Reportagem do Estado de Minas fala da tática eleitoral do PCdoB
Produzida pela jornalista Alessandra Mello, o períodico mineiro apresenta as construções que os comunistas estão fazendo nas principais cidades do Estado, onde pretendem lançar candidaturas majoritárias. Confira a íntegra da matéria:
Publicado 24/03/2008 08:51 | Editado 04/03/2020 16:52
Sem a sombra dos petistas
Alessandra Mello
Depois de duas décadas aliado ao PT, PCdoB tenta alçar vôo solo em outubro. Em Minas, partido pretende tentar a prefeitura de 21 cidades e concorrer com mil candidatos a vereador. ''No leque de alianças do governo Lula houve uma aproximação maior do PT com o PMDB e em conseqüência certo deslocamento dos partidos de esquerda'', diz Jô Moraes (PCdoB), deputada federal e pré-candidata à Prefeitura de Belo Horizonte.
O PCdoB resolveu sair da sombra do PT, partido com o qual os comunistas se aliaram nas duas últimas décadas, desde a volta do regime democrático. Nas eleições municipais deste ano, a legenda pretende lançar candidaturas próprias em cerca de 400 cidades, principalmente capitais, grandes cidades de regiões metropolitanas em que a disputa ocorre em dois turnos, e municípios com vocação operária. Em Minas Gerais, a situação não é diferente.
Em Belo Horizonte, o namoro de anos das duas legendas acabou. Antes mesmo de o PT começar a discutir abertamente uma composição com o PSDB – tendo como intermediário o PSB, partido do secretário de desenvolvimento Econômico e Social, Márcio Lacerda, cotado para ser o candidato da dobradinha petista/tucana –, a deputada federal e líder da bancada do PCdoB na Câmara, Jô Moraes, já ensaiava sua pré-candidatura. Com a possibilidade dessa aliança inédita, o afastamento das duas legendas ficou mais evidente. “No leque de alianças do governo Lula houve uma aproximação maior do PT com o PMDB e em conseqüência certo deslocamento dos partidos de esquerda”, avalia a deputada, que também preside a legenda em Minas.
Em Betim, na Região Metropolitana, cidade onde PT e PSDB são adversários ferrenhos, o PCdoB sinalizou candidatura própria. O pré-candidato é Geraldo Pimenta, vereador há dois mandatos. O quadro sucessório na cidade ainda não está claro. A única definição é a escolha do candidato que terá o apoio do atual prefeito, Carlaile Pedrosa (PSDB): o deputado estadual Rômulo Veneroso (PV). Na cidade, os comunistas conversam com o PDT e com o PMDB e uma aliança com essas legendas está sendo avaliada. Nas duas últimas eleições, o PCdoB foi aliado do PT na disputa pela Prefeitura de Betim.
Opostos
Já em Contagem, os dois partidos também estarão em campos opostos, como já ocorreu nas eleições de 2000, quando o PCdoB se aliou ao PMDB e apoiou a candidatura do ex-prefeito Paulo Mattos, que acabou não se reelegendo. O candidato do PT foi o deputado estadual Durval Angelo, que também não teve sorte na disputa. O eleito naquele ano foi o deputado estadual tucano Ademir Lucas, pré-candidato do PSDB à sucessão da prefeita Marília Campos (PT). O pré-candidato do PCdoB será o deputado estadual Carlin Moura. Sua candidatura é tida como certa e a possibilidade de apoio à reeleição da prefeita é considerada remota.
Apesar do distanciamento e de já assumir discurso de oposição, Carlin Moura garante que a intenção do partido não é se contrapor ao PT. “O objetivo é fortalecer a esquerda e os movimentos populares e democráticos, para que as conquistas já obtidas pelo governo Lula não sejam em vão”, diz. Segundo ele, a frente de esquerda que tinha o PT como referência durou 17 anos, mas a proximidade do PT com partidos de centro e com a social democracia enfraqueceram essa aliança. “Não podemos deixar os partidos de esquerda com pouca força política, por isso o PCdoB precisa assumir um papel de protagonista nestas eleições”.
Em todo o estado, o partido pretende lançar 21 candidatos a prefeito e cerca de mil candidatos a vereador. Entre essas candidaturas estão a de cidades-polo, como Montes Claros, onde o candidato deverá ser o vereador Lipa Xavier, e Governador Valadares, onde o partido já definiu a pré-candidatura da ex-vereadora Rosimeire Mafra. Em Poços de Caldas, o candidato será um vereador que recentemente deixou o PT para se filiar ao PCdoB, Marcos Matavelli, e em Alfenas o vereador Eliacim do Carmo Lourenço, presidente da Câmara Municipal.
ESTRATÉGIA PARA CRESCER NO PAÍS
O presidente do PCdoB, Renato Rabelo, disse que depois de 15 anos participando das eleições dando prioridade às alianças proporcionais (eleição de deputados estaduais, federais, senadores e vereadores) em detrimento das majoritárias (eleição de presidente, governador e prefeito), principalmente com o PT, o partido resolveu mudar de estratégia. “Vamos lançar cerca de 400 candidatos em todo o país. Desde a legalização da legenda nunca tínhamos atingido esse patamar”, afirma Rabelo. Além de capitais importantes como a mineira, o partido pretende lançar o nome do ex-presidente da Câmara dos Deputados Aldo Rebelo para disputar a prefeitura da maior cidade do Brasil – São Paulo. Também vai lançar no Rio Grande do Sul, que já foi reduto eleitoral do PT, a candidatura da deputada federal Manuela Dávila, uma das parlamentares mais bem votadas nas eleições passadas.
Além de lutar por mais protagonismo no cenário eleitoral, Rabelo afirma que há um espaço deixado pelo PT que precisa ser preenchido pela esquerda. “Temos que marcar posição. Na disputa pela presidência da Câmara, o PT se aproximou mais do PMDB, deixando de lado o PCdoB, que sempre foi um aliado histórico dos petistas, e aos poucos está deixando o campo da esquerda”, afirmou Rabelo, referindo-se à candidatura à reeleição de Aldo Rebelo, que não contou com o apoio do PT.
Agora, segundo ele, com a tentativa de lideranças do PT de selar um grande acordo com o PSDB na capital mineira, as preocupações do PCdoB são maiores. O temor é que um acordo dessa natureza extrapole a eleição municipal e tenha desdobramentos em 2010. “Esse é um tipo de aliança que, para o PCdoB, é inviável. Ele fere a nossa linha política, pois sempre estivemos em campos opostos aos do PSDB. Além disso, em uma coligação tão ampla como essa que pode vir a ser fechada, o PCdoB teria um papel secundário”. Nas próximas semanas, segundo ele, o PCdoB começa a conversar com os partidos da base aliada do presidente Lula sobre a sucessão na capital mineira e nas cidades mais importantes do estado. “É possível que dessa conversa saia um acordo”, prevê.
Publicada no jornal Estado de Minas de 24/03/2008