Prefeitura de SP cortará subsídio habitacional de 2.500 pessoas
Implantado na gestão anterior, Bolsa-Aluguel foi criado para abrigar famílias que aguardam inscrição em projetos habitacionais. Líderes dos sem-teto acusam o município de cortar os programas e não propor alternativas às famílias. Por Rafael Sampaio, para
Publicado 20/02/2007 16:32
Diante do imponente prédio da prefeitura de São Paulo, localizado no centro da cidade, 120 pessoas sob risco de despejo estão acampadas em protesto contra o fim do programa Bolsa-Aluguel, cujos contratos estão, em boa parte, na iminência de acabar. A estimativa dos movimentos por moradia é de que cerca de 2.500 pessoas de São Paulo serão colocadas na rua em 2007, após o fim do prazo de 30 meses para a execução do programa.
Adotado pela prefeitura ainda durante a gestão Marta Suplicy (PT-SP), o Bolsa-Aluguel é uma medida transitória, em que o poder público subsidia com R$ 300 a casa de famílias sem-teto que aguardam a inscrição em programas da Companhia de Habitação de São Paulo (Cohab) ou da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU). Há, ainda, famílias que participaram de ocupações de prédios vazios e que aguardam a desapropriação dos imóveis ocupados ou a inscrição em outros programas habitacionais.
Dados oficiais da secretaria municipal de Habitação (Sehab) apontam que há 760 famílias inscritas no Bolsa-Aluguel, número que chegava, no início do programa, a 1.500 famílias. ''O Bolsa-Aluguel terminou, ele cumpriu sua meta, e não há nenhuma chance de renovação'', afirma Gislene Caron, assessora de imprensa da Sehab.
Entretanto, Benedito Barbosa, da Central de Movimentos Populares (CMP), reclama que a secretaria de Habitação não concretiza os programas habitacionais para os quais estas famílias que recebem o Bolsa-aluguel estão destinadas, e por isso elas ficam sem ter para onde ir.
Segundo ele, há imóveis que já foram desapropriados durante a gestão petista e que deveriam ter sido reformados para servir de habitação popular. ''A situação é crítica, porque nem as reformas foram feitas e nem o Bolsa-Aluguel está sendo renovado'', lamenta. ''São milhares de famílias que não tem condições de se manter, que serão despejadas em alguns meses''.
A assessora da Sehab afirma que o vencimento dos contratos será gradual, mas irrevogável. ''Não é um programa vitalício'', diz Caron, referindo-se à necessidade das pessoas procurem um emprego ou outra maneira de se sustentar. ''A Constituição não diz que o poder público tem que garantir habitação para todos, isto é um equívoco''.
O coordenador da Frente de Luta por Moradia (FLM), Osmar Silva Borges, afirma que houve duas reuniões entre líderes dos sem-teto e o chefe de gabinete da Sehab, Wagner Gama, no sábado (10) e na segunda (12). A Sehab sugeriu o desmonte do acampamento e também ofereceu habitação a 28 famílias de sem-teto, através do PAR (Programa de Arrendamento Residencial).
''Avaliamos que não há como atender a enorme quantidade de famílias inscritas no Bolsa-Aluguel e nem as famílias da ocupação Prestes Maia'', diz Osmar. Os líderes dos sem-teto propuseram para a Sehab que estendesse o programa Bolsa-Aluguel por alguns meses e liberasse mil unidades da CDHU para atender as famílias. Até agora não houve resposta, segundo o coordenador da FLM.
Borges cita o caso da rua Barão de Piracicaba, ocupada por 32 famílias ligadas ao MMRC (Movimento de Moradia da Região Central). Já Barbosa estipula que há 52 reintegrações de posse em curso na cidade. Estas reintegrações incluem favelas como a Água Branca (no Morumbi); a favela de Tapuias; a favela Beira Rio; a favela Brasilândia e um prédio da rua Santa Inês, localizado no Horto Florestal, que foi ocupado por 150 famílias.
''O governo federal destinou R$ 200 milhões para a prefeitura municipal, com o Programa de Aceleração de Crescimento (PAC), o dinheiro poderia ser utilizado para habitação popular'', argumenta Borges. Ele diz que, se houver despejo e as Bolsas-Aluguel não forem renovadas, apoiará que se monte ''uma grande favela urbana, no centro da cidade''.
Acampamento
O acampamento de barracões de lona, quase todos azuis, foi montado no Viaduto do Chá na segunda-feira da semana passada (dia 5), em frente à prefeitura. Há nove dias que a lona abriga crianças, homens e mulheres, que lutam para resolver o impasse. Há escassez de alimentos e o local é permanentemente vigiado por guardas civis e por policiais militares.
A dona-de-casa Maria do Socorro mora em um prédio ocupado, de nove andares, na avenida Nove de Julho. Mãe de uma menina de 14 anos, ela sobrevive com a ajuda da Bolsa-aluguel, assim como as 35 famílias que habitam o mesmo endereço.
''Eles estão cortando tudo e ameaçando de mandar pra rua'', disse Socorro à Agência Carta Maior, referindo-se ao poder municipal. Ela gostaria que houvesse uma continuidade ao Bolsa-aluguel, ou algum projeto habitacional acessível aos mais pobres. A dona-de-casa está desde o início no acampamento, mas dormiu alguns dias na casa de amigos. ''A única solução é ficar aqui, acampado, pra pressionar a prefeitura. Fora aqui não tem solução''.
Anderson Oliveira, que tem 26 anos e há oito faz parte do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto da Região Central (MTST-RC), reclama do descaso municipal com relação aos habitantes mais pobres do centro. Ele mora em um prédio ocupado na Praça da Sé, na rua Asdrúbal Nascimento, desapropriado durante a gestão petista na prefeitura.
No início, o prédio foi ocupado por 62 famílias. ''Não corro o risco de ser despejado por enquanto, mas já sofri muita ameaça'', diz ele, solidarizando-se com as famílias que perderão o Bolsa-aluguel. Anderson já morou na Barra Funda, Santa Cecília, Brás, Mooca e em outros bairros do centro, quase sempre em ocupações.
Ele está acampado desde sexta-feira. ''A Secretaria de Habitação ofereceu 32 unidades habitacionais, o que não vai ajudar ninguém. Ou ajuda todo mundo ou ajuda ninguém'', reclama. Anderson afirma que os sem-teto ''guerreiros'' ficarão acampados até haver alguma vitória para o movimento.