Mídia internacional destaca 'prestígio' do cinema brasileiro

O jornal Los Angeles Times e a CNN, maior e mais conhecido canal de notícias do mundo, deram amplo destaque, nesta semana, à boa fase do cinema brasileiro. Uma reportagem da CNN feita em Londres por Marco Woldt investiga o fenômeno do renasciment

O repórter lembra que a repressão e a censura durante a ditadura militar nas décadas de 70 e 80 fez com que os cineastas lutassem para que seus filmes tivessem impacto no exterior. Depois, quando o país voltou à democracia, o Ministério da Cultura foi fechado e o suporte estatal para a produção de filmes desapareceu da noite para o dia.


 


A falta de recursos fez com que o cinema chegasse a sua pior fase nos anos 90, com uma produção de menos de dez filmes por ano. Hoje em dia, menos de duas décadas depois do colapso da indústria, o cinema brasileiro vive um renascimento, atraindo a atenção de público e crítica.


 


A reportagem questiona: o que há então de tão interessante no cinema brasileiro agora? Desde o começo de 2008 os filmes brasileiros têm ganhado forças nos festivais internacionais, afirma o texto da CNN. Em fevereiro, o controverso drama de José Padilha sobre violência e corrupção policial, Tropa de Elite, ganhou o prêmio máximo do Festival de Berlim, o Urso de Ouro.


 


Outro triunfo o seguiu no Festival de Cannes em Abril. Sandra Corvelloni foi eleita a melhor atriz por seu papel no filme Linha de Passe, de Walter Salles. Ela interpreta uma grávida, mãe de quatro filhos que tentam, à sua maneira, transcender a pobreza de suas vidas.


 


O filme de Salles também foi indicado à prestigiada Palma de Ouro. Já Ensaio sobre a Cegueira, a mais recente obra do brasileiro Fernando Meirelles, diretor de Cidade de Deus, foi escolhido para abrir Cannes.


 


Baseado em uma história real, o seqüestro de um ônibus no Rio de Janeiro em 2000, Última Parada 174, de Bruno Barreto, foi indicado para concorrer ao Oscar de Melhor Filme em Língua Estrangeira. É sinal de que o clima positivo para o cinema brasileiro deve continuar em 2009. Última Parada 174 estreou nesta sexta-feira (24) no Brasil.


 


Temas


 


Mas — questiona a CNN — todos os filmes brasileiros só falam sobre favelas e violência? Um dos mais celebrados lançamentos brasileiros dos últimos anos, Cidade de Deus (2003), assim como Tropa de Elite (2007), são narrativas ultraviolentas passadas em favelas.


 


Os dois filmes, por coincidência, foram escritos pelo mesmo roteirista — Braulio Mantovani. Ambos foram aclamados pela honestidade e condenados pelo excesso de violência, lembra o repórter da CNN.


 


Quando foi lançando, Cidade de Deus — que inspirou vários imitadores com seus cortes ágeis e suas cores brilhantes — foi acusado de glamurizar a violência e aderir a uma tal “cosmética da fome”. De forma parecida, Tropa de Elite foi acusado de promover o facismo, além de expor de forma crua os brutais métodos empregados pelo Bope para combater os traficantes.


 


Outros diretores brasileiros estão buscando abordagens menos sangrentas. Caso de Maré — Nossa História de Amor, longa de Lucia Murat que ambienta no Rio de Janeiro uma adaptação musical de Romeu e Julieta — uma novidade no cinema brasileiro.


 


Linha de Passe pode ser pesado, mas evita a violência e termina com uma mensagem de esperança. É um sentimento que deve aparecer no próximo projeto de Salles — uma adaptação com Francis Ford Coppola da novela de Kerouac, On the road.


 


Hollywood?


 


Walter Salles e Fernando Meirelles são freqüentemente cortejados por Hollywood e convidados para dirigir filmes em grandes estúdios. Os dois, no entanto, preferem continuar a trabalhar em produções independentes. Em várias entrevistas, Meirelles confirmou ter pouco interesse em se mudar para Hollywood e costuma citar como seu lema o provérbio “Fale da sua aldeia e será universal”.


 


Bruno Barreto tentou produzir filmes em inglês tão logo fez nome no Brasil. Depois de filmes como Atos de Amor (Carried away) com Dennis Hopper e Entre o Dever e a Amizade (One tough cop), com Stephen Baldwin, Barreto decidiu voltar ao Brasil.
Salles também quer voltar ao Brasil depois de terminar On the road. “O Brasil ainda é um país em construção”, disse Salles à CNN. “Nossa identidade está se cristalizando e tanta coisa está acontecendo enquanto nos falamos — histórias que são completamente improváveis e acontecem diariamente.”


 


Com as incontáveis facetas da sociedade brasileira e seus contrastes servindo de inspiração, parece que os festivais internacionais ainda não viram tudo de Salles, Meirelles e companhia, conclui a reportagem da CNN.


 


Como sugestão aos espectadores que desejam conhecer mais o cinema feito no Brasil, a emissora propõe cinco filmes brasileiros imperdíveis: Deus e o Diabo na Terra do Sol (de Glauber Rocha, 1964); Central do Brasil (Walter Salles, 1999) ; Cidade de Deus (Fernando Meirelles, 2002) ; Casa de Areia (Andrucha Waddington, 2005) ; e Tropa de Elite (Jose Padilha, 2007).


 


Co-produções


 


Já o Los Angeles Times, em reportagem publicada quinta-feira, põe em evidência o crescente número de co-produções internacionais no cinema brasileiro. O texto também ressalta que a indústria audiovisual do país sofreu, nas últimas duas décadas, com a falta de verbas.


 


Na trilha da reportagem da CNN, o jornal destaca: a indústria que chegou a ser uma das mais ativas na América Latina foi dizimada por desvalorizações, hiper-inflação e mudanças nas políticas dos governos.


 


Entrevistado pelo LA Times, André Sturm, diretor da associação Brasil Cinema, diz que “depois de fazer apenas dois filmes em 1991, os cineastas brasileiros vão completar 90 produções neste ano, das quais cerca de uma dúzia serão em parceria com produtores dos Estados Unidos, Ásia, Canadá e Europa”.


 


Cinema e TV


 


A reportagem ainda destaca o aumento das co-produções nos canais de TV a cabo, citando a HBO, que acaba de produzir e exibir a quarta mini-série brasileira em três anos. “Para os produtores americanos, negócios em outras terras são um meio de baixar custos e proteger suas apostas financeiras em um momento de crise bancária que tornou empréstimos para filmes mais difíceis de se conseguir”, explica o jornal.


 


“Mas sua presença também é parte do processo de polinização estilística cruzada”, acrescenta o LA Times. “O efeito disso talvez tenha sido mais visível na influência que os cineastas mexicanos de vanguarda tiveram sobre produtores de Hollywood nos últimos anos.”


 


Além de Walter Salles e Fernando Meirelles, o jornal chama atenção para o diretor Heitor Dhalia, de O Cheiro de Ralo e À Deriva. Mas afirma que, apesar do crescente número de produções cinematográficas e das melhorias de renda, o público de cinema diminuiu — e o Brasil segue a tendência americana de “entretenimento em casa”.


 


Outro grande concorrente, diz o LA Times, são as produções televisivas, em particular da Rede Globo. A reportagem cita que as co-produções abrem espaço para filmes brasileiros em outros mercados, em que os parceiros têm melhores condições de divulgá-los.


 


Da Redação, com agências