Lula sobe em pesquisa com votos da esquerda, dizem analistas
''A conversa das privatizações pegou. Alckmin caiu na armadilha'', afirma o professor Roberto Romano, da Unicamp. O cientista político Alberto Carlos Almeida, por sua vez, afirma que ''nem tudo é conjuntura. Em seus valores básicos, o eleitor médi
Publicado 18/10/2006 19:49
Em apenas sete dias, a vantagem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobre seu opositor, Geraldo Alckmin (PSDB), subiu oito pontos nas pesquisas. Nesse período, o petista lançou o debate da privatização das estatais, atraindo o voto da esquerda e colocando Alckmin na desagradável posição defensiva, avaliam analistas e cientistas políticos.
Já o tucano permaneceu com o discurso da ética, sem se dar conta que Lula se descola do escândalo do dossiê, repetindo o ''efeito teflon'' de outras denúncias.
A tentativa de colar em Alckmin a pecha de privatista e de que irá interromper investimentos na área social ajudou a atrair os eleitores de Heloísa Helena (PSOL) e Cristovam Buarque (PDT), candidatos derrotados no primeiro turno e ambos egressos do PT. Somados, os dois tiveram cerca de 9,5 milhões de votos.
''A conversa das privatizações pegou. Alckmin caiu na armadilha'', afirmou Roberto Romano, professor emérito de política e ética da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Para Romano, que nunca escondeu sua simpatia pelas idéias do tucanato, , ''foi um golpe baixo (de Lula) que não permite responder rapidamente, esclarecendo razões e motivos. Lula calculou perfeitamente: é verdade que houve privatização no governo Fernando Henrique Cardoso e no governo Alckmin. Agora, explicar as causas e razões disso exige um longo raciocínio''.
Eleitores de esquerda, que votaram em Heloísa Helena no primeiro turno, estavam ''ansiosos e desejosos por um motivo para votar em Lula'' e agora já o tem.
''A discussão das privatizações mexeu no subconsciente da esquerda'', afirmou Romano, enquanto Alckmin é identificado como candidato de direita.
O rótulo de privatista coloca Alckmin em uma situação difícil, mas, para o cientista político Fábio Wanderley Reis, o que atrai o eleitor de esquerda egresso de Heloísa e Cristovam é a identidade de Lula com a questão social.
''Aos olhos do eleitor de esquerda, pode ter havido desgaste de Lula na administração, na continuidade do liberalismo econômico, mas ele tem a imagem de popular, de quem melhora as condições de vida da população mais pobre'', afirmou o professor da UFMG.
No recém-lançado livro ''Por que Lula?'', que analisa as razões para a vitória do petista em 2002, o autor, o cientista político Alberto Carlos Almeida, afirma que ''nem tudo é conjuntura. Em seus valores básicos, o eleitor médio é estatizante''.
Pesquisa comandada por Almeida naquele ano, mostra que, para mais da metade dos entrevistados, o governo deveria administrar 12 de 14 áreas da economia, entre as quais bancos e energia elétrica. Para 73%, o governo deveria controlar os preços de todos os produtos e 76% acreditavam que o governo deveria socorrer as empresas em dificuldades.
''A resistência ao mercado no Brasil tem sido muito grande. Trata-se de uma organização econômica impessoal dentro de uma sociedade personalista'', afirma Almeida no livro.
Chico de Oliveira: ''estou disposto a correr o risco''
Numa entrevista ao site da agência Carta Maior, Chico de Oliveira,, fundador do PSOL e um dos mais respeitados sociólogos brasileiros, explicou porque, depois de votar na senadora Heloísa Helena, agora vai de Lula.
''Há duas coisas em disputa. Há uma corrida feroz em direção aos fundos que o Estado ainda controla, como os recursos do BNDES e do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador). O BNDES é o maior banco de investimentos do mundo e deixa bem para trás o Banco Mundial. O Estado orienta os fundos de pensão. E há disputa pelos benefícios gerados a partir da dívida pública, que beneficiam cerca de 20 mil famílias, segundo pesquisa do professor Márcio Pochmann, da Unicamp. Essas 20 mil famílias lucram com a dívida pública, mas não a gerem. Que gere é o Estado. A diferença maior entre as orientações de Lula e de Alckmin, em termos amplos, é que o segundo promoveria uma privatização acelerada do que resta de ativos em mãos do estado. Lembremo-nos que, segundo os levantamentos de Aloysio Biondi, em dez anos, entre os governos Collor e FHC, privatizou-se cerca de 15% do PIB'', disse Oliveira..
Segundo ele, a reeleição é uma nova eleição. ''Os espaços que tínhamos em 2002, de outra forma, voltam a se apresentar, como a questão das privatizações. Esse era um tema proibido durante o governo Lula e ainda mais na era de FHC. Os que dissentiram foram marginalizados. Por que esse tema volta agora a ser central? Por que se abre uma nova disputa. Por isso, eu considero a possibilidade de se votar em Lula. Várias forças que atuaram dentro do PT voltam a ter chance de disputar esse governo. Estou disposto a voltar a correr esse risco, embora o governo não me agrade, seja capitalista e poderia ter avançado muito mais''.
Mauro Paulino: eleição ao alcance da mão
Para o diretor do Datafolha, Mauro Paulino, a evolução de Lula equivale a ter conquistado mais do que todo o eleitorado que votou em Heloísa Helena (PSOL) e Cristovam Buarque (PDT) no primeiro turno. Juntos, os dois tiveram 9,49% dos votos válidos.
A pesquisa divulgada na terça-feira mostra também que Lula voltou ao patamar anterior ao aparecimento do dossiê contra os tucanos, divulgado em 15 de setembro, duas semanas antes da realização do primeiro turno. Para Paulino, a influência do escândalo, que praticamente levou Alckmin ao segundo turno, já foi diluída.
''A pesquisa não tem a capacidade de medir os motivos que geraram o crescimento de Lula. Pessoalmente acredito que Lula está voltando ao patamar alcançado 15 dias antes do episódio do dossiê'', afirmou.
''A exemplo do que aconteceu no primeiro turno, com praticamente o mesmo número de dias pela frente, novamente Lula tem a eleição nas mãos. Só fatos muito contundentes o farão perder'', afirma Paulino.
Crescimento no Sudeste
De acordo com o levantamento do Datafolha, o candidato à reeleição ganhou vários pontos em praticamente todos os segmentos do eleitorado, seja na estratificação por renda, sexo, idade ou escolaridade. Mas o que mais contribuiu para abrir a atual dianteira foi seu desempenho no Sudeste, que concentra 44% dos eleitores do Brasil e, em menor escala, no Sul, com 15% dos eleitores.
A pesquisa mostra que Lula subiu sete pontos percentuais e atingiu 52% nos estados dessa região, enquanto o candidato do PSDB caiu quatro pontos: de 45% para 41%. Na pesquisa anterior, divulgada em 11 de outubro, os dois presidenciáveis tinham 45%.
No primeiro turno, Alckmin havia liderado a apuração no Sudeste, com 45,22% dos votos válidos, enquanto Lula alcançou 43,28%. O tucano também tinha sido o mais votado no primeiro turno nas regiões Sul e Centro-Oeste.
Nos estados sulistas, segundo o Datafolha, o tucano continua líder nas intenções de voto, mas a vantagem para o petista diminuiu: de 16% para 7%. Alckmin caiu de 54% para 50%, enquanto Lula subiu de 38% para 43% nessa região.
No Nordeste, onde o presidente tem seu melhor desempenho, o Datafolha mostra que o quadro eleitoral entre os dois candidatos continua inalterado. Lula manteve os mesmos 71% da última pesquisa e Alckmin permanece com 24%.
Nas regiões Centro-Oeste e Norte, o instituto aponta que Lula cresceu seis pontos percentuais, passando de 50% para 56%, enquanto o adversário do PSDB oscilou negativamente um ponto, de 41% para 40%.
Escolaridade
O Datafolha mostra que Lula subiu seis pontos entre os eleitores que têm ensino fundamental, de 57% para 63%. Entre os que têm ensino médio, ele passou de 49% para 53%. Já entre os que têm curso superior, subiu de 37% para 41%.
Já o tucano oscilou negativamente dois pontos entre os eleitores com ensino fundamental (de 34% para 32%), oscilou dois pontos para baixo entre os que têm ensino médio (de 43% para 41%) e oscilou um ponto entre os que têm curso superior (53% para 52%).
Idade
O maior crescimento de Lula foi entre os eleitores na faixa de idade dos 16 aos 24 anos, em que passou de 47% para 55%. Na faixa dos 25 aos 34 anos, subiu de 54% para 58%; na dos 35 aos 44 anos, de 51% para 57%; na dos 45 aos 59 anos, de 52% para 56%; e na dos 60 ou mais anos, de 54% para 57%.
Já Alckmin caiu cinco pontos na faixa de idade dos 16 aos 24 anos (46% para 41%), manteve o mesmo percentual na dos 25 aos 34 anos (36%) e na dos 45 aos 59 anos (38%), caiu quatro pontos na dos 35 aos 44 anos (41% para 37%) e oscilou dois pontos para baixo na dos 60 ou mais anos (38% para 36%).
Renda familiar
Lula subiu três pontos entre os eleitores com renda familiar de até 2 salários mínimos (59% para 62%), oito pontos entre os que têm renda de 2 a 5 salários (47% para 55%), quatro pontos entre os que têm renda de 5 a 10 salários (45% para 49%) e sete pontos entre os que ganham mais de 10 salários (31% para 38%).
Alckmin manteve o mesmo percentual (32%) entre os eleitores com renda familiar de até 2 salários mínimos, caiu quatro pontos entre os que têm renda de 2 a 5 salários (45% para 41%), caiu três pontos entre os que têm renda de 5 a 10 salários (48% para 45%) e perdeu seis pontos entre os que ganham mais de 10 salários (62% para 56%).
Pesquisa consolidada
Lula subiu de 51% para 57% em relação ao último levantamento. Alckmin, que tinha 40%, tem agora 38%, oscilação dentro da margem de erro, que é de dois pontos percentuais. O Datafolha ouviu 7.133 eleitores, entre segunda (16) e terça-feira (17), em 348 municípios do País.
Segundo o Datafolha, o petista tem hoje o mesmo patamar que o levou à vitória na eleição de 2002 contra o também tucano José Serra. Na época, Lula foi eleito com 61,3% dos votos válidos, enquanto Serra teve 38,7%.
Da redação, com informações do G1