Crise econômica global: maus ventos sopram do Ocidente
A Europa, um dos pontos estratégicos da crise econômica global, acaba de revelar dados que atestam a gravidade da crise econômica global. A região, mais o Japão e outras economias de menor expressão na Ásia, são a extensão do modelo econômico norte-ame
Publicado 15/05/2009 15:16
Segundo a agência de estatísticas Eurostat, o Produto Interno Bruto (PIB) da zona do euro caiu 2,5% sobre os três meses imediatamente anteriores e recuou 4,6% na comparação com o primeiro trimestre de 2008. Os 16 países que utilizam a moeda única registraram seu quarto trimestre consecutivo de queda da atividade, porque o PIB já havia recuado 0,2% tanto no segundo quanto no terceiro trimestre em 2008 e 1,6% no quarto trimestre do ano passado.
Esta é a queda mais acentuada do PIB da zona euro em um trimestre desde a criação de estatísticas para a região, em 1995 — destacou o escritório europeu de estatísticas, Eurostat. (A zona euro foi criada em 1999, mas o escritório fez um cálculo para os anos anteriores.) A contração da economia européia é amplamente superior à dos Estados Unidos, onde, aliás, a crise financeira foi detonada. Os Estados Unidos registraram uma queda de 1,6% de seu PIB no primeiro trimestre, em relação ao anterior, após a queda de 1,6% no quarto trimestre de 2008.
Alemanha mais afetada
Entre as grandes economias da zona euro, a Alemanha foi particularmente afetada, com um recuo de 3,8% de seu PIB no trimestre, sua mais forte queda desde o início da publicação dos dados trimestrais em 1970. O país entrou em recessão técnica (seis meses seguidos de queda do PIB) no terceiro trimestre do ano passado. No último trimestre de 2008, a economia alemã havia encolhido 2,2%. Devido à importância das exportações em sua economia, este país é o mais atingido pelo desaquecimento mundial.
A Itália registrou baixa de 2,4%, a Espanha, de 1,8%. A França teve queda de 1,2% de sua atividade no primeiro trimestre de 2009, mas se salvou de uma catástrofe graças à resistência do consumo. Apesar de estar atravessando sua pior crise desde o primeiro choque petroleiro de 1975, o país parece resistir um pouco melhor à recessão mundial do que seus principais vizinhos. Segundo o instituto nacional de estatística Insee, a queda do PIB é menor do que a redução de 1,5% sofrida no trimestre anterior.
A França em recessão
Ainda assim, os dados foram suficientes para colocar a economia francesa oficialmente em recessão. O ministério da Fazenda francês acredita que a economia do país vai contrair 3% neste ano — o dobro do que havia sido previsto anteriormente pelo governo. A ministra Christine Lagarde disse, em nota oficial, que as previsões francesas e de organismos internacionais é de que a França vai começar a se recuperar ''gradualmente em 2010''.
O país perdeu mais empregos no primeiro trimestre de 2009 do que em todo o ano de 2008, com o corte de 138 mil postos de trabalho (-0,9% na comparação com o trimestre anterior e -2% em relação ao mesmo período de 2008), segundo dados oficiais provisórios divulgados nesta sexta-feira. A economia holandesa apresentou contração de 2,8% nos três primeiros meses de 2009, uma queda de 4,5% em comparação ao ano passado — a mais forte desde a Segunda Guerra Mundial. Fora da zona euro, o Reino Unido registrou queda de 1,9% do PIB no trimestre em questão.
Ffábrica da GM fechada
Nos Estados Unidos, enquanto não saem os dados gerais da economia que serão divulgados nesta sexta-feira, o debate sobre a crise gira em torno do setor automobilístico — ponto chave da dinâmica econômica do país. A General Motors (GM) acaba de anunciar o fechamento de uma fábrica de caminhonetes que existia há 44 anos na cidade canadense de Oshawa, a cerca de 60 km de Toronto, o que representa a eliminação de 2,6 mil postos de trabalho diretos e outros 12 mil em empresas relacionadas.
A companhia informou à Securities and Exchange Commission (SEC, em inglês), comissão de valores mobiliários dos Estados Unidos, que vai declarar quebra caso não receba ofertas suficientes para a troca de dívidas por ações. A GM apresentou ao organismo no último dia 27 a oferta de troca de US$ 27 bilhões em dívida não assegurada por ações da companhia.
Reestruturação da Ford
A empresa também disse que pode pedir ao Tribunal de Falências uma aprovação para a ''venda da maioria, ou substancialmente de todos'' os seus ativos a uma nova companhia e a liquidação dos ativos restantes, no que seria a alternativa ''mais provável''. A GM disse que buscaria a mesma estratégia legal que a Chrysler está usando sob a supervisão federal para reduzir dívidas e revendedoras.
Já a Chrysler anunciou que pretende fechar 789 concessionárias, o que equivale à 25% de seus pontos de vendas nos Estados Unidos. A Ford, outro gigante do setor, disse que espera uma queda da demanda mundial de 15% em 2009. A companhia se diz diferente das outras duas grandes por que começou a “reestruturação” antes do início da crise, o que lhes permitiu enfrentar a dramática queda de vendas de uma melhor posição financeira.
Investimento estrangeiro
Em outro ponto estratégico da crise econômica global, a China, o panorama revela uma economia cada vez mais voltada para as suas potencialidades internas. Trata-se de uma decisão decorrente da dinâmica da crise global, que obriga o país a rever sua rota de basear a economia em investimento direto estrangeiro. Esse caminho começa a mostrar resultado, com o aumento do consumo interno ao mesmo tempo em que o investimento externo caiu 22,5% em abril em comparação com o mesmo mês do ano anterior, seu sétimo mês consecutivo de quedas.
A queda de abril aguça a tendência negativa deste indicador, que em março já tinha perdido 9,5%, e já se trata do pior período desde a crise financeira que a Ásia viveu no final da década de 1990. No acumulado dos quatro primeiros meses de 2009, o investimento direto estrangeiro foi US$ 27,67 bilhões, 21% inferior ao primeiro quadrimestre do ano anterior. O Ministério do Comércio chinês atribuiu a diminuição às decisões tomadas pelas companhias internacionais de cancelar ou adiar os investimentos no país asiático por causa da crise.
No Brasil, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sente o rumo do vento e se prepara para estreitar ainda mais os laços comerciais com a China. Em entrevista à revista chinesa Caijing, Lula disse que quer discutir o uso do yuan e do real no comércio bilateral com o país durante seu encontro com o presidente Hu Jintao, no início da próxima semana. ''Por que dois importantes países como China e Brasil têm que usar o dólar como referência, ao invés de suas próprias moedas?'', questionou. ''É maluco que o dólar seja a referência e que você dê a um único país o poder de imprimir essa moeda'', disse.
Peso sitgnificativo
Segundo o presidente, em encontros do G-20 e da OMC, quando reuniram-se Brasil, China, Índia e Rússia, bem como México e Argentina, o grupo representou um peso significativo na tomada de decisões políticas. Lula lembrou que os dois países têm um acordo para lançamento de satélites e compartilhamento de imagens e que outros dois satélites devem ser lançados em breve.
Em relação aos acordos que podem ser assinados durante a visita a Pequim, Lula citou documento que deve ser assinado entre instituições financeiras brasileiras e o China Development Bank; um acordo para cooperação em comércio; um protocolo para combater crimes transnacionais; e possivelmente um acordo entre o China Development Bank e a Petrobras. ''Esperamos mostrar aos chineses o nível atual de desenvolvimento no Brasil para tentar assinar um acordo de participação em projetos de infraestrutura, aeroportos, petróleo e gás'', disse.
Comunidade mundial
O presidente acrescentou que os dois países também devem se concentrar na questão de combustíveis renováveis, especialmente etanol e biodiesel. Lula lembrou que o Brasil descobriu recentemente novas reservas de petróleo e quer construir parcerias. O presidente também mencionou que o país procura parceiros para investir no trem-bala que ligará São Paulo e Rio de Janeiro. ''Precisamos estar abertos a discutir projetos complementares, ou seja, como o Brasil pode ajudar a China e a China ajudar o Brasil a ajudar nosso povo, fazer nossa economia crescer e permitir que participemos mais ativamente da comunidade mundial. Esse é meu objetivo na visita a China'', disse Lula.
Para isso, o governo federal deve fechar um acordo com a China para inaugurar em Pequim um escritório da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (APEX). A delegação da Petrobras que acompanhará Lula também estudará a possibilidade de fechar acordos com sua similar chinesa para empreender projetos de prospecção de petróleo em águas profundas chinesas.
Roda da economia
Nos últimos quatro meses, o Brasil exportou US$ 5,6 bilhões à China (12,9% do total), o que transformou o país no principal destino de produtos brasileiros, superando os Estados Unidos pela primeira vez na história. A China é um porto que de fato precisa ser bem mirado nesses tempos de tempestade global. No pós-Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos fincaram suas bandeiras no oriente porque era real a possibilidade de o continente asiático seguir por um caminho próprio.
Diferentemente do Japão e de outros países da região, a China preservou seu feixe de tradições e inventou seu próprio modelo de desenvolvimento, seu próprio estilo de fazer a roda da economia girar. De quebra, o país tem sido hábil em adaptar-se às transformações do ambiente em que atua, em absorver, mesmo que de projetos rivais e teorias adversárias, aquilo que é fundamental à sua sobrevivência. Essa flexibilidade inteligente é um dos aspectos mais notáveis do sistema chinês — do qual o Brasil tem a grande chance histórica de tirar lições.
Com agências internacionais