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Flávio Dino: A internet na campanha eleitoral

O debate em torno do uso da Internet nas eleições, retomado em escala mundial a partir do caso de sucesso da campanha do novo presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, ganhou corpo também no Brasil nos últimos meses. Tanto que esse instrumento de co

A inclusão da Internet nesse importante projeto de lei, em que buscamos esclarecer com o máximo de detalhamento possível como serão as regras do jogo político em nosso país, acabou centralizando o foco das atenções da mídia e da sociedade. O que certamente deve se repetir durante a votação em Plenário, pois é impossível desconsiderar o alcance e a força cada vez maiores dessa que é a “praça virtual” da atualidade. Entretanto, o uso da Internet nas campanhas eleitorais hoje é submetido a um regime praticamente proibitivo. Os candidatos estão confinados ao site “.can”, que é um espaço certificado pela Justiça Eleitoral e sujeito a muitos impeditivos.



Estamos propondo, no projeto, a substituição radical desse panorama. Em primeiro lugar, porque a Internet é um mecanismo de barateamento das campanhas eleitorais, portanto ajuda a diminuir o peso do dinheiro nas eleições. Em segundo lugar, porque ela é um mecanismo democrático, que aproxima os representantes dos representados, favorecendo a interatividade e o diálogo entre candidato e eleitor tanto quanto as ruas. Com 40 milhões de brasileiros tendo acesso direto à informática – número sempre crescente a cada ano – é um absurdo restringir o seu uso, como aconteceu até as eleições de 2008.



No lugar desse regime do “nada pode” ou do “pouco pode”, nós parlamentares do grupo de trabalho para a Reforma Eleitoral criado pelo presidente da Câmara, Michel Temer, o qual tive a honra de coordenar, estamos propondo um sistema amplamente liberal no uso das tecnologias disponíveis no mundo virtual. Assim, será possível utilizar a Internet nas campanhas eleitorais tanto para abrigar sites de partidos e candidatos, quanto para criar blogs, twitter, orkut, redes sociais de relacionamento de um modo geral, e-mails e salas de bate-papo entre os candidatos e os eleitores. Mais do que isso, o projeto permite a utilização da Internet como meio de doações, inclusive com a utilização de cartão de crédito.



Porém, evidentemente que essa liberalização precisa ser feita com algumas cautelas, porque se trata de mudança profunda em uma realidade na qual a Internet é usada apenas para propaganda negativa e difamatória dos candidatos e partidos. Precisamos permitir o bom uso desse fantástico meio de comunicação. A primeira cautela que sugerimos, então, é a de que não haja propaganda paga na Internet, porque não podemos equipará-la a um jornal ou a uma revista. Não temos meios para arbitrar a igualdade de espaços disponíveis para a comercialização na rede, como é feito nos demais veículos, e uma disputa realmente democrática pressupõe paridade de armas, ou seja, regras que possibilitem ao máximo a igualdade de chances entre os candidatos. Caso contrário, o mais forte economicamente esmagaria o mais fraco.



Também defendemos que haja um regime claro de direito de resposta. No caso de injúria, calúnia e difamação, que seja garantida a possibilidade de o candidato ir à Justiça Eleitoral e buscar o mesmo espaço para veicular a verdade sobre a situação em questionamento.



Outra cautela que propomos são regras proibitivas de conteúdos ofensivos ou de tratamento privilegiado a determinados candidatos no tocante às empresas de comunicação social que usam dos meios virtuais. Tais empresas precisam garantir equidade de tratamento aos vários postulantes, sob pena de também assim quebrar a igualdade de chances entre os candidatos. A Internet não é igual à tevê ou ao rádio, que são concessões públicas, mas também não é igual à imprensa escrita. Precisamos construir um regime jurídico próprio para esse novo meio, a partir da sua natureza específica, que é a de uma espécie de convergência de várias mídias. Essa característica da Internet nos obriga a uma convergência de regras também no plano normativo.



Em função disso é que surgiu outra cautela proposta no projeto – a proibição clara do spam, aquela mensagem indesejada e invasiva que viola o direito à privacidade do receptor. Incluímos uma regra segundo a qual as propagandas devem vir com uma opção para o internauta que não deseja recebe-las: “Não, eu não quero mais receber sua propaganda eleitoral”. E o candidato será obrigado a não mais enviar esse tipo de conteúdo para aquele endereço de e-mail, sob pena de multa.



Tenho a convicção de que produzimos um texto avançado e de qualidade, que nos colocará no século 21. É uma grande mudança, que deve ser feita com prudência. Não podemos substituir o regime até aqui vigente, altamente restritivo, por um imprevisível “vale-tudo”. Aliás, nenhum meio de propaganda é totalmente “liberado”, seja em campanhas eleitorais ou comerciais. Regras são necessárias para proteger tanto os cidadãos quanto os candidatos. Além disso, é importante entender que reforma política é um processo, não está restrita a um momento único. O que importa é avançar, com passos seguros. É isso que buscamos com o projeto da reforma eleitoral e a inclusão da Internet em nossas campanhas. Se conseguirmos aprová-lo, já será um enorme passo.



* Flávio Dino é deputado federal pelo PCdoB-MA e coordenador do grupo que elaborou a proposta de reforma eleitoral