Eleições nos EUA: Quem é McCain?
Na semana passada o Partido Republicano dos Estados Unidos definiu quem será o candidato da agremiação à eleição presidencial de novembro deste ano, que substituirá o atual presidente George W. Bush pelo vencedor da disputa. O senador John Sidney McCain f
Publicado 10/03/2008 14:14
McCain, cujo nome de batismo é John Sidney McCain III, nasceu na Zona do canal do Panamá em 29 de agosto de 1936. É senador republicano pelo estado do Arizona desde 1987. Foi candidato às primárias do Partido Republicano a Presidente na corrida presidencial do ano 2000, mas perdeu a nomeação para Bush.
Nascido em uma família de militares, lutou na Guerra do Vietnã, onde teria sido mantido prisioneiro. Ao retornar ao país, foi recebido na Casa Branca pelo presidente Richard Nixon. Candidato à presidência dos Estados Unidos em 2008, venceu a disputa pela vaga republicana com Mike Huckabee, Rudolph Giuliani e Mitt Romney. Agora, irá para a disputa final, onde enfrentará o vencedor das prévias do Partido Democrata.
A mídia corporativa pinta a biografia de McCain como uma “série de tiradas engraçadas ou frases de efeito politicamente incorretas”, cada uma delas ilustrando complexas e intrincadas relações vividas no passado.
McCain, que era considerado “punk” durante seu período na universidadeviveu um período muito “conturbado” quando estava alistado na Marinha. Naquela época, McCain chegou à beira de ser expulso por não corresponder às expectativas, mas se recompôs e, como em várias versões cinematográficas, deu uma de estúpido a herói e acabou como mocinho.
“John Sidney McCain Terceiro. Qual deles você prefere?”. O insulto direto de McCain a um veterano que exigiu seu nome em uma briga de refeitório ilustrou a irresponsabilidade em que arriscou sua expulsão da Academia Naval, onde seu total de pelo menos 100 deméritos o manteve como assíduo membro do Century Club.
Segundo a Associated Press, “McCain tem as raízes em uma linhagem de pessoas com nível de desempenho abaixo da média que se tornaram pessoas com desempenho melhor do que o esperado e de uma linhagem militar ainda mais extensa que remonta aos tempos de antes da Revolução”.
Família em ação
O primeiro John McCain pode ser visto em fotos da rendição do Japão no convés do encouraçado USS Missouri, em 1945. O almirante comandou forças tarefa no porta-aviões na guerra no Pacífico. Seu filho John comandou todas as forças norte-americanas no Pacífico na era Vietnã, emitindo ordens oficiais de intensificação dos bombardeios mesmo quando seu filho, o terceiro John, era mantido preso no perímetro de ataque.
O avô e o pai bebiam muito. Os três eram considerados vagabundos na academia. “Três indivíduos cheios de fraquezas que encontraram a redenção servindo o país”, define o atual McCain.
O McCain nascido na região do canal do Panamá — e que pode ser considerado inapto para candidatar-se à presidência por causa disso —, freqüentou cerca de 20 escolas antes de Annapolis, onde se formou em quinto lugar de baixo para cima na lista de alunos de sua turma em 1958.
Anos depois, ele foi acusado de ser um candidato pára-quedista por concorrer a um cargo no Arizona quando na verdade era de outro território. “Escuta aqui, meu amigo”, rebateu McCain, “Passei 22 anos na Marinha… O lugar onde fiquei mais tempo em minha vida foi Hanói [no Vietnã]”. Como a maioria de suas tiradas, esta continha uma verdade intrínseca, e derrubou as críticas como um golpe de nocaute.
McCain era um homem baladeiro na época em que fez o treinamento para piloto fora da academia. Era dono de um “carro de boy”, um Corvette e freqüentava assiduamente os botecos do “bass fond” miamenho. Namorava “Marie, a paixão da Flórida”, uma dançarina que limpava as unhas com um canivete. Ele declarou que “de modo geral, fazia uso indevido de sua juventude e boa saúde”. Quando foi para a guerra no primeiro semestre de 1967, estava casado com a ex-modelo da Filadélfia, Carol Shepp e já era pai.
Em outubro daquele ano, aos 31 anos, McCain estava em sua 23ª missão de bombardeios quando um míssil arrancou a asa direita de sua aeronave, derrubando o jato A-4 Skyhawk em parafuso. McCain conseguiu ejetar e desmaiou, retomando a consciência a cinco metros de profundidade em um lago em Hanói.
Prisioneiro no Vietnã
Com braço e perna quebrados, boiou pelo lago até ser levado pelos vietnamitas para a prisão que os prisioneiros de guerra apelidaram de Hanoi Hilton. “Nenhum americano chegou a Hoa Lo em condição física pior do que a de McCain”, exacerbou John Hubbell, historiador especializado em prisioneiros de guerra no Vietnã.
Durante mais de cinco anos preso, sendo três deles na solitária, McCain tentou se suicidar duas vezes. Teria passado por uma série de espancamentos. Nas celas compartilhadas, fazia encenações cômicas com os companheiros presos.
Quando encarcerado sozinho, fazia com que histórias de filmes e livros passassem pela mente. “Casablanca” era um deles. “Eu tinha que me proteger com muito cuidado das minhas fantasias que se tornavam tão profundas que me levaram a um lugar permanente em minha mente do qual eu poderia nunca mais retornar”, relatou ele.
Seus prontuários médicos registram que ele xingava os guardas quando eles interrompiam seus devaneios. “Ele apreciava tanto as suas fantasias”, dizem os registros, “que ficava muito contrariado quando os guardas se aproximavam e o levavam de volta à realidade.”
Como disse McCain, não há nada de heróico em ter o azar de ser atingido por um míssil. O que fez dele um herói aos olhos dos companheiros de prisão foi a sua recusa em aceitar a libertação antecipada enquanto os que estavam em Hoa Lo por mais tempo não fossem soltos.
Os responsáveis por sua prisão dobraram sua determinação, o que foi suficiente para fazê-lo confessar que era “um criminoso violento” e que tinha realizado “façanhas típicas de um pirata aéreo.”
Libertado pelos Acordos de Paz de Paris em 1973, voltou para casa de muletas, encontrando a esposa e o filho de muletas também. Carol havia sofrido um terrível acidente de carro, do qual ele só tomou conhecimento ao pisar em solo americano, e o filho havia se machucado jogando futebol.
Mulherengo
Iniciante na política, McCain aprendeu os macetes de Washington como contato da Marinha no Senado na década de 70, mantendo a ocupação até 1981. Mulherengo, já havia destruído seu casamento. Mas construiria outro em seguida.
Um mês depois de se divorciar de Carol, ele se casou com Cindy Hensley, filha de um magnata da indústria cervejeira de Phoenix, mudou-se para o Arizona e em pouco tempo mergulhou na política, conquistando uma cadeira na câmara em 1982.
Uma honra que teria sido inimaginável em Annapolis chegava a ele agora: foi eleito presidente da turma de calouros do GOP (como é conhecido o Partido Republicano). Mesmo construindo um histórico confiável de votações conservadoras, McCain não tardou a dar os primeiros passos em um caminho que faria dele um iconoclasta nos postos republicanos.
Ele discursou e votou contra uma resolução que autorizava o presidente Reagan a manter os fuzileiros navais no Líbano por mais 18 meses. Em seguida, terroristas bombardearam o acampamento dos fuzileiros em um ataque mortal, o que levou Reagan a encerrar a missão de paz.
Depois de dois mandatos na Câmara dos Representantes (o equivalente à Câmara dos Deputados, no Brasil) que lhe renderam destaque em pequenos círculos, embora nenhuma medalha em nenhum deles, aniquilou um adversário democrata para conquistar seu lugar no Senado.
O marqueteiro McCain conseguiu espalhar na mídia que era um autêntico e rígido controlador do dinheiro dos contribuintes. Órgãos de controle ligados aos republicanos lhe encheram de recompensas e renderam matérias nacionais.
Nesse período, McCain atacou o sistema de financiamento de campanhas, questão que o aproximou de democratas que compartilhavam sua opinião e o afastou dos líderes republicanos.
A trajetória do senhor “Limpeza Total” ingressou por vias escusas quando McCain e outros quatro senadores foram acusados de tentar influenciar reguladores do setor bancário em nome de Charles Keating, agente financeiro de empréstimos e investimentos posteriormente condenado por fraude nos títulos de crédito. McCain era amigo de Keating e chegou a usar sua casa de veraneio no Caribe algumas vezes.
O Comitê de Ética do Senado foi ameno com McCain, intimando-o por “falta de discernimento” mas não recomendando nenhuma outra ação. McCain posteriormente devolveu US$ 112 mil em empréstimos de campanha que havia recebido de Keating. O episódio “provavelmente estará gravado em minha lápide”, declarou McCain.
Phil Gramm, amigo de McCain que esteve do lado dele pela reforma no financiamento de campanhas e os impostos do tabaco quando ele era senador pelo Texas, disse que o escândalo Keating era, em alguns aspectos, mais duro para McCain do que o tratamento que recebera dos guardas em Hanói, porque “no Vietnã ninguém questionava a credibilidade dele.”
O caminho à Presidência
McCain rompeu o clima sombrio em uma ocasião regada a bexigas coloridas: o anúncio de sua primeira campanha presidencial. É por essas e outras que ele frustra seus assessores. Mas isso ajuda a explicar por que seu “Expresso do Discurso Franco” engatou em 2000.
McCain se preparou para uma reviravolta nas convenções de campanha, a assumir riscos enquanto outros deixavam que a cautela e o roteiro pré-programado os orientasse. Essa era a sua natureza, mas também a sua realidade política no trato do poder incontrolável de Bush. “Realmente não tínhamos nenhuma outra escolha.”
Ignorando quase completamente Iowa, onde a sua oposição aos subsídios ao etanol de qualquer maneira já havia apagado suas chances, McCain encontrou seu pote de ouro em New Hampshire, derrotando George W. Bush em quase 20 pontos percentuais.
Em seguida, foi colocar a mão na massa na disputa tudo-ou-nada da Carolina do Sul. A equipe de Bush abriu um ataque frontal. Operadores simpatizantes de Bush espalharam fofocas pelo telefone. Houve um cisma de líderes religiosos conservadores que até hoje não cicatrizou. McCain se manteve firme após sua derrota nesse estado, mas as prévias da Super-terça consumiram qualquer energia que ainda restava em sua campanha.
McCain convive com a culpa em relação a alguns acontecimentos de sua vida. Entre eles, sua confissão no Vietnã, sua indiferença de décadas com um companheiro prisioneiro de guerra que se dedicou à recuperação de McCain atrás das grades, mas depois aceitou ser solto antes dos demais, sua traição da primeira esposa e sua participação no escândalo Keating.
A campanha na Carolina do Sul provocou mais um desses momentos. Ele conta que colocou a conveniência política na frente da verdade proferida dura e cruamente quando fraquejou no debate sobre a bandeira confederada, em princípio favorecendo os oponentes da bandeira e depois ficando do lado de seus defensores.
“Não fui apenas desonesto. Fui um covarde e separei os meus interesses dos interesses do país”, escreveu ele em sua recente autobiografia. “Isso tornou a mentira imperdoável. Todos os meus heróis, fictícios e reais, sentiriam vergonha de mim”.
Em 2004, quando a agência Associated Press pediu que os candidatos democratas à nomeação presidencial citassem seu republicano favorito, John Kerry, John Edwards e Joe Lieberman responderam McCain.
O republicano conservador teve uma estranha atração pelos democratas, que praticamente o santificaram em alguns de seus discursos. Foi um certificado de suas legítimas amizades e alianças.
McCain e Kerry, seu companheiro veterano do Vietnã, por exemplo, aliaram-se nas questões pós-guerra do Vietnã e enterraram os ressentimentos do período de Kerry como proeminente manifestante contra a guerra. Mas elogiar McCain também era uma forma indireta de cutucar Bush.
O senador do Arizona desde o início foi um crítico cáustico da conduta de Bush em relação à guerra do Iraque. Ele também é, paradoxalmente, um aliado vital de Bush na função de pressionar a continuidade da missão. McCain arriscadamente apostou a sua campanha de 2008 no sucesso no Iraque mesmo com a queda gradual do apoio à guerra.
Em um semestre desastroso, sua campanha praticamente se desintegrou, com a arrecadação de fundos e as posições em pesquisas ficando para trás e com a equipe se afastando.
Em uma manhã recente, ele foi ao escritório da Associated Press onde concedeu uma entrevista de uma hora, aparecendo antes do horário e sozinho, falando durante uma hora sem o apoio de assessores, analisando os detalhes da política externa e interna, soltando piadas autodepreciativas. Não se lembrava da última vez em que tirou um dia de folga. Ao sair, um carro estaria esperando por ele na porta.
Os antigos ferimentos de torturas e guerra, agravados agora pela artrite, o fazem mancar levemente e ele não consegue levantar nenhum dos braços acima da altura da cabeça. Por três vezes foi diagnosticado com melanoma, a forma mais agressiva de câncer de pele, e possui uma cicatriz do lado esquerdo do rosto devido à doença.
Questões polêmicas
Aborto – É contra o direito ao aborto
Casamento homossexual – Deixaria os estados legislarem sobre o caso. É contra a emenda constitucional proibindo-o.
Aquecimento global – Favoreceu projeto que determinaria limites obrigatórios às emissões de gases que provocam o efeito estufa
Controle de armas – Votou contra a proibição de armas de fogo e defendeu fabricantes e vendedores de armas contra ações civis
Saúde pública – Apoiou a cobertura de remédios sob prescrição para idosos e ampliou o seguro para crianças, mas não a lei de cobertura universal
Imigração – Votou a favor da cerca na fronteira com o México. Defende status legal a imigrantes sem documentos, desde que falem inglês e paguem impostos.
Iraque – Votou pela autorização da guerra em 2002. Apóia o aumento das tropas e é contra a retirada.
Pesquisa com células-tronco – Apóia a diminuição das restrições federais ao financiamento da pesquisa com células-tronco embrionárias.
Impostos – Defende reduções de impostos permanentes. Quer excluir o imposto mínimo alternativo.