Enfim um Estado Laico?

No artigo abaixo, Pedro Benedito Maciel Neto, discorre sobre o impacto da decisão do da decisão do STF, a respeito da continuação das pesquisas com células tronco, na construção de um estado verdadeiramente laico no Brasil.

Sob protestos de entidades em favor da vida, sobretudo a Igreja Católica, e outros tantos em defesa de pesquisas científicas capazes de melhorar a saúde humana, a decisão do Supremo Tribunal Federal sobre a constitucionalidade do artigo 5º da Lei 11.105/05, chamada Lei de Biosegurança, significa segundo alguns comentaristas, que enfim o Brasil é de fato e de direito um Estado Laico. Muito bem, – diria o meu avô Pedro – e completaria, mas isso é bom o ruim e para quem?


 


 


Bem, Estado laico é Estado leigo, neutro. Laico, do latim laicus, é o mesmo que leigo, equivalendo ao sentido de secular, em oposição do de bispo, ou religioso. O termo laico remete, obrigatoriamente, à idéia de neutralidade, indiferença. Celso Ribeiro Bastos afirma que a liberdade de organização religiosa tem uma dimensão muito importante no seu relacionamento com o Estado. Três modelos são possíveis: fusão, união e separação. O Brasil enquadra-se último desde o advento da República, com a edição do Decreto119-A, de 17 de janeiro de 1890, que instaurou a separação entre a Igreja e o Estado. O Estado brasileiro tornou-se desde então laico, o que significa que ele se mantém indiferente às diversas igrejas que podem livremente constituir-se.


 


 


Ao longo da história o Estado e a Igreja sempre andaram muito próximos, por várias vezes confundindo-se, e isto desde as antigas civilizações. Diferente não foi com a formação do Estado brasileiro, que em seus primórdios já foi chamado de Terra de Santa Cruz e teve como primeiro ato solene uma missa.


 


 


No Brasil, como ensina o Professor Alexandre Cunha, a Constituição outorgada de 1824 estabelecia a religião católica como sendo a religião oficial do Império, que perdurou até o início de 1890, com a chegada da República. Com o advento da primeira Constituição da República, o Brasil passou a ser um Estado laico e a consagrar ampla liberdade de crença e cultos religiosos. Depois do advento da República, o Brasil jamais deixou de ser um Estado laico, pelo menos no papel.


 


 


Sobre a eliminação dos elementos religioso e clerical Marx e Engels escreveram, referindo-se à Comuna: “… ao eliminar o elemento religioso e clerical, tomou a iniciativa de emancipar intelectualmente o povo.” Nietzche, no seu Aurora escreve que “A grande conquista da humanidade, até agora, é não precisarmos mais temer continuamente os animais selvagens, os bárbaros, os deuses e os nossos sonhos.”


 


 


Parabéns ao Brasil, que através do Supremo Tribunal Federal venceu o medo do pecado, acreditou na pesquisa humana como forma de afirmação necessária do livre arbítrio. Agora nos resta ressaltar a coragem daqueles que romperam, através da decisão, com a autoridade do medo e do costume.


 


 


Pedro Benedito Maciel Neto tem 44 anos, é advogado e professor universitário.