O Picolé de Chuchu está derretendo – Por Jorge Gregory

Confira mais esta coluna do Jornalista e membro da direção regional do PCdoB Paraná, Jorge Gregory.

  Devo confessar que termino esta semana profundamente frustrado. Após a raivosa e articulada tentativa da grande mídia, no final da semana passada, de tentar incutir na mente dos eleitores que o PT estava fazendo “terrorismo” ao rotular Alckmin de privatista e antipolíticas sociais, esperava no mínimo uma linha crítica às atitudes antidemocráticas tucanas desta semana.


 


            Geraldo Alckmin declara, ou ameaça descaradamente, a respeito da já quase inevitável derrota eleitoral, que “um eventual segundo governo Lula termina antes de começar”. Esta, sim, deveria ser rotulada de terrorismo, pois por si só já se constitui em clara ameaça de golpe de estado. Tal declaração, porém, não ficou só nas palavras. Os presidentes do PSDB e do PFL, os senadores Tasso Jereissati e Jorge Bornhausen, na falta de uma TFP para promover uma nova “Marcha pela Tradição, Família e Propriedade”, procuraram a OAB buscando envolver a entidade nesta tentativa.


 


            Convenhamos, depois do estardalhaço da imprensa sobre “o terrorismo petista” no final de semana passada, o que se esperava era pelo menos uma manchete afirmando: “Tucanos querem ganhar eleição no tapetão”. Ainda estou procurando esta manchete para continuar acreditando que nossa imprensa é imparcial.


 


            Porém, os meios de comunicação não conseguiram deixar de nos propiciar dois momentos magistrais neste segundo turno. O primeiro foi o debate da SBT e o segundo, a entrevista de uma hora com o Alckmin na CBN, conduzidas por Heródoto Barbero e Carlos Alberto Sadenberg.


 


            Para grande parte das pessoas com as quais conversei o debate foi morno, chocho. Esta também foi a minha impressão. Nossa expectativa sempre é de que um dos candidatos empolgue, encurrale o outro, massacre. Ou pelo menos que haja muita polêmica. Nada disso ocorreu. O único resultado evidente foi o de que Alckmin derrotou a si próprio. A fragilidade, ou melhor, a completa falta de conteúdo do candidato tucano ficou ainda mais evidente na entrevista realizada pela CBN.


 


            Alckmin mais parece um papagaio que só repete três slogans: “O governo gasta muito e gasta mal”, “É preciso cortar gastos” e “É preciso fazer um choque de gestão”. Pressionado por Sadenberg, não conseguia explicar o que era o tal choque de gestão e muito menos apontar onde cortaria gastos.


 


            Primeiro, nada contra choques de gestão, pois há que se buscar permanentemente o aperfeiçoamento da máquina de Estado no sentido de melhorar a qualidade dos gastos. Tal melhoria de qualidade se faz necessária até porque o orçamento é pequeno diante dos desafios da educação, da saúde e de infra-estrutura para um salto de desenvolvimento, entre outros. Choque de gestão, no entanto, foi o que fez o governo Lula ao ampliar e unificar num único programa todos os vales e bolsas destinados ao combate à miséria, visto que pouco resultado apresentavam em função da dispersão e pulverização de recursos. A amplitude e a eficiência do Bolsa Família nem mesmo o candidato tucano consegue questionar.


 


            Agora, o que Sadenberg conseguiu demonstrar, apertando o Picolé de Chuchu, é que não mexendo na Previdência e mantendo os programas que propõe manter ou desenvolver, aquilo que propõe como corte de gastos é pura perfumaria.


 


            Mas afinal, qual é a essência do discurso de Alckmin? O que justifica a sua queda livre nesta semana, com as pesquisas já apontando que teria menos votos que no primeiro turno?


 


            Primeiro, do ponto de vista conceitual, o que prega Alckmin é mais atrasado do que aquilo que Fernando Henrique Cardoso aplicou. Para se ter uma idéia, a pregação de Afif Domingues, em 1989, que foi o candidato que à época mais incorporou de forma articulada os conceitos do neoliberalismo, mesmo do ponto de vista neoliberal já era mais atualizado do que o discurso que Alckmin apresenta hoje.


 


            Sob esta ótica, se a aplicação do receituário neoliberal, por FHC, levou o país à beira da insolvência com o esgotamento das reservas, endividamento astronômico, juros nas estratosferas e dólar nas alturas, a crise pela qual passou a Argentina será insignificante se comparada com o que nos espera sob a aplicação dos conceitos de Alckmin.


 


            Penso que a afirmação de Lula, de que nestes quatro anos de seu governo se construiu uma base – mínima, na minha opinião -, para uma fase de desenvolvimento, está absolutamente correta. Não consegui distinguir claramente, até o momento, qual é o projeto de desenvolvimento que Lula propõe. O que vai ficando claro, no entanto, para boa parte da classe média e do empresariado que no primeiro turno votou em Alckmin, quando este estava encoberto sob o manto da ética e da moralidade, é que sua eleição é o prenúncio do caos. O que vai ficando nítido, por exemplo, para os 32 reitores de universidades federais que publicamente assinaram o manifesto de apoio a Lula, ainda que reclamem que o atual governo vem recuperando muito lentamente o sucateamento promovido pela era FHC, é que é preferível mil vezes esta recuperação lenta do que a bancarrota total destas instituições sob um governo Alckmin.


 


            Mas a questão não é só conceitual. Quando espremido, como fez Sadenberg, Alckmin se mostra um indivíduo que não consegue articular as próprias idéias. O discurso se torna repetitivo, como se fosse algo decorado.


 


Para quem vivenciou a década de oitenta e teve algum contato com o meio empresarial da época, deve lembrar dos consultores que eram pagos a peso de ouro pelas empresas para falarem da grande moda do momento, que era a tal “reengenharia organizacional para enfrentar a competitividade de um mundo globalizado”. Tais palestrantes se constituíam mais em animadores de platéias de empresários, diretores de empresas e executivos, do que consultores propriamente. Intercalando chavões decorados de algum best seller do pensamento neoliberal e piadinhas – a maioria sem muita graça -, divertiam platéias deste seleto grupo em cursos de motivação em finais de semana. Alguns conseguiam até mesmo convencer seu público a caminhar descalço sobre braseiros como forma de aprender a enfrentar desafios.


 


Conhecendo, hoje, melhor o discurso de Alckmin, imagino que ele deva ter feito um destes cursos motivacionais na década de 80, destes que se caminhava sobre o braseiro. Provavelmente tenha se entusiasmado com o curso, pois queimar os pés nas brasas imagino que deva ser uma gratificante penitência para quem é entusiasta da Opus Dei e, desta forma, deve ter decorado o teor do curso.


 


O grande problema do candidato tucano é que ninguém da sua assessoria lembrou de alertá-lo de que “reengenharia organizacional” não é mais o tema da moda e que ele não está dando uma palestra de motivação para empresários e executivos. Aliás, desconfio que boa parte dos empresários e executivos já começam a achar que nem para animador de cursos de motivação o Alckmin serve, pois além do conteúdo ultrapassado nem piada o sujeito sabe contar.


 


Em resumo, o eleitorado que votou no tucano no primeiro turno começa a entender porque o indivíduo leva a alcunha de Picolé de Chuchu e começa a desconfiar, além de tudo, que o chuchu é demasiadamente aguado. Só não derreteu totalmente, até agora, porque grandes veículos como a Veja persistem em tentar convencer eleitores de que o tal picolé é saboroso.


 


Jorge Gregory – Jornalista, professor universitário, membro da direção regional do PCdoB Paraná, atualmente ocupando o cargo de Coordenador Geral de Orientação e Controle da Educação Superior no MEC.