DF mais inchado
Aumento de renda, facilidades de crédito e loteamentos em todos os lados provocaram a vinda de muitas pessoas do Entorno para Brasília, elevando a cidade da sexta para quarta posição do ranking.
Publicado 26/11/2007 22:45 | Editado 04/03/2020 16:42
Muito já se falou sobre o forte crescimento populacional do Entorno do Distrito Federal e como os mais de 1,1 milhão de moradores estimados nessa periferia pressionam Brasília, seja na utilização dos serviços públicos, seja na disputa por emprego. Mas a nova contagem da população nacional, apresentada no início do mês pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostrou uma mudança no ritmo demográfico. Diferente de outras grandes cidades, a periferia encolheu, enquanto o Distrito Federal inchou e passou de sexta para a quarta maior população do país, com quase 2,5 milhões de habitantes.
A elevação da renda e a explosão imobiliária estão na raiz da mudança. Cidades que tinham crescido recebendo brasilienses expulsos pela impossibilidade de arcar com o custo de morar no centro da região, vêm perdendo moradores para o DF. “A cidade que mais cresce na América Latina”, como diz uma orgulhosa placa na entrada de Águas Lindas, tinha menos de cinco mil habitantes no início da década de 1990. No ano passado, o IBGE estimava que 168 mil pessoas viviam lá. Agora, o instituto contou 131 mil.
“Fiquei quatro anos na cidade, mas queria mudar, até porque sempre trabalhei em Brasília. No fim do ano passado comprei um lote num condomínio de Ceilândia, perto de onde há vários loteamentos novos, e há cinco meses consegui construir uma casinha. Foi uma melhora”, conta a empregada doméstica Edinéia Rodrigues da Silva.
O caso de Edinéia é emblemático. De um lado, as condições econômicas do país permitiram que ela e o companheiro Raimundo juntassem forças e pegassem R$ 5 mil emprestado para comprar material e erguer o lar de três cômodos em poucos meses. “É uma dívida grande, mas estamos conseguindo pagar”, diz a doméstica. Esse movimento acontece em todo o país cada vez mais, tanto assim que o setor de material de construção acredita num crescimento de 15% nas vendas este ano — o dobro do que era estimado no início de 2007.
Naturalmente, o impulso tem forte ligação com o aumento de recursos para financiamentos, assim como pela própria melhoria nos rendimentos dos brasileiros. Foi com a ajuda do salário e da aposentadoria do marido que a secretária Márcia Santos de Jesus deixou o Novo Gama (GO) para comprar e reformar uma casa em Santa Maria. “Sempre quis mudar. Como economicamente as coisas melhoraram, pudemos dar esse passo. Mas ainda quero mudar novamente, para o Gama”, diz Márcia.
Outro atrativo é a proliferação de loteamentos, em sua maioria irregulares — e, portanto, mais acessíveis — por todos os lados do DF. “Há áreas de grande expansão dentro do quadrilátero. Há Águas Claras, mas também Vicente Pires, o entorno de Sobradinho e a periferia de Ceilândia. Devemos ter quase 600 condomínios, mas mesmo o centro cresceu. O Sudoeste, em 1991, tinha 21 domicílios. Em 2000 eram quatro mil e o próximo censo deve mostrar que são oito mil”, diz o chefe do escritório do IBGE em Brasília, Walker Moura.
Oficialmente, um levantamento do ano passado da Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação considera a existência de 513 “parcelamentos informais” no Distrito Federal, mais do triplo do estimado em 1985, quando eram 150. Três de cada quatro desses loteamentos são urbanos, com mais de 545 mil habitantes. E mais gente continua chegando. Há dois anos, a conta era de 23 mil moradores em Vicente Pires, uma ex-colônia agrícola que em sua origem reunia cerca de 300 chácaras parcamente povoadas. Hoje, são 45 mil.
Essa expansão, lembra Walker Moura, forçou adaptações na própria estrutura de governo. Eram 19 as regiões administrativas em 2000, atualmente são 27 devido ao crescimento de áreas como Itapoã e Jardim Botânico. Não é à toa, portanto, que a dinâmica própria tenha transformado o DF na quarta maior região metropolitana do país. “Em outras capitais, a própria área limita o crescimento. Em Belo Horizonte e Fortaleza, metrópoles que foram ultrapassadas por Brasília, a expansão se dá nas cidades da periferia. Aqui, houve o contrário”, explica o chefe regional do IBGE.
Por outro lado, o fluxo de migrantes de outros estados diminuiu, acredita o economista Júlio Miragaya, do Conselho Regional de Economia. A dificuldade de garantir emprego na capital, a violência nas cidades da periferia e os programas de transferência de renda acabam funcionando mantendo as pessoas nos seus municípios. “O ritmo de crescimento de 30 mil novos habitantes por ano caiu para 10 mil. E podemos ver aí tanto os problemas locais, pois temos uma taxa de desemprego que insiste em se manter próxima dos 20%, quanto a melhoria dos municípios de origem. A maior facilidade para a obtenção de aposentadoria rural e o Bolsa Família também influenciaram nos municípios pobres, onde a circulação monetária é tão pequena que um rendimento familiar de R$ 500 com essas duas fontes faz muita diferença”, diz Miragaya.
Fonte: Correio Braziliense