Paulo Nogueira Batista Jr. lamenta saída da Venezuela do FMI

Em artigo publicado na edição desta quinta-feira do jornal Folha de S.Paulo, o economista Paulo Nogueira Batista Jr, que também é diretor-executivo do Fundo Monetário Internacional, lamenta a decisão do governo venezuelano de deixar de fazer part

Para Nogueira, o fato de alguns países da América Latina não precisarem mais de empréstimos do Fundo não é motivo o bastante para que tal decisão seja tomada. O economista defende que seria melhor o presidente Hugo Chávez colaborar para que outros países emergentes ganhassem mais representatividade junto ao FMI.



Confira abaixo a íntegra do texto:



Um aliado a menos?



Um aliado a menos no FMI e no Banco Mundial? É o que parece. Na segunda-feira desta semana, o presidente Hugo Chávez anunciou que a Venezuela pretende se retirar do FMI e do Banco Mundial. Com o seu estilo característico, que oscila entre o bombástico e o histriônico, o presidente venezuelano declarou que não tem mais nenhum interesse em continuar participando dessas instituições financeiras.



Descontados exageros retóricos, a decisão de Chávez tem um lado compreensível. O FMI e o Banco Mundial são organizações fortemente controladas pelos Estados Unidos e demais nações desenvolvidas. A participação dos países em desenvolvimento é pequena.



As políticas apoiadas pelo FMI revelaram-se freqüentemente inadequadas e contribuíram para agravar a situação econômica e política dos países que foram obrigados a recorrer a seus empréstimos. Em muitos momentos, o FMI e o Banco Mundial foram utilizados como veículos das agendas nacionais dos grandes países. Esses e outros problemas deixaram um rastro de ressentimentos na América Latina e em outras regiões do mundo.



Lamento, entretanto, a decisão do presidente Chávez. Espero que ela não se confirme. O FMI e o Banco Mundial têm cobertura quase universal. São poucos os países que não são membros dessas instituições. O FMI tem 185 membros; as Nações Unidas, 192. Ao sair do Fundo e do Banco Mundial, a Venezuela tende a se isolar.



Para o Brasil e outras nações sul-americanas, a saída da Venezuela é uma perda expressiva. É um aliado a menos nas discussões em andamento sobre a reforma do FMI. Os países latino-americanos e caribenhos menores, de baixa renda, alguns dos quais ainda dependem dos empréstimos do FMI, também perdem com a decisão de Chávez. A Venezuela é importante na nossa região e poderia somar-se ao Brasil e à Argentina para defender esses países menores em suas negociações com o Fundo.



Como se sabe, a situação econômica internacional tem sido muito favorável nos anos recentes. A maioria das economias sul-americanas, a Venezuela inclusive, apresenta contas externas fortes e dispõe de reservas internacionais vultosas. Não precisamos dos empréstimos do FMI. Vários países pagaram antecipadamente as dívidas que tinham com esse organismo.



Mas como saber o que nos reserva o futuro? Quem pode excluir a hipótese de que ocorram em algum momento novas crises internacionais com repercussões negativas na América do Sul? O FMI, que hoje parece dispensável, pode revelar-se novamente importante como fonte de empréstimos de emergência.



Não é recomendável sair do FMI e do Banco Mundial. O máximo que se consegue com isso é fazer algum barulho, marcar posição e impressionar a opinião pública. Mas esse ganho político é transitório e tende a se dissipar rapidamente. Melhor seria que a Venezuela continuasse participando dessas instituições, associando-se aos grandes países da periferia, como China, Rússia, África do Sul, Irã, Índia, Brasil e Argentina, para lutar pelo aumento gradual da representatividade dessas entidades multilaterais.



A decisão venezuelana ainda não foi formalizada. Quem sabe o governo brasileiro ainda tenha tempo de exercer um papel moderador, contribuindo para que não se tome uma decisão precipitada, que poderá isolar a Venezuela e enfraquecer seus aliados sul-americanos?