Stiglitz calcula o custo da Guerra do Iraque: US$ 3 trilhões
Joseph Stiglitz, ex-vice-presidente do Banco Mundial, calcula os custos oficiais e, principalmente, as “verbas secretas” na Guerra do Iraque: US$ 3 trilhões. Custos diretos da intervenção superam os da Guerra do Vietnã e já são equivalentes ao dobro do
Publicado 05/03/2008 21:08
Quando quem te passa as contas é um especialista, dificilmente você terá escapatória. Neste caso, o especialista não é um contador de plantão qualquer, mas – muito pior! – o ex-vice-presidente do Banco Mundial, Joseph Stiglitz. Ele tem gasto seu tempo livre em examinar os valores que a administração Bush está gastando entre o Iraque e o Afeganistão. Devastador.
A análise tem como ponto de partida as previsões tornadas públicas pelo ex-secretário de Defesa, Donald Rumsfeld: entre 50 milhões e 50 bilhões de dólares. Por outro lado, recentemente o conselheiro econômico de Bush, Larry Lindsey, pediu ao Congresso um orçamento complementar de 200 bilhões. Naturalmente, como sugeriu um dia Paul Wolfowitz, a “reconstrução seria financiada com o aumento da produção de petróleo” por parte do Iraque.
Bobagens, diz Stiglitz. “Os custos diretos da intervenção no Iraque superam os da Guerra do Vietnã – que durou 12 anos –, e já são equivalentes ao dobro dos da Guerra da Coréia”. É óbvio que o cálculo está feito em “dólares constantes”. Claro, atualmente o aparato militar é hipertecnológico; cada “peça” custa muito mais. O “custo por soldado” aumentou muitíssimo: de US$ 100 mil para US$ 400 mil. Mas, de qualquer modo, é impressionante ler que “a única guerra da nossa história que já custou mais do que esta foi a Segunda Guerra Mundial, na qual participaram 16,3 milhões de soldados em uma campanha que durou quatro anos”. Foram quase 5 trilhões em dólares de 2007.
Se for aprovado o orçamento complementar para 2008, os gastos oficiais “aprovados” (entre operações militares, reconstrução, custos das embaixadas, segurança das bases, programas de ajuda) chegarão a um total US$ 845 bilhões. Mas os “gastos comuns” já atingem os 12.5 bilhões mensais, só pela guerra no Iraque (eram 4.4 bilhões em 2003), e vão a 16 bilhões, contando também o Afeganistão. Mas este cálculo não inclui os US$ 500 bilhões anuais que correspondem ao Pentágono, parte dos quais servem diretamente para sustentar as duas guerras. Além disso, segundo Stiglitz, estão os “buried costs”, as verbas secretas destinadas ao fortalecimento dos serviços de espionagem e fundos mistos com outros departamentos.
Por exemplo, “as indenizações em caso de morte e os seguros de vida”, que aumentaram –com o início da guerra— “de US$ 12.240 para US$ 100.000 (indenização por morte), e de US$ 250.000 para US$ 400.000 (seguro de vida)”. Destaca-se que estes valores, mesmo sendo consistentes, “não são mais do que uma pequena fração dos 7 milhões concedidos em caso de morte por acidente de trânsito de um jovem no ponto máximo de suas expectativas de vida”.
Além disso, os 4 mil soldados reconhecidos oficialmente como “mortos em combate” são apenas uma parte das baixas mortais contabilizadas como perdas. Não incluem os mortos durante as viagens noturnas ou em todos os outros acidentes “não relacionados com o combate” (mas dentro do teatro bélico). É como se o Pentágono – diz Stiglitz – mantivesse uma “dupla contabilidade”. Na segunda, “entre mortos, feridos ou doentes por transtornos psíquicos, o número duplica os cálculos oficiais”.
Esta série de diferenças permite que Stiglitz chegue – “provavelmente, por exclusão” – a uma estimativa de quase US$ 3 trilhões já gastos. A pergunta que qualquer um pode fazer é simples: como é possível que todo este “gasto público extraordinário” não tenha conseguido impedir a crise financeira que está minando o sistema internacional? E especialmente: como é possível que os cidadãos norte-americanos não percebam isso? Stiglitz, nem precisamos dizer, responde: “O preço, em termos de sangue, é pago por voluntários e contratados” (não pelos soldados de carreira).
Contudo, “mesmo que os impostos não tenham aumentado para pagar a guerra, são os contribuintes que têm financiado totalmente os custos dessa empreitada”. É claro que há truque nisso. “O gasto através do déficit provoca a ilusão de que as leis da economia podem ser anuladas e de que é possível ter, ao mesmo tempo, manteiga e canhões”. Uma ilusão, nem é preciso dizer. “Os custos da guerra são reais, mesmo que possam ser adiados, possivelmente para outra geração”. Contudo, antes ou depois, será preciso pagá-los. Porque, por outro lado, diferentemente do gasto keynesiano em “manteiga” (ou seja, em bem-estar), o gasto em “canhões” tem um efeito multiplicador muito baixo sobre o desenvolvimento. Concentra os benefícios em pouquíssimas mãos e não “redistribui” quase nada. Nem sequer nos Estado Unidos.
* Jornalista econômico italiano que escreve regularmente Il Manifesto; tomado de http://www.agenciacartamaior.com.br