Carnaval: Olinda ganha dinheiro privado sem perder democracia

Primeira capital brasileira da Cultura, Olinda fixa-se no cenário carnavalesco como a mais emergente festa popular do país. Políticas públicas simples e a busca de apoio da iniciativa privada não descaracterizaram a Folia do Momo mais participativa e d

O Carnaval de Olinda, assim como o de Recife e de outras cidades pernambucanas, tem origem em uma antiga festa pagã européia, conhecida como Entrudo. E já no início do século 20 o gosto popular pela Folia de Momo nasceu com a fundação de diversas agremiações, algumas que permanecem até hoje. Segundo o jornalista e carnavalesco, José Ataíde, foi em 1977 que o Carnaval de Olinda assumiu este aspecto eminentemente popular que o caracteriza hoje. Neste ano, foram abolidos da folia olindense a comissão julgadora, a passarela e o palanque das autoridades.



Festa que cresce



Hoje o Carnaval de Olinda é, sem dúvidas, a maior e mais autêntica festa popular do Brasil. É a única forma de reunir toda a diversidade da região nas ruas, sem que o folião precise ter dinheiro para brincar ou que existam camarotes que privilegiem os mais afortunados do dinheiro. O Carnaval de Olinda, em tempos de mercantilização e espetacularização das culturas populares, é festa popular e participativa.



E o carnaval cresce. Em 2004, a prefeita Luciana Santos (PCdoB) iniciou um trabalho de fortalecimento das agremiações no sentido de melhor organizar os festejos. Medidas simples e a busca do setor privado foram fundamentais para que agremiações que há três anos recebiam apenas R$ 750 da prefeitura para organizar a festa hoje movimentam mais de R$ 30 mil.



A principal e simples medida que a administração pública adotou, além da construção de um amplo plano de comunicação e organização da folia, foi a proibição da utilização de qualquer tipo de som eletrônico nos espaços públicos durante os dias de festa. “Aglomera muita gente nas ladeiras e o objetivo é que a diversidade do frevo, dos maracatus entre outros fluísse naturalmente”, justifica a prefeita.



A medida foi tomada após a realização de uma pesquisa que identificou que a grande maioria dos visitantes de Olinda durante o carnaval eram estudantes universitários. “Muitos ligavam música alta em frente às casas. Enquanto passava um grupo de caboclinhos, com seus instrumentos acústicos, estava tocando em um carro o Bonde do Tigrão no último volume. Isso descaracterizava toda a festa. Assim, encontramos um meio simples de respeitar e incentivar as tradições populares”, pontua Luciana.



Onde se brinca e onde se gasta



A nova lei do Carnaval conseguiu integrar a valorização da identidade diversificada de Pernambuco com um plano de busca de recursos de patrocínios com o setor privado que se tornou fundamental na manutenção das agremiações que constroem o carnaval. Um exemplo simples, como aponta a pesquisa realizada pela Cultura em Ação, mostra que o orçamento das agremiações cresceram em média dez vezes em apenas três anos.



“Olinda é uma cidade com muitos problemas sociais, não temos indústrias, e a nossa renda é pífia. Quem brinca o nosso Carnaval não gasta dinheiro aqui, fica hospedado em Recife, usa o táxi de Recife, mas utiliza os nossos serviços públicos. Por isso, o patrocínio da iniciativa privada também ajuda no orçamento do município, para instalarmos estrutura como sanitários, policiamento e prontos socorros”, explica a prefeita.



Luciana Santos entende que não há como acontecer algum tipo de descaracterização com toda essa influência econômica de mercado no carnaval olindense devido à cultura da festa pernambucana como uma festa democrática. A organização do Carnaval de Olinda parte exclusivamente da iniciativa popular, sem produtores intermediários. Ao estado, segundo a prefeita, cabe apenas incentivar e conceder espaço e estrutura para que a festa aconteça do jeito que o povo quer que ela aconteça.



Folia Organizada



Edgard Steffen Júnior, da Cultura em Ação, explica que o contato para a realização dos projetos em conjunto com a prefeitura e as agremiações nasceu através de um projeto com o Sebrae-NE. Depois disso, a prefeita pediu à empresa ajuda, e em conjunto com os movimentos populares foi traçado um novo plano de organização e divulgação da festa.



“Tivemos idéias de criar novos espaços. As brincadeiras nas ladeiras são lindas, mas acabam até descaracterizando algumas danças e tradições que exigem mais espaços, como o caboclinho, que precisa se formar em roda. Assim nasceu o Passódromo, que concentra os principais festejos no início da cidade, antes de seguirem a folia pelas ruas para a cidade alta. Assim, conseguimos tornar o Carnaval de Olinda mais atrativo para buscar patrocinadores e acabar com a imagem ‘de bagunça’ que o festejo tinha”, conta Steffen.



Sobre as dificuldades em disputar patrocínio, Steffen afirma que Recife é o principal concorrente, devido à proximidade e à grandeza da festa (só neste ano, a prefeitura recifense investiu mais de R$ 30 milhões, contra R$ 4 milhões de Olinda). Salvador, que tem ainda o carnaval mais famoso do nordeste, vem perdendo espaço devido à sua descaracterização enquanto festa popular.



“A conclusão que temos que compreender é que é viável financeiramente realizar um carnaval popular e democrático. Não é preciso espetacularizar as tradições populares para fazer com que a festa cresça. É possível ‘vender’ sem comprometer uma festa popular”, conclui Steffen.



Programação



Mais de 500 agremiações entre blocos, troças, afoxés, maracatus, clubes de bonecos, escolas de samba, entre diversos outros grupos vão animar os milhões de foliões que estiverem em Olinda durante o reinado de Momo. A extensa programação começa na quinta-feira (15), logo pela manhã e segue até a quarta-feira de cinzas (21). Confira aqui.



* Intertítulos do Vermelho