando-as de mãos livre para continuar cometendo as maiores arbitrariedades contra os consumidores – pessoas que, de partida, estão em situação fragilizada ao tentar usar os maus serviços prestados por essas empresas para cuidar de sua própria saúde! É um mercado florescente formado, hoje, por 50,27 milhões de usuários de planos de saúde. E muitas vezes não encontram atendimento apesar do alto custo que pagam pelos serviços oferecidos.

A esperteza praticada por Eduardo Cunha chega a ser banal entre parlamentares da direita. Trata-se de “pegar uma carona” em medida provisória que legisla sobre outro tema e introduzir nela, ocultamente, o objetivo pretendido. Que, se for não percebido, acaba sendo aprovado sem o necessário debate e, de maneira espúria, se transforma numa lei tão boa quando as demais, que passaram pelo crivo do confronto de opiniões. Só que por baixo do pano!

O alvo explícito da MP 627, aprovada no último dia 2 de abril pela Câmara dos Deputados, é a tributação sobre as multinacionais brasileiras no exterior, assunto completamente estranho às operadoras de planos de saúde.

Pois foi nessa MP, cujo tema é de natureza tributária, e que foi considerada complexa pelos parlamentares por incluir mais de uma centena de artigos, que o deputado espertalhão da direita tentou esconder o benefício às operadoras de planos de saúde.

São benefícios milionários, que prejudicam o tesouro nacional, os consumidores e beneficiam apenas a especulação feita por aquelas empresas e seus proprietários contra a saúde de seus clientes.

Pela regra que está em vigor as operadoras estão sujeitas a multas que variam entre R$ 5 mil e R$ 1 milhão por infração que cometerem, e o valor total é multiplicado pelo número de infrações cometidas.

Nada mais justo! Se um motorista comete uma falta de trânsito, paga por ela; se comete duas, paga duas vezes, e assim por diante.

Mas essa regra comezinha pode deixar de ser aplicada quando as operadoras de planos de saúde não cumprirem os contratos e prejudicarem seus clientes. Por aquela regra escandalosa, se uma delas cometer entre 2 e 50 infrações semelhantes, pagará multas referentes a apenas duas! Se cometer mais de 1.000 infrações, pagará apenas por 20 delas! Isto significa que se uma operadora não aceitar pagar por uma cirurgia, sua multa pode ser de R$ 80 mil; se fizer isso 50 vezes, teria que pagar o total de R$ 4 milhões mas, com a esperteza introduzida na MP 627, pagará somente R$ 160 mil!

Além disso, a regra estapafúrdia limita o poder de fiscalização da Agência Nacional de Saúde (ANS) sobre a ação daquelas empresas e reduz as punições que ela pode aplicar.

O absurdo dessa regra é o estímulo à impunidade. Ela significa, diz André Lopes, do Procon de São Paulo, “um franco estímulo à violação das normas que regem os planos. Vai sair mais barato descumprir as normas e dificultará a cobrança por parte dos órgãos de defesa do consumidor”.

A medida provisória, que foi aprovada pelo plenário da Câmara dos Deputados, depende agora de aprovação pelo Senado e, depois, será submetida à avaliação da presidenta da República, Dilma Rousseff, que deverá vetar aquela pretensão descabida.

Além da saúde dos brasileiros e da defesa do consumidor, o procedimento espertalhão do direitista Eduardo Cunha gera outra reflexão. Ela diz respeito à reforma política em exame no Congresso Nacional e no conjunto da sociedade: é preciso mudar as regras para a elaboração de leis. Uma mudança urgente exige clareza no debate legislativo para coibir a produção de leis “ocultas”, como esta pretendida, em prejuízo da população e que só favorecem alguns espertalhões inescrupulosos.