Paulo Nogueira Batista questiona redução de meta da inflação

O texto da coluna semanal do economista Paulo Nogueira Batista Jr, publicado na edição desta quinta-feira (31) da Folha de S.Paulo, critica a possibilidade de o Brasil ter suas metas de inflação reduzidas para os próximos anos.

O economista argumenta que as atuais metas são factíveis e permitem que o país tenha algum grau de flexibilidade ante a alguma possível crise externa. Mas, no seu entender, uma redução muito ousada pode comprometer esse quadro favorável.



Confira abaixo a íntegra do texto:


 



Reduzir a meta de inflação?


 



No fim de junho, o CMN (Conselho Monetário Nacional) fixará a meta de inflação para 2009. Reportagem publicada pelo jornal Valor Econômico” na segunda-feira informa que existem “estudos dentro do governo” sugerindo a redução do centro da meta para 4%, meio ponto percentual abaixo do nível estabelecido para 2007 e 2008. Segundo o jornal, esses estudos sugerem também que o intervalo de tolerância diminua de 2 pontos percentuais para 1,5 ponto percentual acima ou abaixo do centro. Além disso, recomenda-se ampliar o horizonte das metas de inflação, permitindo que elas sejam definidas com três anos de antecedência. Assim, em junho seriam estabelecidos os objetivos para 2009 e 2010.



Nenhuma das sugestões mencionadas na reportagem parece aconselhável. A diferença em relação à situação atual pode parecer pequena.



Mas as três mudanças combinadas representam uma perda não desprezível de flexibilidade. Dependendo do que acontecer na economia do país e do mundo até 2010, essa perda de flexibilidade pode acabar se transformando em motivo (ou pretexto) para manter taxas de juro anormalmente altas. Portanto, como dizem os argentinos: “Ojo!”.



Em 2006, a inflação ficou abaixo do centro da meta. Parece que o mesmo vai acontecer em 2007. Isso pode dar a idéia enganosa de que 4% é um número fácil de alcançar em 2009 e 2010.



Não se pode perder de vista que os resultados de 2006 e 2007 foram obtidos em condições bastante favoráveis ao controle da inflação. A economia brasileira vem crescendo pouco e só recentemente ensaia uma retomada mais expressiva da demanda. Não ocorreram grandes choques inflacionários pelo lado da oferta interna. O que houve, sim, foi um grande choque desinflacionário: a acentuada apreciação da taxa cambial. Essa valorização do real está ligada, por um lado, à taxa de juro interna, e, por outro, a circunstâncias excepcionais do ambiente internacional, tanto do ponto de vista comercial como financeiro.



Apoiando-se presumivelmente nos referidos estudos governamentais, a reportagem do “Valor” sustenta que, como os ventos internos e externos podem mudar, o CMN deveria aproveitar a fase favorável para consolidar o processo de desinflação. Ora, justamente por isso é que o governo deve avaliar com muito cuidado se convém reduzir o grau de flexibilidade do arranjo monetário atual, se vale mesmo a pena amarrar-se a objetivos mais ambiciosos até o final do segundo mandato do presidente da República.



Não nego que talvez seja possível alcançar resultados inferiores à meta atual, de 4,5%, até 2010. Os fatores internos e externos que não estão sob controle do governo podem continuar evoluindo favoravelmente. Mas por que se comprometer até 2010 com um arranjo mais rígido se não há nenhuma garantia de que os ventos favoráveis continuarão? Há bons motivos para temer que o período de bonança não vá durar tanto tempo.



Se a economia brasileira sofrer choques externos e internos, que elevem a taxa de câmbio ou os preços dos bens não comercializáveis internacionalmente, uma meta que hoje parece tranqüila pode revelar-se de difícil cumprimento. Em outras palavras, o Banco Central pode acabar se sentindo constrangido a continuar praticando juros básicos altos para padrões internacionais.



Ou pior: pode ser levado até mesmo a aumentar novamente a taxa básica de juro. Só a turma da bufunfa vai gostar.