BH: chantagem, obras e propaganda ostensiva conspiram pela ''aliança''

A disputa eleitoral pela prefeitura de Belo Horizonte é cercada de práticas que lembram o velho coronelismo. Funcionários públicos, empresários e lideranças comunitárias são constrangidos a apoiar o candidato oficial ou a se afastar de outr

2010 está em jogo


 


A disputa eleitoral na capital mineira é um jogo pesado, bruto e desigual. O governador Aécio Neves (PSDB) e o prefeito de Belo Horizonte, Fernando Pimentel (PT), apesar de não serem candidatos, apostaram seus projetos políticos nesta disputa. Aécio sonha com a presidência da República e Pimentel com o governo de Minas em 2010. Para que possam viabilizar seus projetos, dependem de uma vitória agora em 2008. E ao que parece, estão dispostos a fazer de tudo para não perder. “É uma questão de honra e de sobrevivência política para eles ganhar a prefeitura de Belo Horizonte”, diz um observador da cena política mineira que preferiu não se identificar.


 


A presença de Aécio e Pimentel na campanha é tão ostensiva que o candidato oficial da “aliança”, Marcio Lacerda (PSB), é figura secundária nos programas do horário eleitoral gratuito em rádio e TV, onde os mais aparecem e falam são o prefeito e o governador.


 


Chantagem, pressão, ameaças


 


Ostensiva também é a pressão política que opera nos bastidores da disputa. A campanha eleitoral em BH enfrenta um constante clima de chantagem, que atinge três esferas: o funcionalismo público, os empresários da cidade e os moradores de bairros beneficiados com obras públicas.


 


Servidores, tanto da prefeitura quanto do governo estadual, especialmente os que ocupam cargos de confiança, estão sendo monitorados para se garantir que não apoiarão outros candidatos que não o candidato oficial. Não são poucos os relatos de funcionários que se sentiram ameaçados ao demonstrar simpatia por outra candidatura. Os que ocupam cargos de confiança temem ser demitidos e mesmo os concursados correm o risco de perder gratificações e serem perseguidos pela chefia.
Até mesmo lideranças partidárias sentem a pressão. Alguns partidos, como o PTB e o PR, por exemplo, pretendiam apoiar a candidata do PCdoB, Jô Moraes, mas houve interferência externa e as lideranças locais tiveram que aderir à candidatura Lacerda. Candidatos a vereador dos 12 partidos que integram a “aliança” (PSB-PT-PTB-PP-PR-PV-PMN-PSC-PSL-PTN-PTC-PRP), além do PSDB e PPS que a integram informalmente, também estão sob pressão.


 


Empresários da cidade têm relatado que foram constrangidos a não contribuir financeiramente com candidatos que disputam diretamente com o candidato da “aliança”. As empresas que prestam serviços ou fornecem produtos para a prefeitura e o governo mineiro são as mais suscetíveis às ameaças. O resultado disso é que a campanha de Lacerda esbanja recursos –fala-se na contratação de milhares de cabos eleitorais– enquanto as demais candidaturas sofrem para conseguir qualquer tipo de contribuição.


 


E mesmo quem não tem vínculos diretos com as máquinas do estado e do município também é vítima do clima de chantagem que se espalhou pela cidade. Nos bairros beneficiados por obras da prefeitura ou do governo mineiro circulam boatos de que se o candidato oficial perder a eleição, as obras serão paralisadas. O site da prefeitura de BH informa que há 200 obras em andamento na cidade. Como a votação de cada candidato pode ser medida urna a urna, os moradores e lideranças comunitárias estão com medo de verem sua região ser abandonada caso a “aliança” perca naquele bairro.


 


“Obras por toda a cidade”


 


Os demais candidatos têm procurado esclarecer a população que boa parte destas obras –algumas delas iniciadas poucos meses antes do período eleitoral e ainda não concluídas– é financiada com recursos do governo federal e instituições internacionais, mas a chantagem nos bairros continua se proliferando e eleitores continuam com medo.


 


Contribui para esta percepção, a imensa quantidade de placas que acompanham cada obra. Quem vem do aeroporto de Cofins, na região metropolitana de BH, em direção ao centro da cidade, passando pela chamada “Linha Verde”, tem a impressão de que Belo Horizonte é uma cidade em construção, tantos são os trechos com obras viárias, todos devidamente “sinalizados” com placas que anunciam que aquela é uma obra do governo do Estado ou da prefeitura. As placas da prefeitura trazem ainda a frase “Obras por toda a cidade”, reforçando ainda mais a propaganda subliminar.


 


A propaganda ostensiva não se resume às placas. Não bastasse o candidato oficial ter o maior tempo no horário eleitoral gratuito (11 minutos e 46 segundos), a mídia local também se mostra pouco equilibrada na cobertura do processo eleitoral. Com exceção de alguns jornais como O Tempo e Hoje em Dia, que buscam fazer uma cobertura mais imparcial e dinâmica, os demais órgãos da grande imprensa pouco falam da eleição em Belo Horizonte e, quando falam, é bastante perceptível a parcialidade a favor da “aliança”. A parcialidade pode ser observada também no rádio e nos telejornais.


 


Chance de segundo turno


 


Apesar de toda esta ofensiva, as últimas pesquisas de intenção de voto revelam que a população de Belo Horizonte parece estar se cansando de tanta pressão. O candidato da “aliança” estagnou e seus adversários estão crescendo. A última pesquisa Datafolha mostra Lacerda com 41% das intenções de voto e seus adversários juntos têm 38%, apenas três pontos percentuais para garantir o segundo turno. Há ainda 12% de indecisos. 


 


As eleições em Belo Horizonte costumam se definir nos últimos quinze dias de campanha e, desde 1996, os candidatos identificados com a esquerda tem se beneficiado desta tendência. O segundo turno, que até duas semanas atrás era uma possibilidade remota, agora já começa a se apresentar como possibilidade concreta. Disputam a segunda colocação Jô Moraes (PCdoB)  e Leonardo Quintão (PMDB).


 


Na hipótese de segundo turno, Lacerda terá que se confrontar com um adversário ou uma adversária com o mesmo tempo de TV, o que já é um alento para quem hoje tem que enfrentar o verdadeiro latifúndio que Lacerda tem no horário eleitoral gratuito (11minutos e 48 segundos). Também ficará mais difícil para o candidato da aliança escapar do debate. Até hoje, dos 23 debates promovidos por escolas, universidades e outras instituições de BH, Lacerda não compareceu a nenhum.


 


Resta saber se a nova situação que se coloca no segundo turno, caso ele aconteça, será suficiente para superar o jogo bruto que opera nos bastidores.


 


De Belo Horizonte,
Cláudio Gonzalez