João Batista Lemos: A ofensiva imperialista contra a Bolívia

O momento político no continente demanda uma reação mais enérgica dos movimentos sociais, do governo e das forças progressistas brasileiras em defesa da democracia e das transformações sociais na Bolívia, na Venezuela e em outros países latino-american

A temperatura da luta de classes cresce rápida e perigosamente na América Latina. Os últimos dois dias foram marcados pela radicalização do conflito promovido pela direita boliviana, que já resultou em pelo menos 14 mortes (até 6ª feira, 12-9) e na expulsão dos embaixadores estadunidenses de La Paz e Caracas. A decisão do governo Chávez foi um gesto de solidariedade a Evo Morales. Também em apoio à Bolívia, o presidente de Honduras, Manuel Zelaia, cancelou o encontro com o novo embaixador dos EUA que estava agendado para esta sexta-feira.



Em retaliação, a Casa Branca expulsou os embaixadores venezuelano e boliviano dos EUA. O Tesouro americano também comunicou o congelamento dos ativos de dois altos funcionários e o ex-ministro do interior e da Justiça do governo Chávez, Ramón Rodríguez Chacín, acusando-os de colaborar com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARCs).



Conspiração 



Os acontecimentos em curso na Bolívia e na Venezuela sugerem que os EUA não reativaram sua 4ª Frota de Intervenção para realizar filantropia na América Latina, conforme insinua o cínico discurso de Washington.



O imperialismo está empenhado de corpo e alma na pérfida conspiração para derrubar os governos de Evo Morales na Bolívia e Hugo Chávez na Venezuela impedir mudanças políticas mais profundas na região.



Ainda é fresca na memória de quem acompanha a conjuntura política americana a lembrança do golpe militar de abril de 2002 em Caracas, que felizmente durou pouco mais de 24 horas. O governo Bush aposta na guerra civil para acabar com o Estado boliviano e esquartejar o país andino.



Um separatista profissional



O embaixador expulso e considerado persona non grata por Morales, Philip Goldberg, é o mesmo que comandou a missão norte-americana em Pristina, capital de Kosovo, e ali consolidou a divisão e separação da ex-república sérvia. “Não queremos separatistas ou pessoas que conspirem contra a unidade e que violem a democracia”, afirmou o presidente boliviano sob aplausos no pronunciamento em que anunciou a expulsão de Goldberg.



Também não terá sido por mero acaso que os autonomistas promoveram diversos ataques contra representações oficiais do Estado boliviano logo após o líder oposicionista Branco Marinkovic retornar dos Estados Unidos, na última terça-feira (9). Tudo indica que está em curso uma conspiração meticulosamente planejada e orientada do exterior com o objetivo de retalhar a Bolívia, a exemplo do que o imperialismo fez nos Bálcãs.



Elo frágil



O país presidido pelo índio Morales talvez esteja sendo considerada como o elo mais frágil da corrente progressista que ganhou força na América Latina, mas certamente não é o único alvo do império. Se conseguir seus intentos no país andino, os imperialistas americanos partirão pra cima da Venezuela e do Equador. O Brasil, da Amazônia e do petróleo no pré-sal, também não está imune a riscos.



“Devemos estar a serviço dos povos, em lugar de estar a serviço das multinacionais”, declarou Evo Morales em discurso feito há cinco anos, em setembro de 2003, no Fórum em Defesa da Humanidade, realizado na Cidade do México.



Depois de eleito, ele procurou passar das palavras aos fatos, nacionalizou a exploração do petróleo e do gás, elevou significativamente a taxação das multinacionais, deflagrou um processo de reforma agrária, concedeu uma renda mínima aos mais pobres e aos idosos e multiplicou o volume de recursos destinados aos gastos e investimentos sociais.



DNA bandido



A economia cresce e o Programa Nacional de Alfabetização avança rapidamente e em poucos dias a cidade de La Paz será declarada livre deste flagelo. Essas realizações despertaram o ódio dos imperialistas ianques e das classes dominantes locais, educadas no racismo e na intolerância contra os índios e pobres



Nossa experiência histórica não recomenda ilusões com as prelações “democráticas” do império, ecoadas como cantochão pelos ideólogos do neoliberalismo e a mídia empresarial. A propensão ao fascismo está inscrita no DNA de Tio Sam e já foi demonstrada em diferentes ocasiões e territórios. Lembremos Allende no Chile, há precisos 30 anos, e Goulart no Brasil, em 1964. O que se desenha no presente já não parece tão diferente deste passado que não é tão remoto, muito embora os tempos sejam outros.



Os movimentos sociais e as forças progressistas brasileiras precisam intensificar as ações de solidariedade com o presidente índio e tomar iniciativas mais enérgicas em defesa da democracia e da mudança na Bolívia e em outros países latino-americanos. Mesmo porque, como disse Morales na Cidade do México, “não temos alternativa. Se queremos defender a humanidade é preciso derrotar o sistema, é preciso derrotar o imperialismo americano”.



* secretário de Relações Internacionais da CTB