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Ricardo Albuquerque: A prata na rede

*

(memória de um filho de pescador)


 


 


Torço a língua de um tempo
limitado pela manhã
sou apenas o ritmo de um repente
seco feito o curso de uma jangada
sem vento


 


 


sem nada
torço a vida numa palavra
sorte
repetida que ouvi pequeno
pescada, prata que não tive
em nenhuma noite
não me lembro
de nenhuma rede pesada.


 


 


Qual figura dar ao medo
se o nervoso irrompe todo por dentro?
E se todo medo tem metro só na quietude
como mantê-lo quieto entre os dentes?


 


 


O maior amor tem
no fundo um bem:
um dó de não ter
de vez por inteiro
o tempo
que ao lume mantém
sempre aceso.
Por quem?


 


 


Versos Ilegais – Ricardo Albuquerque
Águas Brasileiras Editora – edição 2001