Vila de trabalhadores resiste à expulsão do Plano Piloto

Próximo a um dos limites que demarcam o sudeste do Plano Piloto – entre a ponta do Lago Paranoá e o final da Avenida das Nações (Via L-4 sul) – há uma comunidade de 300 mil habitantes que não deveria viver ali. O antigo “Acampamento”, atual “Vila Telebras

Desde o final da década de 50, autênticos candangos (como são chamados os pioneiros construtores de Brasília) ocupam a vila e fazem dela a exceção de uma cidade que tem como regra a inexistência no Plano Piloto de habitações de pessoas pobres.


 


A Vila Telebrasília já deveria, segundo o tombamento da capital, a cobiça imobiliária, o preconceito de alguns vizinhos e a conseqüente má vontade política, ter sido retirada dali, como ocorreu com mais de 60 acampamentos da época de construção da capital.


 


“Teve um dia de reunião que um morador do Lago Sul [área vizinha e das mais valorizadas em Brasília] disse que nós estávamos poluindo o Paranoá, que nós perturbávamos e que os moleques daqui iam roubar lá”, recorda-se Maria Rosineide Peixoto de Sousa, residente no local há 25 anos e ativa participante da Associação de Moradores do Acampamento da Telebrasília (Amat).


 


Segundo “Dona Neide” (como é conhecida), habitantes antipáticos da outra margem do lago e governantes tratavam como “grandes especuladores” os moradores do local. “Eles perguntavam: como é que vocês querem morar ali, um lugar muito privilegiado?”, lembra. “Nós tínhamos um sonho, que para certas pessoas era uma insônia”, lembra com indignação, citando inúmeras tentativas do Governo do Distrito Federal de retirar os moradores.


 


A “Vila Telebrasília” – chamada assim após a urbanização e a titulação dos lotes (ocorrida em 2007) – já teve vários nomes, sempre de acordo com a empresa que contratava seus moradores. Antes de ganhar o nome da extinta Telebrasília, nos anos 1970, foi chamada de “Acampamento Camargo Corrêa”, “Acampamento DTUI” (Departamento de Telefones Urbanos e Interurbanos) e “Acampamento Cotelb” (Companhia Telefônica de Brasília).


 


Enquanto o lugar teve status de acampamento, foram negados asfalto, calçada, coleta de lixo e água encanada em todas as moradias. Ainda hoje, faltam posto de saúde, escola e creche para todas as crianças, cobra Dona Neide.


 


A líder comunitária assinala que algumas conquistas só foram atingidas por força da mobilização cotidiana de moradores, que chegaram a fechar a passagem da Avenida das Nações, visitaram sucessivos governadores, fizeram vigília na Câmara Legislativa e ganharam apoio da comunidade (especialmente da Universidade de Brasília).



 


“Cada dia, a gente aprende um pouquinho. A gente morre e não aprende tudo”, comenta, sorrindo satisfeita com a vitória, mas mostrando-se ainda disposta para a luta e atenta com a revenda de casas de moradores e a destinação dos lotes cercados na Vila Telebrasília pela Terracap (Companhia Imobiliária de Brasília).


 


O ex-acampamento é exceção em Brasília porque desafiou a prática de expulsão dos habitantes menos aquinhoados para as regiões administrativas mais distantes (antigas cidades satélites ao redor do Plano Piloto) ou para o entorno do Distrito Federal. A mobilização enche de orgulho os moradores, que colocaram na entrada da vila uma placa com os dizeres “aqui tem história”. A história é de “resistência”, o nome da principal praça do lugar.


 


De Brasília


Gilberto Costa