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Manuela Margarido: Roça

*

A noite sangra
no mato,
ferida por uma aguda lança
de cólera.
A madrugada sangra
de outro modo:
é o sino da alvorada
que desperta o terreiro.
É o feito que começa
a destinar as tarefas
para mais um dia de trabalho.


 


A manhã sangra ainda:
salsas a bananeira
com um machim de prata;


 


capinas o mato
com um machim de raiva;
abres o coco
com um machim de esperança;
cortas o cacho de andim
com um machim de certeza.


 


E à tarde regressas
à sanzala;
a noite esculpe
os seus lábios frios
na tua pele
E sonhas na distância
uma vida mais livre,
que o teu gesto
há-de realizar.


 


Poesia Africana de Língua Portuguesa (Antologia)
Maria Alexandre Dáskalos, Livia Apa, Arlindo Barbeitos
Lacerda Editores – edição 2003