Gênero – Artigo de Raquel Guisoni
Helieth Saffioti, em seu livro- Gênero, patriarcado, violência – afirma que o conceito de gênero não se resume a uma categoria de análise, como muitas estudiosas pensam. Gênero também diz respeito a uma categoria histórica, cuja investigação tem demandado
Publicado 30/03/2007 14:12 | Editado 04/03/2020 17:14
Por isso é preciso trabalhar mais o conceito de gênero e sua interrelação com classe explicitando seu entrelaçamento de como gênero se realiza numa sociedade de classes.
Loreta Valadares afirma que é necessário de não se tomar o conceito de gênero como uma referencia que dá conta de toda especificidade da condição feminina. A concepção emancipacionista que entende e analisa a especificidade da opressão da mulher como fruto da perda da liberdade de produzir e o seu confinamento à esfera privada, com conseqüentes derrotas no plano político-juridico, afirmando, portanto a opressão especifica em intima relação com o processo de surgimento da propriedade privada, transformando a própria mulher em propriedade do homem ( Marx, in A ideologia alemã).
Conseqüentemente, a opressão especifica da mulher, sua gênese, seu processo de formação, coincide no tempo com o aparecimento das classes, com elas se entrelaçando e refletindo seu antagonismo e sua luta ao longo da história, nas diversas etapas e em diferentes formações econômico-sociais. A opressão especifica da mulher caminha e se desenvolve pari-passu, com a opressão social, de classes, caracterizando, assim, a mulher como oprimida enquanto ser sexual e ser social (Bebel, in A mulher e o socialismo).
Emancipação para a mulher é a possibilidade dela realizar suas atividades criadora de transformação da natureza ou de reprodução da espécie liberta das amarras que a impedem de a realizar plenamente, livre da alienação que a separa dos instrumentos e do conhecimento da produção – e livre dos hábitos e costumes que intervem na sua vida privada e a mantem presa as tarefas domesticas.
A emancipação plena das mulheres é um problema da emancipação social, e só são possíveis através de uma tentativa coletiva que envolva homens e mulheres. Por isso a necessidade da construção de um novo projeto de sociedade – o socialismo – como caminho para se construir essa experiência cooperativa e organizada, e esse novo modo de vida.
A dimensão da liberdade humana, de sua emancipação não se pode realizar nas sociedades capitalistas presentes com todos os seus laços de opressão social, sexual e racial. Nem mesmo, de forma plena, no período de transição do capitalismo para o socialismo. Esse controle sobre as forças da natureza exige um elevado desenvolvimento material das sociedades e uma vontade social cooperativa e organizada que não surge, automaticamente, pela mera alteração no poder.
As emancipacionistas não podem limitar seus objetivos de sua luta à conquista formal de direitos, à emancipação política. Devem ter como perspectiva a busca de um novo modelo de vida, nos marcos de um novo projeto de sociedade, o socialismo.
Isto implica:
– o reordenamento das condições de vida – econômicas, sociais e ambientais;-
– a reconstrução do estilo de vida – hábitos, rotinas, tradições;
-a consolidação de uma nova concepção de vida – valores e ideais.
Devemos assumir a compreensão de que o debate sobre a emancipação feminina tem de ser compreendido como elemento integrante da luta pela emancipação social.
Preconceito sexista na língua portuguesa
Entendendo que o opressão e a discriminação de gênero é abrangente e interligada, um dos aspectos a ser analisado, referente à questão cultural e ideológica, é a comunicação e a linguagem utilizada entre as pessoas.
Ao analisarmos a língua portuguesa constatamos que nela a linguagem é discriminatória para as mulheres.O masculino é genérico em nossa língua.
O feminino dissolve-se por detrás do masculino, expressando ideologicamente a ocultação objetiva da mulher pelo homem.
O próprio modo como os gramáticos e lexicógrafos explicam o funcionamento da linguagem constitui processo ideológico que reflete a ideologia dominante sexista.A língua evolui mais lentamente que o mundo social.
Constitui também vestígio exemplar da contradição social entre homens e mulheres a falsa simetria entre os próprios conceitos de homem e mulher.
Nos dicionários , a palavra “homem” no sentido de ser humano do sexo masculino, costuma ser conotado com traços humanos fortemente valorizados – coragem, determinação, vigor sexual, força física e moral, etc. Ao contrário, o termo – mulher – relaciona-se sobretudo com o sexo, beleza física e traços humanos pouco valorizados – fraqueza, leviandade, etc. Neste sentido, a língua encobre o fato de que a mulher foi socialmente submetida pelo homem devido a sua capacidade produtiva e reprodutiva, e não a uma pretensa inferioridade natural.
A luta social na linguagem dá-se sobretudo em nível de conteúdo das palavras e dos discursos. A proposta de uma linguagem neutra, própria a toda humanidade, viabiliza a imposição permanente de conteúdos das classes dominantes aos segmentos dominados, por sobre seus interesses.
Como ocorre com outros fenômenos sociais e ideológicos, podemos e devemos intervir para suprimir e corrigir as desigualdades lingüísticas.
Raquel Felau Guisoni é vice-presidente da CNTE – Confederação Nacional dos Trabalhadores de Educação, da direção estadual do PCdoB de Santa Catarina e coordenadora estadual da CSC /SC