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Para ministra, volta de Zelaya "destravou" crise hondurenha

A volta de Manuel Zelaya "está destravando" a crise em Honduras. A avaliação é de Patrícia Rodas, ministra de Relações Exteriores do governo deposto pelo golpe de 28 de junho. Veja a entrevista dada em Washington à BBC Mundo pela ministra, tida como representante da ala esquerda do governo Zelaya.


A chanceler estava em Washington, onde fica a sede da OEA (Organização dos Estados Americanos) para finalizar os detalhes da missão desta quarta-feira. Ela relativizou a importância da visita a Tegucigalpa de três congressistas americanos de extrema-direita, dizendo que não representam a posição oficial dos EUA, da Casa Branca ou do Congresso.

Chamamento à residtência

Patrícia Isabel Rodas, 47 anos, ganhou projeção mundial no dia do golpe. Quando Zelaya fora sequestrado e expulso do país num avião militar, ela falou à imprensa por telefone e fez o primeiro chamamento à Resistência do povo contra os golpistas. "Só a luta popular tornará possível a volta à normalidade constitucional", proclamou ela, logo antes de ser presa em sua casa.

Vista como uma mulher de esquerda, com tradição de ação em movimentos sociais, há quem atribua à sua influência as opções que puseram o presidente eleito em rota de colisão com a oligarquia hondurenha.

Patrícia declarou-se satisfeita com o apoio de Washington a Zelaya, embora ressalvando que "sempre há algo mais que se pode fazer". Veja a entrevista, para Carlos Chirinos, da BBC Mundo:

BBC Mundo: O que vai acontecer nos próximos dias, em Tegucigalpa, com a missão de chanceleres da OEA?

Patrícia Rodas: Temos proclamado, desde o primeiro dia em que se colocou, a iniciativa de San José como a saída ideal para a crise em Honduras. O presidente Zelaya se dispôs não só a assinar o Acordo de San José, mas a iniciar o diálogo imediatamente. Devido à lamentável intransigência dos golpistas, não se pôde até agora chegar a um acordo.

BBC: Além da volta do presidente Zelaya ao território de Honduras, alguma mudança sugere que o Acordo de San José está mais perto de ser assinado?

Patrícia: Algo mudou; é a disposição da OEA para continuar este processo. (…) Por outro lado, as condições que rodeiam este diálogo não sinalizam boa-vontade por parte do setor golpista.

BBC:
É possível que estejamos diante de uma crise travada, dado que a presença do presidente Zelaya parece não ter contribuído para desbloquear a situação…

Patrícia: Muito pelo contrário, a presença do presidente Zelaya é que está destravando a situação. Se o presidente Zelaya não estivesse em Honduras, o regime nunca teria recebido de novo uma missão da OEA. Se o presidente Zelaya não estivesse em Honduras, o regime não estaria procurando soluções para o que já é reconheceu como profundos erros, que demorou dias para reconhecer. Acreditamos que, se temos esta iniciativa, é porque o presidente Zelaya está dentro do país.

BBC: Mas, entre as metas do retorno do presidente Zelaya não estava a de reavivar a mobilização popular para enfraquecer o governo Michelleti?

Patrícia: O presidente Zelaya voltou a Tegucigalpa porque esta é a obrigaçaão de um presidente constitucional. Você não está tratando do líder de uma força irregular, está falando do presidente constitucional da República, que não foi derrubado e é reconhecido por toda a comunidade internacional. O presidente Zelaya quis voltar para começar um grande diálogo nacional visando solucionar a crise no país.

BBC:
Mas o fato é que o presidente Zelaya, mesmo estando no país, não exerce o poder no momento. Caso a crise não destrave e se realizem as eleições de novembro, que faria o presidente Zelaya?

Patrícia: O problema é que se o processo continuar não há nem na comunidade nacional e nem na comunidade internacional quem possa confiar nos resultados, ou em quem os proclama, porque se a autoridade de fato que os proclama não tem qualquer legitimidade ou legalidade, nenhuma de suas ações é legal.

BBC: Mas e se houvesse uma alta participação popular?

Patrícia: Mas quem vai garantir que foi um grande comparecimento popular deu o voto a alguém? Qual é a entidade que vai assegurar que os dados estão sendo transparentes, se eles estão fora da lei? Como se afirma que o regime não tem nenhuma legitimidade, portanto as eutoridades que fossem eleitas não teriam nenhuma legitimidade. (…) Ainda não inventaram um sistema em que um sedicioso garanta um processo democrático.

BBC: Qual é o status legal do presidente Zelaya na embaixada do Brasil?

Patrícia: Ele é um hóspede do governo do Brasil em condições de proteção diplomática, em virtude do cerco que as forças militares de Honduras montaram na embaixada.

BBC: O que acha das delegações parlamentares dos EUA que visitaram Tegucigalpa nos últimos dias?

Patrícia: É normal, recorde que não foi o Parlamento`que os enviou. São alguns membros do Congresso, que visitam seus amigos em virtude de razões pessoais e afinidades políticas e ideológica. Mas não são uma missão oficial do Congresso nem do governo dos EUA.

Não há reconhecimento; lembre que eles foram (a Honduras) como partidários de uma ideia, como membros de um partido político que é simpático à ideia do golpista.

BBC: Mas isso poderia evidenciar um debate político nos EUA, sobre como lidar com a crise política hondurenha.

Patrícia: Seria preciso ver qual grau de representatividade têm estes senhores, quantos eleitores eles representam e quanto poder possuem na Câmara (de Representantes). Isso já seria uma análise da política interna dos EUA que, como chanceler, dentro das normas internacionais, não estou autorizada a fazer.

BBC:
Vocês acreditam que Washington deveria fazer mais para pressionar Michelleti a deixar o poder?

Patrícia:
Washington faz o que pode e tem atuado com base em princípios. (…) Acreditamos que, sim, é preciso haver uma maior consciência nos círculos de poder, sobre a necessidade de Washington agir, porque em Honduras estão em jogo os princípios democráticos defendidos pelos EUA, enquanto nação. (…) Acreditamos que sempre há algo mais a fazer para acabar com esta ameaça contra a democracia e contra a própria vida.

Fonte: BBC Mundo