Dia Nacional de Protestos dos Médicos defende saúde pública
Na semana seguinte da Conferência Nacional de Saúde, a Associação Médica Brasileira (AMB), o Conselho Federal de Medicina (CFM), a Federação Nacional dos Médicos (Fenam) e as entidades médicas estaduais decidiram nesta quarta-feira (21) realizare o Dia Na
Publicado 21/11/2007 18:57
Nos próximos três meses, grandes serviços que integram o Sistema Único de Saúde (SUS) – como hospitais e postos de atendimento – entram em estado de alerta e terão paralisações curtas em todo o país. De acordo com o coordenador da Comissão Nacional do SUS, Geraldo Guedes, os primeiros protestos ocorrem nesta quarta-feira em Minas Gerais, Goiás e Espírito, entre outros estados.
“Serão períodos curtos em rodízio em todo o país, de 30 minutos a duas horas. Suspenderemos as atividades naquele momento e os pacientes não serão prejudicados nessa fase. Só demonstraremos as más condições, principalmente nas áreas de média complexidade, as dificuldades que enfrentam os pacientes que não têm plano ou seguro de saúde, a incapacidade de o SUS responder e como o médico vive dentro desse problema”, disse o coordenador da Comissão do Pró-SUS, do Conselho Federal de Medicina, Geraldo Guedes, em entrevista ao programa Revista Brasil, da Rádio Nacional.
Reivindicações
Segundo o coordenador, há subfinanciamento nos dois sistemas com os quais o SUS trabalha: o de salários e o de saúde complementar, em que são contratados serviços de instituições privadas e filantrópicas. O movimento reivindica um piso salarial de R$ 6.063,52 para 20 horas de trabalho e reajuste de 100% do montante destinado aos honorários médicos do sistema.
“O médico tem de se desdobrar em vários empregos para conseguir uma remuneração irrisória. Há estados que pagam R$ 700, R$ 800 para uma jornada de 20 horas. Na tabela de serviços da saúde complementar, paga-se R$ 27,60 por um ato de um pediatra para assistência ao recém-nascido, algo que diminui muito a mortalidade infantil”, disse.
O SUS paga ao médico R$ 10 por consulta. Embora o parto normal seja incentivado, a remuneração é de apenas R$ 236 para aquele que fica disponível para o atendimento. Procedimentos como retirada ou cirurgia de amídalas pagam R$ 115, postectomia (circuncisão) ou cirurgia de fimose, R$ 42, retirada ou cirurgia de apendicite, R$ 211.
A pauta de reivindicações inclui o melhor atendimento à população, tornar o serviço público de saúde eficiente, carreira de estado e implantação de plano de cargos e salários para os médicos no sistema.
“É uma situação vergonhosa, não queremos mais compactuar com isso. Vamos dizer para a sociedade a real situação. O Brasil é um dos países que menos investe em Saúde. E não estamos comparando com países desenvolvidos, mas com países como Argentina, Colômbia e Chile, com grau de desenvolvimento próximo”, afirmou Guedes.
Emenda 29 e CPMF
O coordenador analisou a questão da regulamentação da Emenda 29, projeto de lei complementar que regulamenta os repasses de recursos da União, de estados e municípios para o setor de saúde, que foi aprovada na Câmara do Deputados no dia 31 de outubro. Para ele, o projeto foi votado às pressas e “mutilado”, pois é inferior ao projeto original, como instrumento de barganha política, para a aprovação da CPMF no Congresso Nacional.
“O projeto original, se aprovado, colocaria, para o ano que vem, mais de R$ 20 bilhões na saúde. O que nós estamos vendo, que foi aprovado nesse mecanismo de troca, são valores que somados durante quatro anos vão chegar a esses R$ 20 bilhões, do projeto original”, disse
Ministério da Saúde
O ministro da Saúde, José Gomes Temporão, disse que vê “de maneira muito preocupante toda e qualquer paralisação de profissionais de saúde, principalmente dos médicos”. “Toda e qualquer paralisação de médico penaliza a população.”
Temporão disse que estranhava a paralisação anunciada, pelo fato de já terem sido atendidas algumas das reivindicações feitas pelos médicos. E listou a liberação dos R$ 2 bilhões, no início de outubro, dos recursos que devem ser utilizados para reajuste da tabela de procedimentos do SUS, e aumento do teto financeiro de estados e municípios.
Ele também afirma que foi concedido recentemente um reajuste de 30%, em média, na tabela do SUS, que inclui a remuneração de médicos e alguns procedimentos.
A disposição contrária do ministro da Saúde não diminuiu a movimentação em diversos estados brasileiros em torno do Dia Nacional de Protestos. De acordo com o conselheiro Geraldo Guedes, os estados de Minas Gerais, Espírito Santo, Goiás e Pernambuco estão entre os que já iniciaram as atividades de mobilização.
Protestos
Os profissionais vão seguir em caravana até as assembléias legislativas, câmaras municipais, secretarias de saúde e outros órgãos para realizar uma série de atividades reivindicatórias.
“O Brasil hoje é o país que menos investe em saúde, comparado com países com o mesmo nível de desenvolvimento. Não é possível fazer um SUS funcionar bem sem que os profissionais sejam devidamente remunerados”, avalia o coordenador da Comissão do Pró-SUS, do Conselho Federal de Medicina, Geraldo Guedes, em entrevista ao programa Revista Brasil, da Rádio Nacional.
Para Guedes, o SUS é uma conquista da sociedade brasileira, mas em todo o período de atuação do sistema, há mais de 20 anos, tem deixado de cumprir condições essenciais para a atenção da saúde brasileira.
Guedes informou que nesse dia de protestos os médicos vão divulgar um calendário de atividades ininterruptas, o que chamam de paralisações relâmpagos, que serão momentos que os profissionais vão deixar as suas atividades e vão mostrar à sociedade civil a realidade das dificuldades de atendimento da saúde brasileira.
“Não vamos descansar enquanto não vermos a saúde se tornar, de fato, uma prioridade no país”, disse.
Goiás e Pernambuco
O presidente do Conselho Regional de Medicina de Goiás, Salomão Rodrigues Filho, compareceu aos principais jornais e TVs concedendo entrevistas ao vivo sobre a mobilização. Foi produzido ainda um panfleto para ser entregue aos pacientes. De acordo com Rodrigues Filho, a movimentação foi grande nas unidades públicas no Dia Nacional de Protesto.
Em Goiás, a proposta é paralisação apenas dos atendimentos eletivos.
Em Pernambuco, de acordo com o presidente do Conselho Regional de Medicina, Carlos Vital, houve um café da manhã e concentração na sede do Sindicato dos Médicos, com presença de membros da Associação Médica e conselheiros para coletiva à imprensa.
“Saímos em caravana para visitar hospitais emblemáticos do Recife (Hospital da Restauração, Hospital Universitário Oswaldo Cruz e Getúlio Vargas). Houve presença maciça dos médicos e fomos acompanhados pelas redes de televisão. Estamos ainda gravando um programa sobre o movimento, que será veiculado na TV universitária local”, assinalou.
Outros estados
No Paraná, o movimento recebeu apoio da Associação Médica local. Em parceria com o Conselho Regional de Medicina, os paranaenses organizaram uma manifestação no Hospital de Clínicas da UFPR.
No Mato Grosso, o Sindicato dos Médicos, o Conselho Regional de Medicina e a Associação Médica manifestaram apoio ao movimento.
Sergipe também aderiu ao protesto. De acordo com o conselheiro do CFM representante do Sergipe, Henrique Batista, o dia 21 figura como um marco para estabelecer estratégias coletivas na intenção de se mobilizar a mídia e a sociedade. Os meses seguintes podem culminar com uma paralisação nacional, embora esse desfecho não seja regra.
De acordo com o conselheiro Clóvis Constantino, o estado de São Paulo prepara-se para iniciar suas atividades relacionadas à mobilização nos próximos dias.
Já no Rio Grande do Norte, o presidente da Associação Médica do RN (AMRN), Geraldo Ferreira Filho afirmou que camisetas alusivas ao tema serão distribuídas aos médicos para mostrarem sua indignação durante o expediente de trabalho. Faixas já foram confeccionadas para serem colocadas nas fachadas dos principais hospitais da cidade e cartilhas com informações sobre os direitos do cidadão também serão entregues à população.
Ele afirmou que estuda a possibilidade de instalar uma barraca próximo às festividades de inauguração da Ponte Newton Navarro em Natal. “Haverá um grande fluxo de pessoas para mostrarmos nosso protesto e distribuirmos nossa cartilha”. O médico afirmou que o protesto local será dividido em três frentes de reivindicações: a carência de recursos humanos nas redes municipais, estaduais e federais de saúde; reaparelhamento e melhoria das instalações físicas da rede estadual de saúde; e conscientização da sociedade sobre seus direitos.
Efeitos de paralisações passadas
Inúmeras greves e paralisações já ocorreram este ano em todo Brasil no SUS. As movimentações de maior impacto para população se deram no nordeste onde as ações levaram o SUS a um estado de caos e calamidade.
Em Salvador, por exemplo, no dia 2 de outubro uma paralisação do atendimento pelo SUS foi promovida por hospitais e clínicas particulares conveniados. A ação gerou confusão entre os pacientes e em diversas unidades, pessoas que não sabiam do movimento tiveram dificuldades para conseguir informações e serem atendidas.
A decisão, tomada no dia 1º daquele mês em uma assembléia com os proprietários dos cerca de 300 hospitais e clínicas particulares conveniados ao SUS da capital baiana, teve a adesão no período de 90% das unidades de saúde, segundo a Associação dos Hospitais e Serviços de Saúde da Bahia (Ahseb).
Já em Fortaleza, uma paralisação de 48 horas ocorreu no dia 2 de outubro. Além de protestarem contra os baixos salários, o objetivo era pressionar a Prefeitura a criar um plano de cargos e carreiras. Foram suspendendidos o serviço nos 86 postos de saúde e também as cirurgias chamadas eletivas. Somente os casos urgentes foram atendidos. Cerca de 1.800 médicos participaram da movimentação.
Eles reivindicaram a implantação de um plano de cargos e salário, para conseguir dobrar o valor do piso, que atualmente é de R$1.700. “Não temos mais como esperar uma solução”, afirmou no período o presidente da Ahseb, Marcelo Britto.
Ocupação
Já em Alagoas, servidores públicos da saúde em greve ocuparam a unidade de emergência de Maceió, durante um protesto no dia 24 de setembro.
Os grevistas foram em passeata até o local e forçaram a ocupação do prédio. Houve empurra-empurra entre os servidores em greve e a segurança do pronto-socorro. A Unidade estava superlotada e os pacientes eram atendidos em macas espalhadas pelos corredores e em salas superlotadas.
Quinze categorias ligadas à Saúde entraram em greve por mais de um mês no período. Eles reivindicaram reajuste salarial para técnicos e auxiliares de enfermagem.
O Batalhão de Operações Especiais da Polícia Militar foi chamado para garantir a segurança no local, mas não houve confronto com os grevistas.