Nova 'Princípios': o desafio de conter o declínio do império
A chegada de Obama a Washington deu-se antes mesmo de sua posse em janeiro de 2009. Na madrugada de 4 para 5 de novembro de 2008, recém-eleito, ele se dirigiu a seus eleitores como presidente. (…) O país chega a Washington como reflexo de sua multiplici
Publicado 18/01/2009 17:21
Com esta questão a professora e pesquisadora de Relações Internacionais Cristina Pecequilo introduz o debate sobre os novos rumos dos Estados Unidos da América, entre a grave crise financeira e a eleição de Barack Obama para a presidência, dilema abordado na revista Princípios 99.
Debate este que, através dos caminhos teóricos apontados por Princípios, envereda pela história daquele país, tratando também, de maneira crítica e com uma leitura multilateral, da eleição de Barack Obama para a presidência e da crise financeira, que estourou em Wall Street no segundo semestre de 2008.
É certo que ao derrotar o reacionário Partido Republicano e ao romper o crivo racista, a eleição de Barack Obama como 44º presidente dos Estados Unidos tem um significado positivo. Conforme análise do cientista político Luis Fernandes, presidente da Finep (Financiadora de Projetos) a eleição de Obama é a derrota política do governo Bush e a superação de uma fronteira simbólica do racismo estadunidense.
Mas, como alerta Pecequilo, as mesmas forças neoconservadoras que sustentaram a presidência de George W. Bush por longos oito anos mantém-se ativas, fato que se reflete na emergência de novas lideranças conservadoras. E o quadro que Barack Obama terá que enfrentar em sua gestão, conforme ressalta Fernandes, é de enfraquecimento estrutural do poderio dos EUA no mundo.
Segundo Fernandes, ter uma agenda menos agressiva e uma política mais flexível nas questões ambientais faz diferença para o mundo, mas a implementação de mudanças radicais esbarrará em reações conservadoras.
Como respaldo histórico deste debate, Princípios conta com artigos dos jornalistas Bernardo Joffily, Pedro de Oliveira, José Carlos Ruy e Fábio Palácio, e dos economistas Frederico Mazzucchelli e Sérgio Barroso.
A formação da sociedade estadunidense vem do século 17. O que chama a atenção é que as análises elaboradas mostram como nos acostumamos como informações distorcidas sobre a história, disseminadas nos livros didáticos, no senso comum e pelo cinema.
Pelo que afirma Pedro de Oliveira, por exemplo, a colonização ibérica (América Latina) foi, de maneira geral, mais organizada que a colonização anglo-saxônica. Segundo Oliveira, a essência do desenvolvimento dos Estados Unidos está nas transformações sociais que permitiram, à margem de um estado fraco, o surgimento de um sistema de compra e venda de mercadorias (e da força de trabalho) que aos poucos foi se tornando dominante e se impondo como hegemônico.
Mas foi no século 20, sobretudo após a Primeira Guerra Mundial (1914 a 1918), que os Estados Unidos se tornariam uma potência mundial, transformando-se em credor internacional. Este século, aliás, presenciou a grande metamorfose dos Estados Unidos, até sua forma atual, na primeira década do século 21.
Um aspecto relevante foi a mudança no perfil médio, branco, anglo-saxão, da população estadunidense. Ruy demonstra como, ao longo deste tempo, a sociedade estadunidense alterou sua composição racial. Seu artigo revela que das 100 milhões de pessoas acrescidas à população dos Estados Unidos entre 1967 e 2006, 53% eram imigrantes ou seus filhos, sendo a maior parte latino-americanos. Fato que, combinado com o aumento dos casamentos inter-raciais, está tornando a população americana mais morena e com uma grande influência latina.
Em um outro artigo, traduzido para a Princípios, John Bellamy Foster, Hanah Holleman e Robert W. McChesney, da Monthly Review, tratam dos gastos militares pela sociedade norte americana, questão literalmente cara para aquele país. O militarismo, segundo o que é exposto no artigo, é parte do complexo industrial estadunidense e as guerras assumiram, ao longo do século 20, e adentrando o 21, papel central na constituição do império norte americano.
Ademais, outros temas são abordados pela revista. O Encontro Internacional de Partidos Comunistas e Operários foi, pela primeira vez, sediado no Brasil, isto é, fora da Europa. O Encontro, que ocorreu no final de novembro de 2008, em São Paulo, é considerado o principal fórum dos partidos comunistas do mundo. No contexto da grave crise financeira deflagrada em Wall Street, o evento assumiu um significado especial.
Uma prova de reconhecimento da importância do evento foi a mensagem enviada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na qual ele afirma que os momentos de crise trazem consigo uma série de oportunidades, e que é preciso saber aproveitá-las, resgatando valores de solidariedade, igualdade e justiça. Como registro deste evento, a Princípios publicou dois documentos, além da mensagem do presidente Lula, e um texto sobre o Encontro escrito pela jornalista Priscila Lobregatte.
Ainda sobre a atual conjuntura internacional, com a crise financeira, e, em contrapartida o poder de resistência dos ditos países em desenvolvimento, o jornalista Dilermando Toni apresenta os dados e as estimativas de crescimento e recessão, fazendo também um balanço da economia dos principais países capitalista em 2008.
O presidente nacional do PCdoB, Renato Rabelo, fala, em seu artigo, que somente um sistema de relações de produção e de poder democrático e popular será capaz de encontrar soluções de fundo para superar a crise e o retrocesso social que dela decorre. Este novo sistema, segundo ele, é o socialismo. Não apenas viável, mas necessário, o socialismo seria capaz de comportar o estágio do desenvolvimento contemporâneo.
Esta edição de Princípios também registra os 40 anos da repressão de 1968, que culminou com o AI-5, desdobrando-se na Operação Bandeirante, do ano seguinte. A distância do tempo ressalta a truculência e arbitrariedade da imposição de um projeto político reacionário, sustentado por um aparelho extremamente repressivo.
O que espanta na tese de Mariana Joffily, autora do artigo sobre os inquéritos da Oban e do DOI-Codi, é que muita desta violência, plantada no auge da ditadura militar, ou mesmo antes dela, continua a gerar seus frutos pérfidos.
Excepcionalmente a edição 99 de Princípios será trimestral. A próxima edição, comemorativa à chegada do número 100, chega a partir do mês de março de 2009.