Flávio Dino destaca homenagem a Alípio de Freitas

Em seu artigo semanal publicado no Jornal Pequeno(São Luís), o deputado federal Flávio Dino repercute a homenagem prestada pela Assembléia Legislativa do Maranhão a Alípio de Freitas. A homenagem também se estendeu a outros ex-militantes tort

Alípio de Freitas


Por Flávio Dino


Quase quatro décadas depois de um longo processo de prisão, tortura e expulsão    do país, um ato carregado de simbolismo promovido pela deputada Helena Barros Heluy, do PT, sublimou para nós, maranhenses de agora, a importância de uma das mais verdadeiras almas maranhenses que aqui já viveram e lutaram pelo povo desta terra, o professor e filósofo Alípio de Freitas. Português de nascimento e chegado ao estado em 1957, ele recebeu oficialmente, na última quinta-feira, dia 12, o título de Cidadão Maranhense, em sessão especial da Assembléia Legislativa que também homenageou outros ex-militantes torturados pela ditadura militar – o fundador do PT nacional, Manoel da Conceição Santos, o secretário de organização do Partido Comunista do Brasil, Etelvino de Oliveira Nunes, e a liderança Augusto José do Nascimento (in memorian).


Justa e necessária homenagem a cidadãos que foram de fundamental importância na luta pela redemocratização do país e em particular do nosso Maranhão. Mas um resgate ainda mais profundo desse admirável homem em seus 80 anos, um ex-padre e jornalista que lutou sem descanso pelos bairros mais humildes de São Luís, especialmente os da paróquia onde era vigário, que hoje abrange a Floresta e a Fé em Deus. Ali ele estimulou a criação de associações de moradores, a formação de núcleos de jovens trabalhadores e um projeto de escolas populares com um lema inspirador: “De pé no chão também se aprende a ler”.


Fez então os primeiros contatos com o movimento camponês que se iniciava no Maranhão e participou ativamente dos movimentos estudantil, sindical e político da época, especialmente o pela Legalidade, que conduziu João Goulart à Presidência após a renúncia de Jânio Quadros. Trabalhou nos jornais Pequeno, do Povo e do Maranhão – este da Arquidiocese de São Luís – e na Rádio Timbira, na qual tinha um programa diário. Entrou para as Ligas Camponesas, como dirigente, o que acabou provocando seu desligamento oficial da Igreja. Porém, como destacou a deputada Helena Barros Heluy, ele não se afastou dos valores cristãos que sempre nortearam sua vida – a solidariedade universal, a verdade, a prática da justiça, a igualdade de direitos para todos e os sentimentos libertários sem fronteiras.


Nem mesmo as duas prisões pelo Golpe Militar o abalaram – uma em 1964 e outra em 1970, quando sobreviveu à tortura no DOI-CODI do Rio de Janeiro e peregrinou por oito presídios, entre eles Ilha Grande, Carandiru e Bangu, até ser solto em fevereiro de 1979. Perdera a cidadania brasileira e a portuguesa ao mesmo tempo e, após um tempo em Moçambique, para organizar cooperativas agrícolas e a agricultura familiar, voltou a Portugal em 1984, como jornalista e produtor de premiados documentários na Rádio Televisão Portuguesa.


Passados tantos anos, Alípio de Freitas ainda confessa amargura pela injustiça que, considera, o Estado brasileiro – e não o povo – cometeu contra a sua pessoa. Talvez por isso a homenagem da Assembléia Legislativa tenha ainda mais peso – por representar uma reparação essa devolução de sua cidadania maranhense, um reconhecimento da terra que considera como sua.


Na mesma cerimônia ainda foram lançados, com a presença da presidente da Comissão dos Mortos e Desaparecidos da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República, Vera Rotta, a campanha e o livro “Direito à Memória e à Verdade”. A campanha visa forçar o Brasil a admitir sua responsabilidade frente à questão dos opositores políticos que foram perseguidos, torturados e mortos pelo regime militar; e o livro, editado pela própria Secretaria, resgata a memória dos presos políticos desaparecidos no país durante o regime militar (1964 a 1985). São ambos formas de reconhecermos nossa história recente sem medo.


Após 11 anos de trabalho, percalços e avanços, a Comissão se concentra no momento em dois procedimentos – a coleta de sangue dos parentes consangüíneos dos desaparecidos ou mortos cujos corpos não foram entregues aos familiares, a fim de se construir um banco de DNA que permita sua identificação; e a sistematização de informações sobre a localização de covas clandestinas nas áreas mais prováveis de sepultamento de militantes, em especial na região do Araguaia.


Fundamental registrar que o que vem viabilizando todos esses passos é a Lei nº 9.140/95, que reconheceu a responsabilidade do Estado brasileiro no assassinato de opositores políticos no período abrangido. Só reconhecendo esse passado é que saberemos construir instrumentos eficientes para garantir que semelhantes violações aos Direitos Humanos não se repitam nunca mais em nosso país.


Parabéns à deputada Helena Barros Heluy, ao presidente Marcelo Tavares e aos homenageados.