Festival reúne repente e trova em praça pública
Com palco em praça pública, artistas da música popular fazem a festa a partir de amanhã em evento internacional
Publicado 23/09/2009 09:13 | Editado 04/03/2020 16:34
A cadeira de balanço dará lugar aos bancos da praça, e quando se poderia pensar em ouvir a cantoria só até o fim de tarde, com o radinho de pilha colado ao ouvido, dessa vez tem mais à noite, e por quatro noites. O Interior recebe aquilo que lhe é próprio, mas em grandes dimensões: cultura. As cordas da viola, juntamente com as cordas vocais do poeta que puxa a cordinha da criatividade e reverbera puro sentimento e graça, vão ressonar no V Festival Internacional de Trovadores e Repentistas, de amanhã até domingo em Limoeiro do Norte. Terá mais de 50 artistas do Ceará, do Rio Grande do Norte, da Paraíba, de Pernambuco, do Piauí e também de Cuba e Itália.
Violeiros, poetas, repentistas, emboladores, aboiadores e trovadores de além-mar, vão se apresentar na praça pública de Limoeiro, bendita a Princesa do Vale e que nunca escapou aos versos dos poetas. A praça pública vira um enorme pé de parede. Não há competição por premiação que não seja em forma de aplausos da platéia, silenciosa e atenta. É um festival, "mas principalmente um grande encontro", bem lembra o cantador repentista Geraldo Amâncio, coordenador do evento, que, lançado em 2005 e ficando os dois primeiros anos entre Quixadá e Quixeramobim, passou em 2007 por Senador Pompeu e Farias Brito, para desde o ano passado ser sediado em Limoeiro, no Vale do Jaguaribe.
Falta de reconhecimento
A cantoria, os mais velhos sabem e os mais jovens ainda estão a perceber, vai além do compassado dam, dam dim dam das cordas do violão antecipando as cordas vocais do poeta. "É o que há de mais belo na poesia oral do Brasil, eles são grandes artistas das praças, mas que ainda não foram reconhecidos pelas academias literárias. Não constam nas antologias dos poetas brasileiros, mas são os grandes poetas da palavra improvisada", esclarece a professora doutora Simone Oliveira de Castro, curadora do Festival e secretária da Comissão Nacional de Folclore, percebendo que apesar de ter um público restrito, a cantoria é continuada por aqueles que crêem no dom, "mas falta esse reconhecimento por parte de todos nós. Fico encantada com a criatividade e a beleza poética com que constroem seus versos, que os ´versos brancos´ dos outros poetas não passam essa emoção", pontua a curadora.
A programação do Festival Internacional de Trovadores e Repentistas começa de manhã, com o "Seminário Vozes de Mestres: a palavra (em) cantada na cultura oral nordestina", reunindo pesquisadores e artistas da cultura popular no contexto das manifestações orais. Lá estarão os professores Tadeu Feitosa (CE), Maria Ignez Ayala (PB), Francisca Pereira dos Santos (CE), Nenem Patriota, Paolo Scarnecchia, da Itália, e artistas como o cearense Rouxinol de Rinaré e um poeta de sangue herdado do grande Patativa do Assaré, seu sobrinho Geraldo Gonçalves.
E durante as quatro noites, 24 duplas de cantadores se apresentam no período do Festival, como Sebastião da Silva (PB), Ivanildo Vila Nova (PE), Zé Viola (PI), Valdir Teles (PE), Moacir Laurentino (PB), Severino Feitosa (PE), Raimundo Caetano (PB), Zé Cardoso (RN), João Paraibano (PB), Silvio Grangeiro (CE) e João Lourenço (PB). As atrações internacionais são os trovadores Elicer Téllez Fernándes e Gaspar Esquivel, de Las Tunas (Cuba) e Donato de Acutis e Enrico Rustici, de Roma (Itália). Após o Festival e os desafios entre os repentistas, ainda tem na programação musical Luizinho de Irauçuba (CE), Betinho Aguiar (CE), Myrlla Muniz (CE) e a cirandeira Lia de Itamaracá (PE). Também os emboladores cearenses Vem-Vem e Beija Flor, o poeta Gabriel da Paraíba (PB) e ainda Larissa Macedo (CE).
A quinta edição do Festival Internacional de Trovadores e Repentistas é realizado pelo Instituto Internacional de Artes e Cantorias (Intercanto), patrocínio da OI e do Banco do Nordeste, apoio institucional da Prefeitura de Limoeiro, Ministério da Cultura, Academia Limoeirense de Letras e Oi Futuro.
Tão pouco legitimado pelas academias literárias e tão muito valorizados pelas "academias da vida", os artistas saem dos pequenos terreiros das festas reservadas e ganham a praça principal, o palco maior.
De acordo com Rosemberg Cariry, idealizador do evento, "diversidade e reciprocidade" resumem o encontro de artistas tão viajantes e que vão aproveitar quatro grandes dias para brincar, fazendo poesia.