Piauí: o desafio de desenvolver e preservar

Por Priscila Lobregatte*

Preservar a natureza a todo custo ou avançar no desenvolvimento sem levar em conta a questão ambiental? No Piauí, a alternativa é a do meio. O estado, um dos mais pobres do país, espera investir na economia local preserv

O partido está à frente da Secretaria de Meio Ambiente há quatro anos e, tendo em vista a ascensão do debate sobre mudanças climáticas e meio ambiente nos últimos meses, resolveu debater o tema e pensar alternativas para o estado. “O processo de mudanças climáticas extrapola fronteiras, mas precisa ser debatido tendo em vista quais são hoje os interesses dos países ricos e dos países pobres”, disse o comunista Dalton Macambira, secretário estadual de Meio Ambiente no Piauí. “Estados Unidos, Europa e Japão querem impor aos países em desenvolvimento o pagamento da conta por esse problema. E cabe às regiões mais pobres não aceitar esse discurso. Os países que mais se desenvolveram o fizeram com um uso degradante do meio ambiente”, advertiu.


 


 


Para ele, o importante é que, ao se pensar em desenvolvimento, tanto no Piauí
quanto no Brasil, as atividades locais sejam “economicamente viáveis, socialmente justase ambientalmente corretas”. O que não é aceitável, diz Macambira, “é que os países ricos queiram que a gente pague a conta deles. Ou seja, querem que, em nome da preservação ambiental, paremos de crescer. Isso torna os países em desenvolvimento ainda mais dependentes dos desenvolvidos”. Ele salientou ainda que Piauí e Brasil devem dar sua contribuição para a questão ambiental, sem cair no discurso das superpotências.


 


 


Combate à pobreza, com preservação


A população do Piauí está entre as mais carentes do país. Mais de 375 mil famílias
são atendidas pelo Bolsa Família em 223 municípios. “Metade de nossa população recebe o benefício”, diz Macambira. A meta do governo, segundo o secretário, é que “essas pessoas possam sair do Bolsa Família para ganhar seu próprio dinheiro trabalhando para a preservação do meio ambiente”.


 


 


No estado a proposta do secretário é equacionar os problemas ambientais e os sociais. No dia 5 de junho, dia do Meio Ambiente, o governador Wellington Dias (PT) assinou decreto criando o Fórum Estadual de Mudanças Climáticas e Combate à Pobreza. Trata-se de uma instância criada para se pensar alternativas que possibilitem o desenvolvimento da economia local, estagnada há pelo menos 50 anos, com inclusão social e respeito à natureza. A idéia surgiu, segundo Macambira, do seminário realizado pelo PCdoB. “Nossa idéia, com esse fórum, é que os fundos de carbono propostos pelo Protocolo de Kyoto possam render recursos para o Piauí na medida em que o estado aumente sua preservação ambiental”, disse o comunista.


 


O atraso das oligarquias


A gestão estadual vem lutando para mudar a realidade de miséria imposta ao Piauí pelas velhas famílias que controlavam a política local. Foi a partir de 1998, com a reeleição de Francisco “Mão Santa” (PMDB) para o governo estadual que as coisas começaram a mudar. Mas foi com a eleição do petista Wellington Dias em 2002 e com sua reeleição no ano passado que a oposição à hegemonia dos grupos tradicionais se intensificou. Daí a mudança na condução da política ambiental que antes privilegiava o atraso.


 


Um exemplo bastante representativo do que era a concepção da política local era o
poço Violeto, em Alvorada do Gurguéia, a 580 km de Teresina. Concebida para ser uma atração turística, a obra jorrava água numa coluna que atingia 70 metros de altura. Durante 30 anos, água límpida era desperdiçada por simples capricho dos coronéis piauienses. A menos de 100 quilômetros, está a cidade de Guaribas, que enfrentava sérios problemas de abastecimento e que já foi considerada a mais pobre do Brasil. E o poço Violeto não era o único. Há cerca de 300 como esses no Vale do Gurguéia. Em 2004, o Violeto ganhou registros e hoje a água é canalizada para fins de utilidade pública. Para enfrentar desmandos como esses que apenas serviram para acirrar a miséria do estado, a secretaria do Meio Ambiente quer casar desenvolvimento e conservação. “Queremos criar áreas de preservação, mas com contrapartida do mundo desenvolvido. Dessa forma, podemos dar à população mais carente chances de sobreviver sem a necessidade de desmatar. A ‘bolsa verde’ transformaria as famílias em guardiãs de nossa natureza gerando, ao mesmo tempo, renda para essas pessoas”, disse Macambira.


 


 


Aumento na preservação
Também no dia do Meio Ambiente, o governador do Piauí enviou mensagem à Assembléia Legislativa solicitando mudança na lei das reservas ambientais. Hoje a regra é que as novas fazendas podem desmatar 80% de sua área, mas devem manter 20% da mata nativa. A idéia da secretaria do Meio Ambiente do estado é que o Legislativo aprove o aumento da área preservada para 30%.


 


 


Além disso, as áreas deverão ser contínuas dentro de uma mesma propriedade e contígua com relação às propriedades vizinhas. “Isso é de grande importância para o estado, que tem no cerrado sua última fronteira agrícola. Temos 11 milhões de hectares de cerrado, 6 milhões agricultáveis. Destes, 10% já estão ocupados com alguma atividade agropecuária. Ou seja, há uma grande velocidade no avanço dessas atividades e a alteração dessa lei contribuiria para proteger o cerrado”, explicou Macambira. Para evitar que as normas sejam burladas, a secretaria tem uma parceria com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). O chamado Zoneamento Ecológico-Econômico via satélite permite ao governo acompanhar a ocupação
do território.


 


 


Apesar do trabalho pela preservação ambiental, Dalton Macambira vem sofrendo críticas de ONGs que se dizem defensoras da natureza. A Rede de ONGs Mata Atlântica instituiu o “Troféu” Moto-Serra, que, entre outros, “premiou” o secretário de Meio Ambiente do estado. “São ONGs financiadas pelo capital estrangeiro, que querem a preservação a todo custo, mesmo que isso signifique manter o estado economicamente estagnado”, alertou. Segundo ele, o Piauí tem 25 milhões de hectares dos quais 4 milhões (16% do total) são Áreas de Proteção Ambiental – as APAS, onde pode haver atividade econômica com restrições – ou parques, onde a preservação deve ser integral.


 


 


Essas ONGs ambientais, diz., “têm denunciado toda e qualquer atividade econômica, mesmo as que têm amparo legal. E essas denúncias têm servido a interesses obscuros, que não são nacionais, nem do Piauí”. Conforme destacou, tais críticas são feitas por pessoas “que não têm compromisso com nosso povo, que são bem vividas e que não dependem da economia local. Essas pessoas atendem a poderosos interesses e servem ao discurso das grandes potências”.


 


*matéria originalmente publicada no jornal A Classe Operária de junho, que em breve estará disponível no Vermelho e no Partido Vivo