Pedro de Oliveira: ''A internet vai acabar com os jornais?''

O editor de um dos jornais mais importantes dos EUA, Arthur Sulzberger do The New York Times, declarou na semana passada (8/02) em entrevista ao jornal israelense Haaretz que não tem certeza se a edição diária do seu jornal continuará sendo impressa da

O alerta publicado pela Economist


 


Sulzberger, constata que “a Internet é um lugar maravilhoso e nesse terreno estamos à frente de todos”, contente com o aumento de leitores da edição online do New York Times que passou a registrar 1,5 milhão de acessos por dia, enquanto o número de assinantes da edição impressa é atualmente de 1,1 milhão. A empresa deverá decidir se deve ou não manter sua edição impressa nos próximos anos. Estes dados e esta perspectiva deram força à reportagem de capa publicada pela revista semanal inglesa The Economist em setembro de 2006, com a manchete “Quem matou o jornal diário?”, onde procura teorizar sobre o futuro dos jornais impressos. 


 


Na reportagem de capa da revista, que pode ser considerada o órgão central do capital financeiro internacional, ao lado do The Wall Street Journal e do Financial Times, os editores da Economist defendem que hoje em dia, nos países chamados desenvolvidos, o jornal é uma espécie ameaçada, ou em extinção. O “negócio” de vender palavras aos leitores e vender leitores aos anunciantes, que é quem sustenta os jornais impressos no capitalismo, está decaindo.


 


O escritor Arthur Miller, segundo a revista, havia dito em 1961, que:  “—Um bom jornal, suponho, é a nação falando consigo mesma”. Um década depois, dois repórteres do jornal americano The Washington Post derrubaram o Presidente Richard Nixon, numa série de artigos sobre o caso Watergate. Em última instância, os grandes jornais podem se tornar responsáveis pela estabilidade de governos e o desenvolvimento de grandes empresas, asseguram os editores da revista, indicando que um jornal respeitado estabelece a pauta para o conjunto da imprensa e para o resto das mídias.


 


De todas as “antigas” mídias, os jornais são os que têm mais a perder em relação à Internet. O levantamento feito pela revista inglesa constata que a circulação dos jornais têm caído por décadas na América do Norte, englobando os EUA e o Canadá, na Europa Ocidental, na América Latina, na Austrália e na Nova Zelândia (estão fora desta pesquisa grandes mercados consumidores de jornais, como a China, o Japão, a Índia entre outros). Jovens britânicos, entre 15 e 24 anos, afirmam que após o início do uso da Internet, dedicam 30% a menos de tempo lendo jornais impressos. Nos últimos anos a Internet tem acelerado este declínio. Os anunciantes seguem a mesma tendência dos leitores, pois a Internet tem condições de “provar” aos anunciantes de forma cabal que seus leitores estão efetivamente lendo os anúncios publicados na Web pelo registro de acessos.


 


Na Suíça e na Noruega, os jornais perderam 50% dos classificados para a Internet.  Entre 1990 e 2004, segundo a Associação Americana de Jornais (NAA), o número de pessoas empregadas pela indústria de jornais na América do Norte caiu 18%. A Economist considera que nas próximas décadas, metade dos jornalões dos países mais ricos estarão fechando. Os empregos já estão rareando. Os jornais ainda não começaram a fechar suas portas, mas isto será apenas uma questão de tempo, como diz o editor do New York Times. Um livro sobre o assunto foi publicado com grande repercussão nos meios financeiros: “The Vanishing Newspaper” (ou “O desaparecimento dos Jornais”), onde Philip Meyer calcula que em 2043 será o momento em que os jornais desaparecerão na América. Em 2005, um grupo de proprietários da rede americana de jornais Knight Ridder, colocou um fim em 114 anos de história de vários diários americanos. O próprio New York Times vem sofrendo quedas constantes no valor de suas ações na Bolsa de Valores de Nova York, nos últimos 4 anos.


 


A reação dos jornais ao “ataque” da Internet


 


A Economist analisa que apesar de ter ignorado esta realidade durante anos a fio, os jornais estão se movimentando, procurando fazer algo para reagir. Com o objetivo de se refundar, muitos destes jornais estão revendo suas pautas com vistas a atrair jovens leitores, ampliando seus espaços para seções de lazer e comportamento, reduzindo o investimento em jornalismo sobre política, economia e notícias internacionais. Este tipo de reação já desperta a preocupação de intelectuais e de faculdades de jornalismo nos EUA diante da decadência do chamado “quarto poder”. Isso tudo poderia permitir uma impunidade maior do governo e das grandes empresas.


 


De qualquer forma, podemos dizer com base na história do desenvolvimento dos meios de comunicação que a queda do poder dos jornais não será tão perigosa quanto faz crer certo tipo de análise. A democracia de tipo capitalista sobreviveu à onda poderosa primeiramente do rádio, depois da televisão – e que efetivamente provocou queda na circulação de jornais desde a década de cinqüenta. E os jornais certamente sobreviverão ao declínio que está por vir como instrumentos de dominação de classe e ao contrário como instrumentos de conscientização dos oprimidos diante das classes dominantes. Uma das fontes importantes de metamorfose dos órgãos de imprensa escrita têm sido o investimento em jornalismo investigativo, que freqüentemente beneficiam os leitores.


 


A utilidade da imprensa vai muito além de ser um instrumento de investigação de abusos eventualmente cometidos por governos e grandes empresas, conclui a reportagem de capa da Economist. Serve especialmente de controladora das ações de governo, sempre a partir de um posto de vista de classe, colocando-as nos tribunais da opinião pública. A internet ampliou este tribunal, oferecendo instrumentos poderosos de controle público. Os portais de informações políticas – como o Vermelho que atualmente é o portal “.org” sobre política, economia e cultura mais acessado no Brasil – é um bom exemplo desta possibilidade. Além disso, portais como o Google News colocam à disposição dos internautas fontes de pesquisa de todo o mundo. Outros exemplos interessantes nos podem dar a dimensão do processo de globalização desta mídia: a página na Internet do jornal The Gardian, publicado na Inglaterra, tem metade de seus acessos a partir dos EUA. Uma grande onda do que poderíamos chamar de “jornalismo cidadão” e blogueiros também pressionam entidades governamentais e representantes no parlamento a prestarem contas de seus atos.


 


Um jornalismo vibrante, com reportagens que possam transformar os leitores em verdadeiras “testemunhas da história”, como propunha o pensador grego Heródoto em suas lições de reportagem recuperados pelo jornalista Kapuscinski (ver texto publicado no Vermelho) devem enfrentar o desafio de organizar reportagens mais aprofundadas, em oposição a meros comentários analíticos. A maioria dos Blogs operam a partir das cadeiras de seus protagonistas e não nas trincheiras onde os acontecimentos efetivamente se dão. Mas ainda estamos nos primórdios e novos modelos de jornalismo online florescerão, com a queda do jornalismo impresso.


 


*Pedro de Oliveira é jornalista, membro do Comitê Central do PCdoB