Mestres da Cultura se apresentam no Cariri
O IV Encontro Mestres do Mundo promoveu um grande cortejo de grupos pelas ruas de Juazeiro do Norte. Na estréia do evento no Cariri, novos mestres foram diplomados.
Por: Dalwton Moura.
Publicado 04/12/2008 16:53 | Editado 04/03/2020 16:35
Cores, ritmos, sons em profusão. Nem bem amainava o calor da tarde de terça-feira e a praça da Prefeitura de Juazeiro do Norte já era vertida em palco para alguns dos mais representativos grupos da cultura popular tradicional do Cariri. Quebrando a rotina do irrequieto Centro da cidade, a arte dos que fazem o reisado, a congada, a lapinha, o maneiro-pau, as bandas cabaçais. Um caleidoscópio de manifestações e saberes, literalmente tornados mais próximos ao ganhar a praça, à espera da saída do cortejo marcando o primeiro dia do IV Encontro Mestres do Mundo.
Um desfile que só tomou as ruas de Juazeiro mais de duas horas depois do previsto, dando a todos os grupos tempo de sobra para mostrar seu talento. E garantindo a chegada de mais e mais moradores e visitantes, em um evento de proporções ampliadas pela parceria entre Secult-CE e Ministério de Cultura. Indiferentes ao atraso, os mestres do Cariri se mostraram grandes anfitriões.
´Todos nós somos amigos, camaradas e irmãos´, fez questão de saudar Mestre Cirilo, do maneiro-pau, que ainda levou seu grupo mirim. ´A gente vai se encontrando assim, aqui acolá. Nesses outros encontros, eu aprendi coisa que eu nunca nem imaginava. Jamais vinha na minha cabeça eu encontrar até gente de outros países querendo saber do que a gente faz´, comentou o veterano dos Encontros de Mestres do Mundo, citando as edições anteriores do evento, realizadas no Vale do Jaguaribe.
Entre os reisados de mestre Zé Matias e das mulheres do Crato, chega também o grupo de Mestre Aldenir, outro que conta com reconhecimento oficial e acumula histórias dos encontros anteriores. ´Desde o primeiro que eu vou. Isso aqui é a felicidade da gente. A gente tem um conhecimento, depois desses encontros, que você não queira nem saber´, garante. ´E é bom, anima. Se a gente é velho, fica novo´, diz o mestre de 74 anos,. ´Fazer um encontro desses aqui no Cariri, então, aí melhora mais ainda´.
Já mestre Bigode, dos bacamarteiros, que com seus disparos deram susto em muita gente, disse preferir o encontro em outras regiões. ´Sei que o nosso Juazeiro é um chão bom, mas é bem rasinho pra cultura. Lá fora, aonde eu chego, as pessoas dão mais valor´, comentou, certamente para discordância dos muitos que o solicitavam para fotos e apertos de mão. ´Eu sou daqui, mas lá é melhor. A gente é muito bem recebido, e todo mundo tem uma curiosidade grande, quer ver, quer ouvir´.
Dona Dina, mestra representante dos vaqueiros de Canindé, desfilando a elegância de sua roupa de couro, gostou da viagem até o sul do Estado. ´É bom o encontro ser aqui. É a terra da cultura, né?´, elogiou, emendando uma sugestão: ´É bom mudar. Assim como a gente gostaria muito que um dia fosse no Canindé também´.
Quando a concentração ainda se formava, o estampido dos bacamartes chegou a chamar atenção de dois guardas de trânsito. ´Teve uma batida ali´, apostava um, para o colega: ´Vai olhar lá´. E tomou o rumo da praça, onde um moto-taxista gritava para os bacamarteiros: ´Só querem ser o Lampião!´. E já escurecia quando os irmãos Aniceto chegaram do Crato. ´Custaram a ir pegar a gente´, comentou mestre Raimundo..
Novos mestres diplomados
Além da demora no cortejo, outros motivos também contribuíram para que começasse com atraso a solenidade de abertura oficial do Mestres do Mundo, este ano reforçado pela realização em paralelo do III Seminário Nacional de Culturas Populares, do Ministério da Cultura. Além dos sons entusiasmados do cortejo, a noite nas imediações do Memorial ainda foi palco de uma manifestação de professores pelo cumprimento da lei do piso salarial da categoria e de uma missa campal, na Igreja do Socorro. O público que esperava nas arquibancadas o início da premiação aos mestres não deixou de participar da missa.
Enquanto isso, os novos mestres iam chegando. Como seu Raimundo de Brito Silva, o mestre mundo, mateiro, de Juazeiro do Norte. A esposa, dona Francisca, ainda procurava saber da Secretaria de Cultura sobre a entrega de documentos, enquanto os brincantes do Reisado dos irmãos Discípulos de Mestre Pedro, também contemplado na nova lista de 12 Tesouros Vivos da Cultura, já marcavam lugar no palco. Seu Francisco marques, o José Venâncio, mestre a Cultura indígena, de Itarema, chegou a se ajoelhar no palco, ao receber o diploma. O luthier Stênio Diniz, de Juazeiro do Norte, e a dona Maria do Carmo Morais, do Pastoril, de Paracuru, foram dos mais aplaudidos. A festa só perdeu brilho com a ausência de mestre Expedito Seleiro, que certamente seria especialmente reverenciado, depois do périplo em que se transformou o seu reconhecimento como mestre pelo Estado.
Outra ausência notada foi do titular da Secult Auto Filho. A fala em nome da pasta coube à secretária-adjunta, Delânia Azevedo, que reforçou a opção pelo evento no Cariri. ´Esse encontro deve permanecer aqui, pela importância que o Cariri tem na cultura do Ceará´, justificou, também se dirigindo aos homenageados da noite: ´Fizemos muito pouco ainda. Só a subvenção de um salário mínimo é muito pouco pro valor que vocês, mestres, trazem pro nosso Estado. Mas queremos que vocês saibam que a gente sempre pensa em algo mais. O Encontro dos Mestres do Mundo é algo mais´.