Conjuntura exige defesa da soberania do povo iraniano
Após semanas de protestos, a situação política no Irã parece estar definida, ainda que a fratura exposta na sociedade e no clero islâmico pareça ser definitiva. No dia 29 de junho, o Conselho de Guardiões da Constituição concluiu a recontagem de cerca
Publicado 01/07/2009 16:56
O clérigo Ahmad Khatami chegou a defender a condenação dos líderes das passeatas por estarem desrespeitando os princípios que fundaram o atual sistema iraniano. As manifestações contra supostas fraudes no processo eleitoral vitimaram cerca de 20 pessoas desde o dia 12 de junho.
A posse de Ahmadinejad já é dada como certa nos próximos dias e depende apenas da nomeação do líder supremo do Irã, o aiatolá Ali Khamenei, que não esconde sua simpatia pelo mandatário.
Os países centrais do Ocidente prometem sanções ao Irã. A Grã-Bretanha acusa o país de ter prendido arbitrariamente nove funcionários de sua embaixada em Teerã. Até o final desta edição, cinco haviam sido libertados. O Irã afirma que deteve os britânicos por estes terem encorajado os protestos. Contra ingerência Nesse quadro, analistas apontam que a esquerda mundial tem uma tarefa que concilia duas vertentes. Primeiro, o rechaço a qualquer ingerência externa sobre a autodeterminação do povo iraniano, que, de fato, decidiu conceder mais um mandato a Ahmadinejad.
Por outro lado, deve prestar solidariedade aos anseios de organizações iranianas que lutam por um Estado laico e por maior participação e transparência. Desde o triunfo da Revolução Islâmica em 1979, em que a esquerda desempenhou importante papel, muitos grupos passaram a ser perseguidos no país, tal como o Partido Comunista (Tudeh), ilegal desde o regime do Xá, que antecedeu o atual.
José Reinaldo Carvalho, secretário de Relações Internacionais do PCdoB, que mantém laços com os comunistas do Irã, afirma que o partido está sendo solidário às suas reivindicações de legalização e pelo fim das perseguições.
Carvalho conta que seu partido recebeu informações de que o grupo iraniano tem se posicionado contra Ahmadinejad por conta da prisão de líderes. Eles têm se somado a algumas manifestações e realizado outras independentes, já que boa parte das mobilizações têm como pretexto o apoio a Mousavi, segundo colocado no pleito e defensor de um liberalismo dentro da ordem islâmica.
No entanto, no atual momento geopolítico mundial, Carvalho reforça a importância de se posicionar em favor da soberania do povo iraniano que reelegeu Ahmadinejad.
“Na nosssa opinião houve um grande comparecimento em favor da reeleição. Depois, apareceram denúncias de que poderia ter havido fraudes. Se houve fraude ou não, é um acontecimento residual que não ofusca a vitória líquida e certa do presidente. Houve uma reação fabricada pela mídia e círculos imperialistas. Com notícias falsas, falavam que era possível que Ahmadinejad poderia perder a eleição”, aponta Carvalho, para quem a perspectiva errônea de derrota do presidente exaltou os ânimos após a divulgação dos resultados.
“Como isso não aconteceu, houve uma amplificação de um problema residual e instrumentalizaram as manifestações. Esta é mais uma tentativa do imperialismo de realizar revoluções coloridas, por conta da posição anti-imperialista do Irã, como fizeram nas ex-repúblicas soviéticas do Cáucaso e do leste europeu”, exemplifica.
A suposta falta de democracia e transparência é um argumento
falho dos EUA, de acordo com Carvalho. “O repúdio dos EUA não tem nada a ver com republicanismo ou laicismo. Porque eles defendem regimes mais bárbaros no próprio Oriente Médio, como Egito e Arábia Saudita, que não são democracias”, compara.
Duas vertentes
O secretário de Relações Internacionais do PT, Valter Pomar, salienta que defender o Irã pontualmente contra o imperialismo não representa uma conivência com possíveis restrições democráticas no país. Consultado pela reportagem, Pomar comentou sobre a situação do país, mas salientou que são opiniões pessoais, já que o partido não debateu oficialmente o assunto.
“Apoiar o governo do Irã quando se confronta com o imperialismo não é contraditório com defender a validade de demandas democráticas sustentadas por setores da sociedade iraniana. Quem afirma que uma coisa é contra a outra são, exatamente, os EUA”, define. Em sua análise, o petista aponta duas posições acerca do Irã que podem parecer excludentes, mas são confluentes. “Há duas questões envolvidas: os conflitos internos no Irã, de classe, políticos, ideológicos, religiosos; e os conflitos internacionais nos quais o Irã está envolvido, regionais e mundiais. Estas são as duas variáveis. Os temas da democracia dizem respeito à primeira variável, os temas do anti-imperialismo dizem respeito à segunda. E os cruzamentos são mais complicados do que parecem”, explica.
Sobre a legitimidade do processo eleitoral iraniano, a posição de Pomar coincide com a de José Reinaldo. “Entendo que o atual presidente ganhou a eleição e que há uma tentativa internacional de desqualificar o resultado, por conta das posições do atual presidente, não por conta do resultado, que coincidiu com pesquisas feitas por institutos da própria direita norte-americana”, avalia.