A farsa do 1º turno: como o delegado instruiu repórteres
Por Luiz Carlos Azenha
Quando vazou fotos que faziam parte de uma investigação que corria em segredo de Justiça, na antevéspera do primeiro turno das eleições de 2006, o delegado Edmilson Bruno, da Polícia Federal, mostrou aos repórteres cópias de docu
Publicado 15/11/2007 17:11
Os petistas negociavam a compra de um dossiê que poderia incriminar o então candidato ao governo de São Paulo, José Serra, com gente ligada à máfia das ambulâncias, que atuou no Ministério da Saúde enquanto Serra era ministro, depois que ele entregou o cargo a Barjas Negri e durante parte do primeiro mandato do presidente Lula.
Funcionários ligados a Serra, o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares e o ex-ministro da Saúde Humberto Costa, do governo Lula, foram denunciados e respondem a processo por envolvimento com as irregularidades. O ex-ministro foi denunciado na semana que precedeu o primeiro turno das eleições, não foi para o segundo turno e no início de 2007 assumiu o cargo de secretário de Cidades do governo de Pernambuco.
Os repórteres não viram imediatamente a foto acima. Ela estava em um CD. Os documentos mostrados pelo delegado comprovavam depósitos feitos em nome dele, no dia da apreensão, no posto de atendimento bancário da Caixa Econômica Federal que fica no prédio da Polícia Federal em São Paulo. Os depósitos foram feitos em lotes de R$ 300 mil. O dinheiro ficou sob a guarda da empresa de segurança de valores Protege, em São Paulo.
Antes que a foto acima fosse feita, o delegado pediu a funcionários que juntassem os lotes de R$ 300 mil em apenas um malote. Não se sabe se o objetivo dele foi ou não “fazer volume”. No total, no malote, há R$ 1,168 milhão. Como parte do dinheiro é em notas de RS 10, especulou-se na época que a origem teria sido o jogo do bicho — sem comprovação. O inquérito nunca esclareceu de onde veio o dinheiro.
As fotos foram feitas durante perícia realizada na quinta-feira que precedeu o primeiro turno das eleições. O delegado disse que os peritos fizeram as fotos e ele também, por conta própria. Embora não fosse o delegado do caso, Edmilson Bruno estava presente. Não ficou esclarecido quem autorizou a presença do delegado na perícia, nem se ele foi ou não autorizado a tirar suas próprias fotos usando uma câmera digital particular. A versão do delegado dada aos repórteres pode ser ou não verdadeira.
Na noite de quinta-feira, algumas horas depois de tirar as fotos, o delegado encontrou-se informalmente com um grupo de repórteres do lado de fora do prédio da Polícia Federal. Segundo um dos presentes, ele prometeu “uma bomba”.
No dia seguinte, de manhã, encontrou-se novamente com alguns repórteres, aos quais mostrou documentos sigilosos e entregou CD com as fotos para que fossem feitas cópias. Na conversa, gravada por dois dos jornalistas, o delegado pediu garantias de que as fotos seriam divulgadas no Jornal da Band, no SBT Brasil e no Jornal Nacional. No dia seguinte, sexta-feira, as fotos apareceram na primeira página de jornais de todo o Brasil.
O delegado instruiu os repórteres: deveriam fazer edição para preservar o nome da Protege, a empresa de segurança. Mais tarde, voltou atrás e autorizou a divulgação do nome da Protege, mas pediu especificamente para que fossem editadas as fotos em que funcionários da empresa apareciam contando dinheiro.
Não foi esclarecido se o delegado entrou na sala sozinho ou acompanhado. Não se sabe como, não sendo o encarregado do caso, Edmilson Bruno tomou providências com o potencial de interferir no trabalho dos peritos presentes, como a de mandar juntar o dinheiro em um malote para fotografá-lo.
Em entrevista coletiva que deu diante do prédio da Polícia Federal, depois do vazamento, conforme havia antecipado aos repórteres, o delegado Bruno mentiu, ao dizer que nada sabia sobre a divulgação das fotos que ele mesmo promoveu clandestinamente.
A gravação do trecho inicial da conversa entre o delegado e os repórteres mostra que eles seguiram as instruções do delegado. Das fotos divulgadas, a do malote parece editada de acordo com as instruções do delegado, fora de centro devido a um corte acentuado na lateral esquerda.
Os funcionários da Protege, que poderiam ser identifcados através das fotos, se entrevistados agora pela imprensa poderiam ajudar a esclarecer detalhes obscuros do vazamento pré-eleitoral, inclusive as circunstâncias em que as fotos foram feitas.