Mais ataques de Bolsonaro aos trabalhadores

No extenso conjunto de ações e omissões da gestão Jair Bolsonaro que prejudicaram especialmente a classe trabalhadora, a busca da precarização nas relações de trabalho parece ser o ponto comum. Daí não surpreender a ninguém a nova denúncia divulgada pela Folha de S.Paulo segundo a qual o governo tem esvaziado a fiscalização trabalhista, a ponto de desviar verbas direcionadas a esse fim.

Segundo o jornal, os recursos, oriundos de infrações trabalhistas, eram destinados a equipar grupos de fiscalização do governo. Porém, o dinheiro tem sido transferido para o FDD (Fundo de Defesa dos Direitos Difusos) e o FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador). Equipamentos centrais na fiscalização, “como caminhonetes destinadas à atuação de auditores-fiscais do trabalho”, também são realocadas, para a alegria de empregadores que infringem a legislação cada vez com menos risco.

“Auditores, integrantes do MPT (Ministério Público do Trabalho) e a Justiça do Trabalho apontam um retrocesso na imposição feita pelo governo Bolsonaro, capitaneada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência. A medida pode paralisar fiscalizações de trabalho escravo, acidentes de trabalho e trabalho infantil”, registra a Folha.

Michel Temer, antecessor de Bolsonaro no Planalto, cuidou de promover a maior ofensiva contra a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), por meio da nefasta reforma trabalhista de 2017. Mas o atual presidente não mediu esforços para construir um farto passivo de retrocessos nessa área, em fina sintonia com o ideário do empresariado brasileiro.

Logo em seu primeiro decreto à frente da Presidência da República, Bolsonaro extinguiu, entre outras pastas, o Ministério do Trabalho – que, como a CLT, era um legado dos mais expressivos do governo Getúlio Vargas. Criado em 1930, o ministério foi peça-chave do empenho varguista em mediar as duras relações entre capital e trabalho, articulando uma regulamentação de alcance nacional.

Ainda no primeiro ano de governo, Bolsonaro conseguiu viabilizar a mais conservadora das reformas da Previdência já implantadas no Brasil. Foram alterados, sempre em desfavor dos trabalhadores, o tempo de contribuição, a idade mínima e as chamadas regras de transição. Assim, desde novembro de 2019, prevalece uma legislação previdenciária que obriga o trabalhador a permanecer por mais anos na ativa para, ao se aposentar, ter direito a menos rendimentos. Bolsonaro condenou boa parte dos brasileiros a não se aposentarem jamais.

As flexibilizações nas leis trabalhistas e as retiradas de direitos não cessaram. Nem por isso Bolsonaro cumpriu sua promessa eleitoral – por princípio, fraudulenta – de gerar empregos à custa da redução de direitos. Ao contrário: o governo acaba até de revisar o número de empregos formais gerados no País em 2020: em janeiro, o Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) falava em 142.690 novos postos de trabalho criados ao longo do ano passado com carteira assinada. Agora, sabe-se que foram apenas 75.883 empregos criados – 46,82% a menos.

Mesmo com a aposta bolsonarista na precarização, o mercado de trabalho regrediu. Quando o presidente tomou posse, o desemprego no País atingia 12,2 milhões de brasileiros – uma taxa de 11,6%, conforme o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Já no trimestre encerrado em agosto passado, após 32 meses de governo Bolsonaro, o índice de desocupação era de 13,2%, totalizando 13,7 milhões trabalhadores desempregados. É, proporcionalmente, mais que o dobro da taxa média de desemprego dos países que integram a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), estimada em 5,8% no mês de setembro.

Em 2021, mesmo com o boicote do governo à vacinação anti-Covid-19 – que já imunizou totalmente 120,5 milhões de brasileiros, o equivalente a apenas 56,5% da população –, o mercado de trabalho parece voltar, aos poucos, a contratar. O governo afirma que, segundo o Caged, já foram criados 2,5 milhões de empregos formais no ano (até setembro). Porém, o bolsonarismo omite que 83% dessas vagas são de baixa remuneração (de um a dois salários mínimos), num cenário de inflação elevada e carestia.

Para piorar, de acordo com estudo da consultoria IDados divulgado pelo Estadão, explodiu igualmente o número de trabalhadores sem carteira assinada ou qualquer vínculo formal, com renda de até um salário mínimo. Entre o segundo trimestre de 2019 e o segundo de 2021, mais de 2 milhões de brasileiros entraram nessa lista e passaram a viver de “bicos”. Com isso, em um ano sob a pandemia e o bolsonarismo, o rendimento médio real do conjunto dos trabalhadores despencou 10,2%.

Na opinião de especialistas como Fernando de Holanda Barbosa Filho, pesquisador de Economia Aplicada do Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas), o Brasil vai demorar anos para ter uma taxa de desocupação abaixo de dois dígitos. “A tendência é que a taxa caia nos próximos meses. Mas essa queda acontecerá em ritmo lento”, avalia o economista. “Só em 2025, com alguma sorte, vamos ter taxa de desemprego em um dígito. Até lá, o crescimento vai ter que acelerar bastante.”

Seja qual for o tempo que resta de Bolsonaro no poder, o fato é que seu governo entregará um ambiente de crise no trabalho e desemprego em alta. Não há perspectiva nenhuma de retomada do crescimento, muito menos de geração acelerada de mais e melhores empregos. O problema do País, hoje, é mais político do que econômico. Tirar Bolsonaro da Presidência da República é condição sine qua non para salvar o Brasil.