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PC Sul-Africano ironiza: “O mito do livre-mercado explodiu”

Chris Matlhako, o secretário de Relações Internacionais do Partido Comunista Sul-Africano (SACP, na sigla em inglês) fez uma intervenção repleta de ironia no Encontro Internacional dos PCs. Zombou daqueles que defendiam “as ilusões da política neoliberal” na África do Sul, e achavam que “impressionar os investidores estrangeiros” era o “mais importante”. Com a crise, “a história provou outra coisa”, assinalou.

 

Chris Matlhako
As intervenções no 10º Encontro Internacional dos Partidos Comunistas e Operários, iniciada em São Paulo nesta sexta-feira (21) seguem a ordem alfabética dos países, em português. Por isso Chris Matlhako foi o primeiro a fazer uso da palavra entre as 65 delegações presentes, logo depois da fala de abertura de Renato Rabelo – presidente do PCdoB, como partido anfitrião.

O SACP, como integrante do Congresso Nacional Africano, no poder desde 1994, joga um importante papel na África do Sul pós-apartheid. Veja extratos da intervenção de Matlhako.

“Nos últimos poucos meses, se não semanas, testemunhamos o aprofundamento da crise do capitalismo e respostas à crise sem precedentes por parte das mais poderosas economias e Estados do mundo. O mito do livre-mercado explodiu; banqueiros e especuladores tornaram-se as pessoas mais impopulares no planeta.  As respostas dos Estados e governos afetados também foram muito interessantes: grandes bancos foram 'nacionalizados' e outros líderes capitalistas pelo mundo os seguiram, o pânico nas bolsas parece ter se aliviado”.

“Não foi uma medida que os capitalistas quisessem tomar; eles temem o controle democrático e a prestação de contas para o povo que exploram todos os dias. Mas foi uma concessão que eles fazem para sobreviver; tinham que fazer com que os contribuintes, na maioria da classe trabalhadora, pagassem a conta verdadeiramente pesada do desastre deles.  Eles esperam que seja uma medida temporária, que em alguns anos os bancos serão devolvidos ao setor privado e es coisas retornarão ao que eram antes do crash”.

“Porém as verdadeiras dificuldades ainda estão por vir: os cortes de postos de trabalho, a baixa do consumo, os cortes nos gastos públicos, os cortes no bem-estar, o recuo da construção de moradias, etc.  Apesar de alguns percalços sistêmicos, no período após a transformação democrática de 1994 na África do Sul a economia capitalista global em geral parecia seguir uma expansão relativamente sustentada. Esta era por certo a crença ortodoxa na África do Sul, e nossa idéia fixa passou a ser como vincular-se e em geral beneficiar-se dessa via supostamente garantida, para crescer; tudo parecia ir bem.   No entanto, a história provou outra coisa!  O SACP advertiu consistentemente contra essa ilusão; mas após 1994 o governo perseguiu políticas de rápida abertura e liberalização, através de drástica redução tarifária (muito além da exigida pelos acordos do GATT) e quebra do controle do câmbio”.

“Impressionar os investidores estrangeiros tornou-se mais importante que desenvolver a política industrial nacional ou tratar dos agudos desafios do país.  Nós, do SACP, advertimos contra essas medidas neoliberais, mas éramos ridicularizados por muitos no governo, para não falar dos assessores financeiros. Muitos repararam agora na ironia de que as administrações direitistas de Bush e Brown [nos Estados Unidos e Reino Unido] tenham proclamado os mais amplos programas 'socialistas' de nossa era. A ironia vinda dos longamente sustentados dogmas neoliberais contrariados em Washington e Londres deve ser apreciada; mas também deve-se enfatizar que aquilo que estamos vendo não é socialismo. É a socialização da dívida!  As classes trabalhadora e média dos EUA e do resto do mundo estão sendo forçadas a pagar pelos superlucros e dos ricos empresários. Como Marx notou, um século e meio atrás, esta é a lei de ferro do capitalismo.”

“Os lucros são privatizados, a dívida é estatizada”.  Deveríamos comemorar que haja uma crise capitalista global?  Sim, mas não caso ela não seja acompanhada por uma sólida ofensiva da classe trabalhadora contra o próprio sistema. Só podemos comemorar caso as forças progressistas de todo o mundo sejam capazes de aproveitar o momento para forçar uma mudança de vulto rumo à acumulação global de forças. Sem tal mudança, a crise afetará principalmente os trabalhadores e os pobres, especialmente aqueles do Sul.  A África do Sul e a África em geral foram parcialmente alcançadas pelo ascenso do chamado Sul Global – a China, a Índia e o Brasil – como potências econômicas significativas. O desenvolvimento industrial desses países continua a ser minério-intensivo, alimentado pelos altos preços dos produtos minerais. Porém eles experimentaram, sob o impacto da crise global, recuos relativamente pequenos em suas altíssimas taxas de crescimento.

“Para o SACP, isto deveria implicar em que devemos com certeza priorizar o aprofundamento de nossas relações com as forças progressistas desses países, e insistindo em continuar diversificando nossas relações comerciais.  A longo prazo, a atual crise do capitalismo global financeirizado precisa certamente se tornar um enérgico brado para que redobremos os esforços pelo fim do sistema, no qual as vidas e os destinos dos trabalhadores e dos pobres pelo mundo afora são tomados como reféns por um punhado de insaciáveis especuladores de Wall Street.  Por isto acreditamos que este 10º Encontro dos partidos comunistas e operários do mundo, no contexto deste tema, chame à intensificação da luta pela paz, democracia, soberania e progresso. Como dizemos na África do Sul, 'Se o socialismo é o futuro, vamos construí-lo agora!'.”