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Denúncias de Abadia revelam grau de corrupção na polícia paulista

Um vídeo exibido pela TV Globo, anteontem, mostrou denúncias feitas pelo traficante traficante colombiano Juan Carlos Ramirez Abadia na época em que ele negociava a extradição. Nas imagens, usadas pela Corregedoria da Polícia Civil para a investigação

De acordo com Abadía, policiais do Denarc (Departamento de Investigações sobre Narcóticos) e do Detran (Departamento Estadual de Trânsito de São Paulo) cobravam propina dele e de outros traficantes colombianos.


 


O jornalista Paulo Henrique Amorim, em seu blog Conversa Afiada, chegou a afirmar que a situação se assemelha a uma “sociedade” entre Abadia e a polícia paulista.


 


O próprio Abadia disse em outra ocasião que a melhor maneira de combater o tráfico de drogas em São Paulo é fechar a delegacia que combate o tráfico de drogas em São Paulo.



“O mais espantoso, porém, é que, segundo Abadia, policiais de São Paulo sequestraram um traficante e esconderam o sequestrado na delegacia que combate (?) o narcotráfico – o DENARC”, afirma Amorim.



As denúncias provocaram mal estar no governo. A ponto do governador  José Serra se ver obrigado a vir a público, na segunda-feira (15),  afirmar  que o secretário da Segurança Pública, Antonio Ferreira Pinto, se empenhará pessoalmente na investigação das denúncias feitas pelo traficante.



O Fantástico teve acesso a um vídeo no qual o traficante, quando ainda estava preso no Brasil, faz denúncias contra investigadores e delegados. “Eu pedi ao secretário que chamasse para si todos os termos dessa investigação, para que a gente redobre o rigor para poder chegar aos responsáveis. O secretário, que é uma pessoa bastante firme, vai se empenhar pessoalmente nessa averiguação. Para que cheguemos naqueles que se corromperam em prejuízo do interesse público”, disse o governador durante evento no Palácio dos Bandeirantes.



O secretário afirmou que irá se reunir com a corregedora para definir as prioridades da investigação. “Essa prestação de conta será tardia, porque não se consegue que um caso tão grave quanto esse fique tanto tempo sem solução e sem responsabilidade dos autores. Um caso como esse deveria ter prioridade absoluta”, afirmou. Ferreira Pinto garantiu que uma das metas de sua pasta será fortalecer a Corregedoria da Polícia de São Paulo.



Acusações



Mesmo longe do Brasil desde agosto do ano passado, quando foi extraditado, Abadia ainda é o foco de uma das principais investigações da corregedoria. Antes de ir embora, ele fez uma série de denúncias contra investigadores e delegados. O Fantástico teve acesso à peça principal da investigação, que é um vídeo de 47 minutos. Entre uma mordida e outra em um lanche, Abadia diz que, em vez de prendê-lo, policiais agiram como bandidos.



“Eu perguntava: ‘Quem são? São bandidos?’ Falaram: ‘Não, nós somos Denarc. Somos policiais’”, diz Abadia, na gravação.



Denarc é o Departamento de Investigações sobre Narcóticos, principal departamento da Polícia Civil de São Paulo de combate ao tráfico de drogas. Abadia prestou o depoimento em outubro de 2007, no prédio da Justiça Federal, em São Paulo. Ele estava preso há dois meses e acreditava que as informações o ajudariam a ir logo para os Estados Unidos: “Estou fazendo esta colaboração com a Justiça com o fim de ser extraditado rapidamente”.



Durante os três anos em que se escondeu no Brasil, Abadia montou um império: mansões, fazendas, barcos de luxo. Ele já era um dos bandidos mais procurados do mundo, fez várias cirurgias plásticas e usava nome falso: Antônio.



Interrogado por promotores, o traficante diz que os policiais começaram a exigir propina em 2006, cerca de um ano antes de ser preso. “Os policiais me falaram: ‘Trabalhamos com vários traficantes, com colombianos. (Eles) nos dão mesada’”.



Sequestro


 


Abadia falou ainda sobre o suposto sequestro de um comparsa: Henry Lagos, o Patcho. De acordo com o traficante, o prédio do Denarc serviu de cativeiro e policiais queriam US$ 1 milhão, cerca de R$ 2 milhões.



“Tenho certeza que eram policiais. Falaram: ‘Se você não trouxer o dinheiro, então vamos matar esse cara’”, conta Abadia no vídeo.



Depois de muita negociação, de acordo com Abadia, o valor caiu para US$ 300 mil e o “acerto” poderia ser feito em cocaína. Ramirez Abadia contou que o resgate foi pago em dinheiro vivo e que deixou os US$ 300 mil em uma esquina, dentro de um carro, bem próximo do prédio do Denarc. O colombiano, acusado de mandar matar mais de 300 pessoas, revelou que teve medo de ser assassinado pelos policiais corruptos.



“Ficamos de olho no carro. Falamos (para) que eles pegassem no carro. Não vamos entregar nas mãos, porque vão nos matar a todos e ficam com o dinheiro”, lembra Abadia.



Henry Lagos, o Patcho, foi solto e fugiu para a Argentina. Daniel Maróstica, um comparsa de Abadia que chegou a ser preso, deu os mesmos detalhes do suposto sequestro. Ele ainda alegou ter presenciado conversas entre os policiais. Teria havido uma discussão porque um dos policiais chamou o outro pelo nome: Pedro.



Pedro seria o delegado Pedro Pórrio, segundo o Ministério Público. No ano passado, ele foi transferido da delegacia de combate às drogas. Atualmente, ele está na delegacia do idoso. Na sexta-feira (12), a reportagem não o encontrou no trabalho. Por telefone, ele negou as denúncias e preferiu não gravar entrevista.



Detran



Abadia relata ter sofrido cinco extorsões que chegariam a quase R$ 2 milhões. Três policiais do Detran – o departamento de trânsito – também são acusados pelo colombiano de cobrar propina. O traficante conta ter dado R$ 55 mil aos funcionários do Detran, que, segundo ele, eram da mesma “engrenagem” do grupo de corrupção do Denarc.



Depois do depoimento de Abadia, o Ministério Público encaminhou as denúncias para a Corregedoria da Polícia Civil de São Paulo. Um ano e oito meses depois, quase nada foi feito, de acordo policiais que acompanham o caso de perto e preferem o anonimato.



Em nota, a Secretaria de Segurança Pública informou que o delegado Caetano Paulo Filho é o responsável pela investigação. Segundo ele, detalhes do caso não podem ser divulgados para não comprometer o trabalho realizado até agora.



Nos Estados Unidos, Juan Carlos Ramirez Abadia pode ser condenado à prisão perpétua. Aos 47 anos, o colombiano tem audiência marcada com a Justiça americana no mês que vem. Sobre a corrupção no Brasil, o traficante diz ter falado tudo. “Falei tudo que sabia. A verdade é tudo”.



Com informações do G1