A vitória da marca Obama: por trás de uma campanha histórica
Em seu discurso da vitória na madrugada desta quarta-feira (5), o presidente eleito dos Estados Unidos, Barack Obama reconheceu a importância David Plouffe. O elogio ao coordenador de sua campanha foi enfático. Segundo Obama, Plouffe foi o “herói anônimo
Publicado 06/11/2008 18:13
O 44º presidente dos Estados Unidos não está sozinho na análise, que foi logo corroborada pela AdAge. Na opinião da tradicional publicação, o momento é mesmo relevante — e este 4 de novembro entra para a história como o dia mais importante da história do marketing. Nada menos!
“Pegue um homem relativamente desconhecido e mais jovem que seus adversários. Com um nome que não soa bem. Analise também sua primeira oponente, a mulher mais conhecida da América, conectada com um dos políticos mais bem-sucedidos da história. Considere também o segundo oponente, um herói de guerra com recorde de tempo no Senado. Tudo isso não importa, porque Barack Obama teve uma estratégia melhor do que eles”, afirma AdAge.
A vitória de Obama se explica pela combinação da mensagem de mudança com um formidável trabalho dos militantes de base. E também pelo fato de ter conseguido apresentar o candidato republicano, John McCain, como alguém que representava mais quatro anos de política Bush. Sua ampla vitória contrasta com o caso de George W. Bush, que venceu por uma margem muito apertada as eleições presidenciais de 2000 e 2004, segundo seus críticos, com uma campanha que semeava a divisão e o rancor entre as diversas comunidades dos Estados Unidos.
“Temos sido capazes de superar muitas das coisas que muita gente pensava que eram barreiras insuperáveis de nossa política”, disse o principal estrategista de Obama, David Axelrod, ao canal MSNBC. ''Criamos uma coalizão nacional. Isso é o que decidimos fazer e isso é o que fizemos'', agregou, eufórico.
Marcas
Contra Obama, os adversários tentaram também se atrelar a palavras e expressões. Hillary foi de ''experiência'', ''contagem regressiva para mudar'', ''soluções para a América''. McCain foi ''herói'', ''comandante'', ''conciliador'', ''líder experiente''. E ambos tentaram ser uma ''mudança melhor''. Mas sem sucesso, porque melhor, conforme lembra a AdAge, não significa diferente, que é o que poderia mudar a cabeça dos eleitores.
A campanha de Obama, na análise de publicação, teve muito a ensinar ao mercado publicitário. A começar pela simplicidade da mensagem — “change” —, uma única palavra-chave para designar uma plataforma toda. O lema da mudança se alinhou perfeitamente com um momento político no qual, conforme as pesquisas, Bush tinha uma péssima imagem e que mais de 80% dos norte-americanos pensavam que o país estava na direção errada.
A campanha manteve consistência durante a longa disputa eleitoral de dois anos — e adquiriu novos significados com a crise financeira que explodiu, causando apreensão no mundo nos últimos meses. Para a AdAge, foi justamente essa consistência que garantiu não só a comunicação das mensagens do candidato — mas o próprio posicionamento dele. Além disso, a AdAge destaca a relevância, já que Obama mudou o formato do campo de luta na política.
Não à toa, ele foi eleito recentemente o Anunciante do Ano pela publicação. E agora, mais ainda, ele deverá ganhar muitos outros prêmios, de ''Homem do Ano'', ''Político do Ano'', etc. Mas a marca Obama, para manter-se forte, precisará antes de mais nada de um bom governo, ressalva a AdAge.
Mobilização
A bem-sucedida comunicação ajudou Obama a levar milhões de pessoas às ruas. ''Foi a campanha mais eficaz de mobilização de eleitores da história política americana'', disse Adam Seagal, diretor do Programa de Eleitores Hispânicos da Universidade Johns Hopkins. Segundo ele, o uso inteligente da internet para chegar aos eleitores foi fundamental nessa estratégia.
Além disso, a superioridade financeira de Obama — que arrecadou mais de US$ 600 milhões durante a campanha, mais que o dobro que o seu adversário republicano, John McCain — fez com que lançasse uma implacável ofensiva propagandista. Foi assim que o democrata expandiu e consolidou o voto latino em estados-chave para sua vitória, como Colorado, Novo México e Flórida.
Outro dado revelador é lembrado por Temo Figueroa, diretor da equipe hispânica de Obama. Nos últimos dias da campanha, em estados como a Flórida era praticamente impossível que se passassem mais de 15 minutos sem que os telespectadores e ouvintes latinos escutassem o lema ''Sou Barack Obama e aprovo esta mensagem''.
O entusiasmo gerado por seu slogan de mudança e esperança — “Yes, We Can” (''Sim, nós podemos'') — fez o restante do trabalho. Isso tudo num país farto da ruinosa presidência de Bush, que deixa o país imerso na pior crise econômica em 80 anos e envolvido em dois conflitos, no Iraque e no Afeganistão.
Além de destacar os detalhes da campanha histórica de Obama, os analistas ressaltaram também o enorme simbolismo da eleição do primeiro presidente negro na história do país. ''É realmente épico que um afro-americano — que tenha nascido quando muitos estados ainda proibiam casamentos inter-raciais — venha a se tornar presidente dos Estados Unidos'', opinou Fred Greenstein, professor emérito da Universidade de Princeton (Nova Jersey).
Os voluntários
Em artigo publicado no jornal O Globo, Julita Lemgruber, diretora do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania, da Universidade Candido Mendes e professora-visitante da Harvard Law School, destacou “os voluntários de Obama”. Resume ela: “A mensagem de esperança, a aposta na mudança e o carisma de um homem extraordinário emocionou multidões e conseguiu atrair milhares de voluntários que tornaram a campanha de Barack Obama um fenômeno na história política americana que ainda será analisado por muito tempo”.
Julita — que acompanhou as eleições americanas “de perto” nos últimos meses — enfatiza que a campanha de Obama “alterou para sempre a forma de se fazer política nesse país (Estados Unidos), envolvendo uma legião de voluntários e utilizando a internet com competência jamais vista”.
Na vitória de Obama, a internet foi decisiva para pelo menos três ações: ”arrecadar fundos, mandar mensagens diárias para milhões de pessoas e divulgar vídeos”. A professora-visitante da Harvard explica: “Pela primeira vez na História das eleições americanas os democratas tiveram o dobro dos recursos de seus opositores e 95% desses recursos vieram de pequenas contribuições, muitas de US$ 5 ou US$ 10, feitas pela internet”.
O site da campanha de Obama tinha nesta quarta-feira (5) uma mensagem de agradecimento aos eleitores e apoiadores. Sobre uma foto de Obama e do vice-presidente eleito, Joe Biden, estão as frases ''Obrigado — a mudança pode acontecer''. Mesmo com a vitória de seu candidato, o Comitê Nacional Democrata continuava pedindo doações no site. A mensagem cita a participação popular sem precedentes registrada nesta campanha e pede doações para ajudar a custear os esforços do comitê em 2008.
O “grass roots movement”
Além da internet, sobressaiu também o telefone. “Equipes de voluntários, principalmente de jovens, organizaram-se para telefonar para eleitores desenvolvendo os chamados phone banks, que funcionavam até 15 horas por dia, em espaços cedidos por apoiadores de Obama”, escreve Jutita. “Só na véspera das eleições foram feitas mais de dois milhões de ligações em todos os Estados Unidos.”
Foi, enfim, a campanha que mais agregou “fiéis” nos Estados Unidos — uma enorme “quantidade de voluntários que dedicaram horas de seus dias ao trabalho por seu candidato, seja nas ruas, em suas casas, ou nos comitês distribuídos por todos os lados”. O que houve, conclui Julita Lemgruber, foi um “grass roots movement” (movimento da base da sociedade), “que envolveu o país numa cruzada cívica sem precedentes”.
Leia também:
— Obama presidente: a vitória da internet
— Vitória de Obama só não existiu na capa da Folha
— Afinal, por que a imprensa dá um apoio tão maciço a Obama?