Congresso homenageia ''socialite'' como exemplo na luta das mulheres
Dona Lily Marinho, conhecida como viúva do dono da TV Globo, Roberto Marinho, e como anfitriã de recepções que reúne em sua mansão no bairro do Cosme Velho, no Rio de Janeiro, a elite financeira do País, foi homenageada pelo Congresso Nacional como ref
Publicado 05/03/2009 17:01
A senadora Serys Slhessarenko (PT-MT), que tradicionalmente dirige a sessão solene, ao falar sobre os problemas que enfrentam as mulheres, decidiu ignorar a questão da descriminalização do aborto, assunto polêmico, “para evitar discussões acaloradas”, justificou. Perdeu a oportunidade de repercutir o caso da menina de nove anos, de Alagoinha, município de Pernambuco, que realizou o aborto nesta quarta-feira (4).
A criança foi estuprada pelo padrasto, Jaílson José da Silva, de 23 anos, que confessou ter violentado sexualmente a menina e a sua outra enteada, de 14 anos de idade, portadora de deficiências física e mental. A menina estava grávida de gêmeos e fez aborto garantida pela lei que permite a interrupção da gravidez em casos de estupro e risco de morte da mãe.
A Igreja católica tentou impedir o aborto. O arcebispo de Olinda e do Recife, Dom José Cardoso, admitiu que a menina engravidou de maneira injusta, mas que a igreja prega que é preciso salvar vidas. E anunciou a excomunhão da equipe médica e demais pessoas envolvidas com a interrupção da gravidez.
A presença de dona Lily Marinho, que admitiu nunca ter sido militante da causa feminina, deve ter inibido a parlamentar para discutir o assunto.
Tradição mantida
À parte essa idiossincrasia, a comemoração do Dia Internacional da Mulher seguiu a tradição de vários anos, premiando mulheres que foram referência na luta pelos direitos das mulheres, como a juíza maranhense Sônia Amaral; a jornalista, atriz e poeta Elisa Lucinda; a secretária-geral da Advogados do Brasil (OAB), Cléa Carpi da Rocha; e a assistente social Neide Castanha, que coordena o Comitê Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes.
A ex-primeira dama, Rute Cardoso, também foi agraciada in memoriam com o título. Instituído em 2001 pela Mesa do Senado, o Conselho do Diploma Mulher-Cidadã Bertha Lutz elege anualmente cinco mulheres que tenham se destacado em atividades de defesa dos direitos e valorização da mulher.
A senadora Serys Slhessarenko disse que, além da premiação, o evento serve para que se traga à tribuna assuntos de interesse das mulheres. Ela destacou os efeitos da crise econômica sobre as mulheres, que tem pautado as discussões deste ano. E fez referência as estatísticas que demonstram que as mulheres brasileiras recebem salários em média 34% inferiores ao dos homens, o que representa a maior diferença entre os 20 países pesquisados.
Críticas à Igreja
As demais parlamentares não fugiram à tradição e atacaram o problema que persegue às mulheres ano após ano – a violência de toda espécie – sexual, moral, financeira etc. E denunciaram que, apesar dos efeitos positivos da Lei Maria da Penha, o fim da violência contra a mulher exige uma mudança de cultura, que tem impedido a total aplicação da lei.
A senadora Patrícia Saboya (PDT-CE) comentou o episódio de violência sexual do padrasto contra a menina em Pernambuco, se manifestando indignada com o caso em si e ''abismada'' com a posição adotada pelo arcebispo de Olinda e Recife.
“Se queremos viver por mais justiça e respeito para as crianças, não podemos banalizar algo tão grave, doentio e perverso. Sou católica e considero que a palavra de uma autoridade religiosa é fundamental para defender a criança, não para acobertar o crime. É hora de as autoridades religiosas se levantarem contra essa ferida, essa doença”, protestou.
Sem treinamento
Sandra Rosado (PSB-RN), coordenadora da bancada feminina na Câmara, destacou a luta das mulheres para ampliar o seu espaço de poder. Ela disse que apesar de ser maioria na população, as mulheres não votam em mulheres porque não são treinadas como agentes e sim como pacientes do processo político.
Em meio aos discursos políticos, a poetisa Elisa Lucinda, que falou em nome das homenageadas, abriu espaço para a poesia. Ela declamou dois poemas, um deles, o Credo, de sua autoria, em que prega que “A poesia é síntese filosófica/ fonte de sabedoria/ e bíblia dos que/ como eu/ crêem na eternidade do verbo/ na ressurreição da tarde/ e na vida bela/ Amém!…”
De Brasília
Márcia Xavier