Artigo: 16 anos sem Glênio Sá


Vinte e sete de julho de 1990. A Cidade do Sol acordou com seu brilho ofuscado. Fora surpreendida, na tarde de 26 de julho, por uma trágica e mal explicada morte. Um opala que, com seus ocupantes alcoolizados, vinha em alta velocidade, invade a pis

Para os familiares e milhares de comunistas, fica a certeza de que Glênio teria sido apenas protagonista de um espetáculo que muitos pensavam ter terminado em cinco de setembro de 1974, mas que 24 anos depois os arquivos sob custódia da Agência Brasileira de Inteligência (ABIn) mostraram que não. Os soldados que, naquela data, escoltavam Glênio e anunciavam sua liberdade depois de dois anos de prisão e tortura, eram apenas figurantes capazes de dar a um instante de felicidade a forma de farsa. No ato final, o diretor da peça resolveu fazer com que seus atores representassem o cinismo e a hipocrisia no trato com seu personagem principal. A perseguição a Glênio duraria até o ano de sua morte, 1990…



Homem de coragem e invejável confiança no futuro socialista do mundo, Glênio, ao mesmo tempo em que deixou um grande vazio entre os quadros do movimento comunista, deixa-nos um exemplo de vida e de luta. Aqui não cabe colocar em julgamento as suas posições políticas e ideológicas. Mas é um momento oportuno para lembrarmos de um idealista, que tocando a vida como se fosse uma missão política, acreditou ser possível a realização de um mundo melhor, mais justo e humano, com mais igualdade para todos. Um homem que não se conformou em ser meramente expectador dos fatos, mas produtor dos acontecimentos, contribuindo para o alcance da liberdade.



Renunciando à cômoda posição de indiferença ao clima de terror e violência que fora instilado no país nas décadas de 60 e 70, Glênio atuou na linha de frente da resistência à Ditadura Militar, construindo uma trajetória de mais de 24 anos de luta. A caminhada começa a ser desenhada nos movimentos estudantis de 1966, ganha forma com a Guerrilha do Araguaia (movimento armado de contestação política ao Regime Militar que ajudou na organização e conscientização os camponeses do Sul do Pará), e é concretizada na luta pela reestruturação e legalização do Partido Comunista do Brasil no seu Estado, o Rio Grande do Norte.



Sua lembrança me traz a mente um velho lema revolucionário que, referindo-se àqueles que morreram lutando por uma sociedade mais justa, diz assim: “não enterraram cadáveres, enterraram sementes”. Meu pai é uma dessas sementes, seu sacrifício não foi em vão, tem frutificado na mais esplêndidas das colheitas, a da consciência de milhões de brasileiros sobre a necessidade de somar-se a essa luta.



Jana Sá, Jornalista.